Sobre o padre Robson e outros...
É de
outra Igreja que precisamos
Pe. Manuel
Joaquim Rodrigues dos Santos
Presbítero da Arquidiocese de Londrina – PR
Pároco na Paróquia São João Batista (Florestópolis, PR)
É disso que a
Igreja precisa?
Padres tipo
super-heróis da fé?
Santuários que se
tornam super paróquias?
Abusando de
devocionismos e sacramentários no pior sentido?
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Pe. Manuel Joaquim Rodrigues dos Santos |
O caso envolvendo irregularidades
com o padre Robson do Santuário do Pai Eterno em Goiânia, nos leva a
necessárias e sérias reflexões. Há anos
atrás eu escrevi um artigo mordaz, discorrendo sobre o que chamava genericamente
de “padres cantores”. Outros preferem o termo influencer [inglês:
influenciadores], mas dá no mesmo.
Nos anos noventa, uma estratégia
clara da Igreja Católica, foi o enfrentamento das Igrejas pentecostais
visando concretamente a evasão dos católicos com esse destino. Foi o
momento da explosão das mídias católicas – Canção Nova, Século XXI, Rede Vida
etc. Todas obedecendo à mesma linha influente da RCC, em tese, a que
melhor proporcionaria uma comunicação perfeita a esse objetivo primeiro.
Numa linguagem do chamado
catolicismo explícito, ou comunicação explicitamente religiosa, esses Meios
entravam na casa dos brasileiros, cumprindo um papel, que segundo se dizia, não
era mais atingido pelas paróquias e antigas estruturas. Com isso, os lares
católicos brasileiros passaram a ter um canal “católico” em suas casas:
* dando
catequese,
* ditando a
moral,
* formando
opinião e em alguns casos,
* em rota de
colisão com a Igreja ou com vários párocos.
Mas o pior! Geralmente esses
programas criaram locais específicos de grandes peregrinações, que se
transformaram numa espécie de super paróquia. Católicos geralmente
quase nada envolvidos em atividades eclesiais e descompromissados com a
Comunidade de origem, faziam peregrinações sistemáticas e mobilizavam
outros, até esses points da fé!
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Santuário do Divino Pai Eterno - Trindade - Goiás |
Por sua vez, padres midiáticos
cada vez mais aperfeiçoados no metier [francês: atividade,
trabalho], recorrendo a modelos nada convencionais (cowboy – country,
show man etc.), abusando de batinas e clergyman, iam se impondo no
imaginário popular como super-heróis do catolicismo moderno a atual.
Paradoxalmente, mal sabiam os idosos e espectadores, que de moderno e atual
essa gente não tem quase nada.
O conteúdo desses shows da fé,
abusando de devocionismos e sacramentários (no pior sentido do
termo), arrasavam com a caminhada histórica da Igreja brasileira e
resgatavam modos populares, em nada condizentes com uma boa e necessária
evangelização.
Que a devoção seja positiva e uma
boa plataforma para voos mais altos em termos de compromisso com o Reino de
Deus, é pacífico e defendido em inúmeros documentos do Magistério. Porém, o
devocionismo provocado e alimentado por esses Meios de Comunicação Católicos
empoderando padres recém ordenados, não é adequado ao objetivo que a Igreja
Católica tem se proposto em seus Planos de Evangelização dos últimos anos.
Concomitantemente, este modelo envolve altos recursos financeiros. Uma
família católica média pode receber em sua casa de dois a três boletos
mensais, com solicitação de ajuda. Como aparentemente o objetivo é sacro, a
generosidade do povo nunca falha. Além do dízimo, se é que em muitos casos não
é substituído!
São milhões. Bilhões, na verdade. Construção
de Santuários faraônicos, redes de Tvs, Rádios etc. etc. Dinheiro exige administração e transparência. Um caso
de escândalo envolvendo essas doações derrubam imediatamente todo o plano.
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Padre Robson durante celebração eucarística no Santuário do Divino Pai Eterno Trindade - Goiás |
O caso do padre Robson está sob
investigação. Mas ao que parece, houve alto desvio para bens
particulares. Em Goiânia um caso destes, já não é inédito!
(Para inteirar-se
dos detalhes deste caso envolvendo o
padre
Robson de Oliveira Pereira, basta clicar aqui)
Será o começo do fim de um modelo
que até hoje não podemos avaliar em termos de vantagens para a evangelização? Sabemos
que a tipicidade destes evangelizadores da Mídia, associados a Santuários, é
tipicamente do continente americano. A peregrinação enquanto tal é inerente
ao ser humano. Ele caminha como o grande paradigma da sua própria existência.
Caminha por caminhar. É caminhando que se faz o caminho.
Na Idade Média se caminhava também
por penitência. No entanto, os Santuários de hoje envolvem mais do que isso.
Para pior. São “centros de bênçãos” e
locais de gastança de dinheiro. São erigidos a santos, anjos e arcanjos. Desenvolveu-se
uma teologia medíocre e barata desses personagens do mundo da fé.
Alguns são apenas programas de
turismo religioso barato. Afinal, os pobres também têm o direito de ir em
algum lugar, já que não o podem fazer a Roma ou Jerusalém! Isso é descer vários
degraus no que a Igreja pós conciliar e o mundo atual preconizam e precisam.
Multidões em algum lugar, escutando sermões, teológica e eclesialmente suspeitos,
é tudo de que nós não precisamos no momento.
Eu estava na maternidade onde
nasceu a Rede Vida. Em Brasília, com os
cardeais da época, discutindo a possibilidade de a CNBB [Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil] assumir para si “uma Tv Católica”. Pela história,
sabemos da recusa dos bispos a esta possibilidade. Mas Monteiro [João Monteiro de Barros Filho, originário
de Barretos, SP] a ofereceu. Posto isso, ela se transformou numa “TV
Católica” sem a CNBB! Creio que foi uma atitude sensata dos bispos e
cardeais. Ter uma televisão porta voz da Igreja fica muito caro e é perigoso.
Outros países já discutiram esta opção e não a endossaram.
Está passando da hora de nos
alinharmos com as ideias refrigeradas de Francisco ensopadas no
[Concílio] Vaticano II e nas Conferências Latino Americanas.
Não vejo sinceramente nenhuma contribuição
deste “modelo de evangelização”
usando padres-show e
santuários, para uma Igreja que precisa
se reinventar nos tempos de mudança de época em
que nos encontramos.
Muita tinta ainda correrá sobre
este “fenômeno” dos anos 90 que chega até aos dias de hoje.
A crise que enfrentamos hoje e que
provoca na Igreja um ressurgimento da dimensão profética e de
proximidade total com os sofredores, empobrecidos, descartados, discriminados e
ateus, não encontra no padre Robson e tantos outros similares nenhuma empatia.
Água e azeite não se misturam.
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