O comércio do Brasil acorrentado
SUELY CALDAS *
Não foi só o truque de deixar para janeiro o lançamento de importações de petróleo feitas em 2012 o único causador do enorme déficit de US$ 5,5 bilhões da balança comercial registrado até agora. O governo parece não se dar conta, mas o fato é que as exportações têm caído fortemente em quantidade, sinalizando tratar-se de um problema estrutural, a exigir tratamento também estrutural para tentar virar o jogo do nosso comércio com o mundo. A Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) constatou que em fevereiro a quantidade de produtos exportados caiu 13,2% em relação a fevereiro de 2012. É uma queda expressiva que precisa ser levada a sério, não menosprezada. Por mais que o ministro Guido Mantega insista na ladainha de culpar a crise internacional, a verdade é que o Brasil vem perdendo mercados em países onde a crise passa ao largo e que em 2012 registraram crescimento muito acima do nosso pibinho de 0,9%.
Em política comercial, o Brasil tem seguido na contramão do mundo. Isola-se, em vez de se integrar. E quando sai do isolamento busca parceiros errados.
País que mais cresce na América Latina, o Chile escolheu caminho inverso ao do Brasil:
- abriu sua economia;
- reduziu tarifas de importação;
- ao expor sua indústria à concorrência com importados, melhorou seu produto em qualidade e preço;
- e adotou uma pragmática política comercial de fechar acordos com países e blocos econômicos isoladamente, o que lhe tem rendido bons resultados. Assinado em 2004, o acordo com os EUA expandiu as exportações chilenas em 31% já no ano seguinte.
Números de 2012 comparados com 2011 mostram que a crise pode explicar as perdas com os países europeus (que poderiam ser menores ou até nulas, se o comércio fosse amparado por um tratado de comércio com a União Europeia), mas não explicam com a China, a Rússia e a Argentina:
- De 2011 a 2012 nossas exportações para esses três países caíram nada menos que US$ 8,7 bilhões (US$ 3,1 bilhões com a China, US$ 4,7 bilhões com a Argentina e US$ 900 milhões com a Rússia).
- A economia chinesa desacelerou, desculpa-se o governo. Nada, cresceu 7,8% em 2012.
- As razões são outras, e os velhos e não resolvidos gargalos em estradas e portos são uma delas.
- A outra é o prometido acordo de comércio entre os Brics (Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul), que não anda.
Com seu protecionismo, a Argentina tem sistematicamente violado regras do Mercosul e forçado a queda de vendas do Brasil. Aliás, por vezes o Mercosul mais prejudica do que ajuda o Brasil. O caso da União Europeia é emblemático: desde 1999 o bloco do Mercosul discute um ambicioso acordo de zona de livre comércio com a Europa. As negociações paralisaram e o governo brasileiro se sente preso, impedido de negociar sozinho um pacto que abriria as portas de 27 países para o Brasil.
A tendência do mundo inteiro é a integração, não o isolamento, não a exclusão. Nos últimos anos a União Europeia concluiu acordos com Canadá, Cingapura e Coreia do Sul e está nos detalhes finais com Japão, Vietnã e Tailândia. O mundo avança por esse caminho. Por que o Brasil deve ficar preso aos briguentos vizinhos do Mercosul?
* Suely Caldas é jornalista e professora da PUC do Rio de Janeiro.
Fonte: O Estado de S. Paulo - Economia - Domingo, 24 de março de 2013 - Pg. B2 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-comercio-do-brasil-acorrentado-,1012562,0.htm
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