«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Ouçamos os nossos pastores!

 Momento de desgovernos exige coro dos lúcidos, diz dom Walmor, presidente da CNBB

 Anna Virginia Balloussier

Jornalista 

Entrevista especial com Dom Walmor Oliveira de Azevedo

É arcebispo metropolitano de Belo Horizonte desde 2004 e presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) desde 2019. Nascido em Côcos (BA), foi professor universitário e tem doutorado em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana, de Roma. 

O líder dos bispos católicos brasileiros aborda aspectos fundamentais da realidade brasileira e enfrenta temas “quentes” como racismo e assédio sexual na Igreja

DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO

O "coro dos lúcidos" é o antídoto contra "desgovernos e politização abomináveis", diz dom Walmor Oliveira de Azevedo, 66 anos, presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 

Ao ser instado a avaliar a atuação do governo Jair Bolsonaro na pandemia, o arcebispo de Belo Horizonte lamenta que "medidas adotadas pelas instâncias governamentais ignoraram as preciosas contribuições do campo científico". 

Isso em tempos em que, "como bem lembra o papa, um vírus invisível colocou o mundo de joelhos" e já vitimou 21 clérigos no país. A anual assembleia-geral dos bispos foi adiada duas vezes, agora para 2021. 

Nesta entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, dom Walmor fala sobre racismo e assédio sexual na Igreja Católica. 

Também critica a ideia de uma bancada católica no Congresso e diz que a CNBB está atenta a ataques contra ela promovidos por católicos como o youtuber bolsonarista Bernardo Küster. "Ninguém tem o direito de ofender outra pessoa impunemente, espalhar mentiras." 

Eis a entrevista. 

Sabe-se quantos bispos e padres se infectaram com Covid-19 e quantos morreram?

Dom Walmor: A Comissão Nacional de Presbíteros, vinculada à CNBB, contabilizou 415 padres que adoeceram até agosto e 21 mortes. Mas esses números certamente são maiores, considerando os missionários das comunidades religiosas e a complexidade da Igreja, presente em todo o território. Lembro que a ação missionária da Igreja entre os pobres não foi interrompida. Ao invés disso, se intensificou. Assim, mesmo com a adoção das medidas de segurança, muitos católicos adoeceram a serviço da fé. 

Como foi a adaptação da Igreja, com muitos clérigos idosos, a tempos virtuais?

Dom Walmor: Com seus percalços naturais, mas bastante exitosa. Isso se deve ao envolvimento de fiéis leigos, agentes da Pastoral da Comunicação, que contribuíram para que nossas comunidades expandissem seu alcance a partir das tecnologias digitais. Oportuno dizer que esses encontros não eliminam a necessidade das reuniões presenciais para celebrar a fé. Vive-se um tempo singular, quando é preciso assumir que somos corresponsáveis uns pelos outros. A Igreja organiza suas celebrações presenciais sempre atenta aos indicadores da pandemia. 

O sr. criticou a condução de Bolsonaro no começo da crise. Nove meses depois, como vê a atuação do presidente?

Dom Walmor: A gravidade foi subestimada, e medidas adotadas pelas instâncias governamentais ignoraram as preciosas contribuições do campo científico. Esse descompasso repercutiu na população, contribuindo para que muitos não cumprissem as medidas de prevenção. Sem generalizado senso de corresponsabilidade, o país sofreu com explosões de casos e aumento da pobreza, pois o descontrole da pandemia agrava suas consequências na economia. Considera-se a necessidade de um consistente programa de vacinação, exigindo superação de desgovernos e politização abomináveis. O momento exige o coro dos lúcidos. 

Ao assumir a presidência da CNBB em 2019, o sr. disse que se ofereceria ao diálogo com Bolsonaro. Ele aconteceu?

Dom Walmor: Poderia ter ocorrido mais diálogo, pois a Igreja tem muito a contribuir. Uma contribuição que é alicerçada no Evangelho de Jesus Cristo, sem partidarismos, sem defesa de interesses mesquinhos. A Igreja, insistentemente, defende que é preciso cuidar dos mais pobres. Trata-se do ponto de partida para todo governo que deseja ser bem sucedido na missão de ajudar na construção de uma sociedade mais justa. 

Como a instituição reage a leigos como Bernardo Küstner, youtuber católico bolsonarista que ataca a CNBB e a chama de comunista?

Dom Walmor: A Igreja congrega muitas diferenças. Há irrestrito respeito à liberdade de cada um. Ao mesmo tempo, a CNBB está atenta a situações que se configuram crimes. Ninguém tem o direito de ofender outra pessoa impunemente, dedicar-se a calúnias, espalhar mentiras. Há uma equipe, formada por teólogos, comunicadores e juristas, mobilizada para essa tarefa. Em casos extremos, ela busca meios legais para coibir crimes e punir seus autores.

