«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Nossos filhos...

 Mimados ou largados?

 Vera Iaconelli

Doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP). Diretora do “Instituto Gerar”, autora de “O Mal-estar na Maternidade” e "Criar Filhos no Século XXI" 

Afinal, as crianças estão superprotegidas ou negligenciadas?


Freud [1856-1939: médico neurologista e psiquiatra austríaco criador da psicanálise], ao cunhar a expressão “sua majestade, o bebê”, anunciava como as crianças preenchiam as expectativas narcísicas dos pais. O projeto de ter um filho era socialmente valorizado — de fato, compulsório — e baseado no modelo familiar burguês. Mas, se para o inventor da psicanálise, no começo do século 20, era o bebê-majestade que imperava, os pais de hoje estão lidando com algo um tanto diferente. 

Reportagem do último domingo (31 de janeiro) nesta Folha aponta que a média de filhos passou dos espantosos 6,2 entre 1950-55 para 1,8 entre 2010-15, revelando como as condições socioeconômicas e as mentalidades se modificaram. 

O desacordo sobre quem deve/pode assumir o cuidado com a nova geração torna a redução do tamanho da prole obrigatória. Mulheres chefiam quase metade dos lares, segundo o IBGE, demonstrando que a família na qual há um pai provedor financeiro e uma mãe cuidadora está em processo de extinção. 

O psicanalista Joel Birman [psicanalista e professor do Instituto de Psicologia da UFRJ] aponta em artigos recentes como a paranoia com casos de pedofilia e abuso de crianças pode ser reveladora de uma nova conjunção, na qual crianças são tidas como entraves para a vida pessoal dos adultos. 

Tendo que escolher entre ser mãe ou ser mulher — dualismo que impera em séculos recentes — as mulheres têm preferido cada vez mais a segunda opção, ou adoecido tentando conciliar as duas. Sua majestade vem dando lugar ao bebê-estorvo, que ninguém consegue ou quer cuidar. 

A rede de militantes do Qanon ilustra bem o status das crianças no imaginário atual. Seus integrantes se organizam em torno da ideia de que haveria um estado paralelo de pedófilos tentando dominar o mundo. 

Algumas características da paranoia são exemplares aqui: uma convicção inabalável — não há ciência que demova essa certeza enlouquecida — e a impossibilidade de traduzir os dados da realidade — psíquica e social — sem expressá-las em teorias conspiratórias. 

Ao invés de reconhecer que a relação com as crianças se tornou mais ambivalente e socialmente preocupante, atribui-se esse fato às forças subterrâneas do mal. Jeitinho astuto de tentar se livrar do incômodo inconsciente. 

Isso não significa que pais e mães de hoje amem menos seus filhos do que as gerações anteriores! O amor é um laço social contingente que pode ou não acontecer em qualquer relação.

O que mudou é que as condições para cuidar de filhos se deterioraram tanto que estamos diante de uma batata quente, que ninguém consegue assumir sozinho.

Winnicott [1896-1971: pediatra e psicanalista inglês] nos lembra que mimar os filhos é uma forma de tentar compensar nossa sensação de termos sido negligentes, principalmente no início. Expectativas irreais, condições desfavoráveis e sentimentos ambivalentes levam pais e mães a superproteger por se sentirem descuidados. Daí que mimar e não colocar limites vêm junto e não separado da negligência. 

Basicamente temos lidado com a infância por meio da falta de limites, da negligência e da paranoia.

E não se trata da família de fulano ou sicrano — embora existam famílias piores e famílias melhores — é a sociedade neoliberal como um todo que não tem conseguido responder à equação filhos-trabalho-casa-vida pessoal. 

As soluções para a infância precisam ser coletivas, porque os sintomas — tenhamos ou não filhos — o são. 

Fonte: Folha de S. Paulo – Colunas e Blogs – Segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021 – 23h15 (Horário de Brasília – DF) – Internet: clique aqui (acesso em: 03/02/2021).

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