Um bispo católico ergue sua voz profética!
“Vivemos tempos difíceis”
Dom Francisco
Biasin
Bispo
Diocesano de Volta Redonda – RJ
Conclamamos todas as pessoas de boa vontade, sensíveis
aos valores da
justiça e da solidariedade a se juntarem e a se
manifestarem contra as
medidas que afetam o bem comum e a vida dos mais pobres
e indefesos
«Assim fala o Senhor Deus:
Grita forte, sem cessar, levanta a voz como trombeta e
denuncia os crimes contra
o meu povo e os pecados da casa de Jacó.»
(Isaías 58,1)
Caros fiéis
Diante da gravidade do momento político,
social, econômico e moral que vivemos nos últimos tempos e inspirados pelo
testemunho do Evangelho, não podemos ficar calados. No conturbado ano de 2016, o nosso país deparou-se com uma avalanche
de projetos e decisões do Congresso alguns já implementados que claramente trarão em curto e médio
prazos consequências graves para toda a sociedade
brasileira, de modo especial para os trabalhadores e os pobres.
A crise econômica é apresentada como a grande
vilã do momento, pela qual se justifica qualquer medida
sócio-político-econômica. As medidas são
impostas em pacotes prontos e fechados. O Congresso e o Senado servem
apenas como fachada para dar legalidade ao que uma elite conservadora já decidiu de antemão: privilegiar o sistema financeiro e defender os interesses do grande capital.
O preço é impor enormes sacrifícios aos mais
pobres e desestruturar as condições de sobrevivência das pequenas empresas
e da própria economia familiar.
Como a atenção da população está focada na
crise econômica, é importante não nos
distrairmos em relação a outros setores da vida social, tais como:
* a polêmica reforma
do ensino médio,
* a redução
da maioridade penal com medidas duras de imputar penalmente os
adolescentes,
* a reforma
da Previdência Social em tramitação no Congresso nestes dias, com
consequências desastrosas para os empobrecidos no próximo futuro, e
* as alterações
em leis trabalhistas conquistadas com luta e sangue de operários.
Infelizmente todas essas medidas apontam para sérios
retrocessos em diversas conquistas que resultaram da mobilização de milhões de
brasileiros e brasileiras desde tempos passados, como
o da Constituinte, até os nossos dias.
É escandalosa
a ascensão ao poder de pessoas de duvidosa reputação, sob suspeita de corrupção
ou em adiantado processo de investigação, para ocupar cargos de alta
responsabilidade no Legislativo, no Judiciário e no Executivo.
Assistimos a um grande recuo de iniciativas que resgatem a dignidade popular. Até
propostas de lei de iniciativa popular, um grande avanço constitucional, são
barradas no Congresso. Vozes
inconformadas e clamor popular que manifestam insatisfação ou dissenso são
apresentados pela mídia como elementos de estorvo e distúrbio diante da
perspectiva de constituir uma nova
ordem para salvar o país. Assim as leis e a governança não colocam
a economia e a atividade política a serviço da pessoa humana e das suas necessidades básicas, pelo
contrário a gestão da coisa pública e a aprovação de emendas parlamentares são
pensadas para salvar um projeto de economia
neoliberal que impõe pesos insuportáveis nos ombros dos mais pobres.
Outras
questões graves nos preocupam: vemos aprovadas leis, varadas na calada da noite ou
com canetadas do Judiciário, que desmantelam a família, negam dignidade ao
nascituro e descaracterizam a concepção da identidade sexual da pessoa humana,
ferindo profundamente a sensibilidade de grande maioria do povo brasileiro.
Assim o Estado se dissocia da sociedade
civil como um todo e não interpreta os seus anseios, pelo contrário é usado
por grupos políticos e econômicos que dele se apossaram para sujeitá-lo a seus
interesses. Na nossa região as consequências das medidas apresentadas são
agravadas pela falência do Estado do Rio
de Janeiro e a total ineficiência
dos órgãos governamentais que dificulta possíveis parcerias com a
iniciativa privada.
A privatização da CEDAE é a expressão mais
eloquente de um Estado que agoniza e se
submete às leis do mercado para poder de algum modo sobreviver. O que mais
preocupa a nossa população é:
* o agravar-se da violência alimentada pelo tráfico,
* a falta de perspectivas e de oportunidades para a juventude,
* o desemprego generalizado que atinge as famílias e congela a
economia,
* a precariedade da saúde pública e
* o desmantelamento do SUS de tal forma que os mais pobres, quando ficam
doentes, são condenados a sofrer uma lenta agonia, enfim
* o desespero da fome que leva famílias inteiras a buscar alimento a
qualquer custo, quando não podem mais contar com a solidariedade dos bons.
Conclamamos
todas as pessoas de boa vontade, sensíveis aos valores da justiça e da
solidariedade a se juntarem e a se manifestarem contra as medidas que afetam o
bem comum e a vida dos mais pobres e indefesos. Esta é a hora em que cada
de nós é chamado a exercer a cidadania em relação aos deputados e senadores que
pediram e ganharam o nosso voto na época das eleições para cobrar deles postura
digna e coerente na hora de votar emendas parlamentares que podem prejudicar os
seus eleitores.
O Senhor nos
chama a ser protagonistas da salvação como seus colaboradores na construção do
Reino. Ele
nos convida à vivência da fé, ao exercício da esperança e ao testemunho da
caridade. Isso acontece de fato através de uma ação firme e determinada em defesa da educação e saúde públicas de
qualidade, do direito ao trabalho digno, ao gozo da vida no tempo da justa
aposentadoria, do acesso ao lazer, à cultura e à moradia, ao direito a uma
alimentação saudável para saciar a fome e a sede para viver com dignidade
cuidando da nossa Casa Comum.
Vivemos tempos difíceis! A nossa fé nos guie
e nos fortaleça para podermos assumir a missão de trabalhar para que todos
tenham vida e vida plena.
Com minha bênção de pastor
Volta Redonda, 17 de março de 2017
Dom Francisco Biasin
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