Infelizmente, algumas pessoas se dedicam a caluniar e a agir com agressividade, adotando um jeito de ser incoerente com a fraternidade cristã. 

Qual foi o recado das eleições municipais?

Dom Walmor: Sinalizam para um enfraquecimento das polarizações que muito atrapalham a democracia, pois criam um clima fratricida, com apegos a ideologias. Só o tempo dirá se, de fato, vamos iniciar novo ciclo na democracia brasileira, mas penso que o recado das urnas é que o povo não tolera extremismos, seja de que lado for. 

A CNBB teve a campanha Meu Voto Importa, que dizia ser importante ficar atento para não ser enganado. Quais as maiores fake news que alcançam cristãos?

Dom Walmor: Há notícias falsas de que a Igreja defende ou repudia este ou aquele candidato. Ou que esta ou aquela pessoa não merece voto por se opor aos valores do Evangelho. Ora, esse tipo de julgamento não é feito pela Igreja Católica, que é apartidária e defende a liberdade dos cidadãos. Cabe a cada pessoa que se aproxima dos ensinamentos de Nosso Senhor e Salvador identificar qual candidato cultiva um jeito de ser e agir coerente com a identidade cristã, afastando-se daqueles que fazem proselitismo e não priorizam os mais pobres. Importante desconfiar também dos que se propõem a constituir ou fortalecer a “bancada da Igreja Católica”. A Igreja não constitui grupos nos parlamentos para defender seus interesses. 

O sr. criticou, no Facebook, o aborto legal feito numa menina de dez anos que engravidou após ser estuprada pelo tio. Vê como acertada a iniciativa de grupos religiosos de tentar deter o procedimento?

Dom Walmor: Defendemos sempre o que a fé cristã católica nos ensina: a vida é inviolável, em todas as suas etapas. Trata-se de um princípio inegociável, que deveria inspirar leis e decisões nas instâncias do poder. As autoridades deveriam zelar para que as mães pudessem viver uma gestação saudável e oferecer perspectivas de um futuro digno para a mãe e a sua criança. Mas respeita-se sempre o ordenamento jurídico-legal vigente, com ele abrindo debates construtivos para defender princípios éticos. Não podemos impor nossas perspectivas. O aborto é uma violência contra a vida. Mas não se combate a violência com agressividade. 

O arcebispo de Belém é investigado por abuso sexual. Não é um caso isolado. A CNBB faz o bastante para coibir casos de assédio no clero?

Dom Walmor: Infelizmente, quando se noticia que há uma investigação em curso, a opinião pública, em ato contínuo, já impõe estigmas, antes mesmo de qualquer parecer das instâncias competentes. Importa a verdade e a confiança depositada em quem merece respeito e credibilidade. Temos presente o que nos diz o apóstolo Paulo escrevendo aos Coríntios: “Se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele”.

Recentemente, a CNBB e a Conferência dos Religiosos do Brasil instituíram núcleo que vai auxiliar as dioceses na criação de suas comissões responsáveis por encaminhar denúncias à Santa Sé. Foi instituída também a Comissão Especial de Proteção da Criança, Adolescente e Vulneráveis. 

O papa nomeou novos cardeais em novembro, entre eles o primeiro afro-americano. Ao observarmos um conclave, a maioria é de senhores brancos. O racismo interno é algo detectado pela Igreja?

Dom Walmor: O racismo é mal que precisa ser enfrentado inclusive na Igreja. O papa continua avançando na composição de feições próprias da universalidade da Igreja. Oportuno lembrar: Francisco é o primeiro pontífice eleito que nasceu no hemisfério sul. 

Por que observamos o aumento de pessoas sem religião no Brasil e em boa parte do Ocidente?

Dom Walmor: Todas as instituições, inclusive as ciências, têm enfrentado questionamentos e cedido lugar às perspectivas mais individualistas, subjetivas. O ser humano, gradativamente, se fecha nas próprias convicções, achando-se o centro de tudo. A religião ajuda as pessoas a enxergarem que existe algo maior, um propósito que ultrapassa o imediatismo, o caráter efêmero da vida. Esse propósito é Deus, de onde viemos e para onde retornaremos. 

Que ensinamentos tiraremos de 2020?

Dom Walmor: Somos desafiados a aprender, com humildade, um novo estilo de vida, percebendo com ainda mais clareza que, diante da obra do Criador, somos pequenos e nada controlamos. Bem lembra o papa que um vírus invisível colocou o mundo de joelhos. Este tempo de pandemia justamente mostra que...

... o ser humano propaga a morte, quando, irresponsavelmente, sem considerar o amanhã, trata com descaso o planeta.

Mas, paradoxalmente, este mesmo tempo desafiador inspira conversões, luzes que brilham nas trevas, dissipando a escuridão. 

Fonte: Folha de S. Paulo – Poder – Quinta-feira, 17 de dezembro de 2020 – Pág. A12 – Internet: clique aqui (acesso em: 17/12/2020).

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