Quando o que importa é lucrar!
Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo*
Vaca coberta de lama em Brumadinho depois do rompimento da barragem da Vale Foto: Douglas Magno/AFP |
Todos ficamos perplexos com a notícia que mais uma barragem com detritos oriundos de mineração
no Estado de Minas Gerais havia se rompido! Desta vez, a tragédia abateu-se
sobre a região de Brumadinho.
Esse episódio, que poderá ser mais calamitoso que aquele de
Mariana, também no Estado de Minas Gerais, é uma tragédia anunciada. Tragédia,
que caminha para tornar-se o maior
desastre humanitário do Brasil, aconteceu na última sexta-feira (25 de
janeiro) depois que a Mina do Feijão
se rompeu e despejou aproximadamente 12
milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro em Brumadinho.
O Procurador Geral de Justiça de Minas Gerais, Sérgio Tonet, disse em entrevista
coletiva que a barragem que se rompeu já era investigada. “Mesmo ela não
estando no rol daquelas 50 barragens em risco, o Ministério Público (MP) de
Minas Gerais na Promotoria de Brumadinho e também o Centro de Apoio das
Promotorias de Justiça do Meio Ambiente instaurou um procedimento específico
pra investigar aquela barragem”, disse Tonet.
Lama no bairro Alberto Flores, em Brumadinho, depois do rompimento da barragem da Vale Foto: Paula Paiva Paulo/G1 |
POUCA FISCALIZAÇÃO
Mesmo após o desastre da barragem de Mariana, o Brasil mantém
uma estrutura precária de fiscalização de suas barragens. Dados do Relatório de Segurança de Barragens de 2017,
publicado no ano passado, apontam que Agência
Nacional de Mineração (AMN) é responsável pela fiscalização de 790 barragens de rejeito espalhadas
pelo País. O trabalho de fiscalização, porém, limitou-se a apenas 211 vistorias
ocorridas em 2017, o que equivale a 27% dessas instalações.
O levantamento de 2017 traz uma lista de 45 barragens que, segundo 13 órgãos de controle, teriam situação preocupante, “por possuírem
algum comprometimento importante que impacte a sua segurança”. A barragem de Brumadinho, da Vale, no
entanto, não aparece nesta relação e nem mesmo é citada no relatório. Para
se ver a deficiência desse tipo de controle!
André Luiz Almeida Mendonça - Advogado-Geral da União |
DE QUEM É A CULPA PELA
TRAGÉDIA?
O advogado-geral da União, André Mendonça, afirmou que
a mineradora Vale é a responsável pelo rompimento da barragem em Brumadinho
(MG). O desastre matou ao menos 34 [hoje, domingo, já são 37 as mortes confirmadas!], e há mais de 250 pessoas desaparecidas.
“Há uma responsabilidade pelo que aconteceu. A responsável
por isso, pelo risco do próprio negócio, é a empresa Vale. O que nós
precisamos ver nesse momento é aguardar as apurações, os levantamentos dos
órgãos técnicos, para verificar a extensão desse dano e como serão adotadas as
medidas de responsabilidade”, disse Mendonça após participar de reunião no
Palácio do Planalto do gabinete de crise que trata do caso.
O ministro da AGU (Advocacia-Geral da União) disse ainda que as
responsabilidades podem ser nas esferas civil, administrativa e até criminal.
Um cachorro é visto no meio da lama na comunidade de Parque da Cachoeira, afetada pela lama depois do rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho. Foto: Mauro Pimentel/AFP |
PROBLEMA ANTIGO & INFORMALIDADE
O cenário nacional das barragens é marcado pela
informalidade. O Brasil possuía, até dezembro de 2017, nada menos que 24.092 barragens cadastradas pelos
órgãos fiscalizadores, englobando todo tipo de barragem. Do total de barragens
cadastradas, apenas 13.997 (ou 58%)
possuem algum tipo de ato de autorização (outorga, concessão, autorização,
licença, entre outros) e estão regularizadas. Pelas informações dos órgãos
reguladores, 4.510 barragens (ou 18,7% do total cadastrado) submetem-se à Política
Nacional de Segurança de Barragens (PNSB). “As
demais 18.324 (ou 76% das barragens cadastradas) não possuem informações
suficientes para dizer se elas se submetem ou não à PNSB”, informa o
relatório.
Esse é um problema de muitas décadas em nosso país, não
começou ontem e não encontrará solução tão cedo, pelo visto!
Barragem de detritos de mineração da companhia Vale se rompe - Brumadinho (MG) |
NOVA LEI NÃO AVANÇA
Desde o rompimento da barragem de Mariana, em 2015, que
deixou 19 mortos, especialistas em meio
ambiente de Minas Gerais batalham pela aprovação de uma lei específica para
barragens que seja mais rígida no que diz respeito à segurança. Minas tem pelo menos 400 barragens, sendo
que 37 delas são de rejeitos e não têm garantia de estabilidade, segundo
informou a Associação dos Observadores do Meio Ambiente de Minas Gerais – uma
ONG que acompanha os avanços da legislação sobre o tema.
“Entre idas
e vindas, não conseguimos avançar com a Lei de Segurança das Barragens que
ficou para a próxima legislatura”, explicou Leonardo Ivo, presidente
da associação e especialista em gestão ambiental. “A única coisa que temos hoje
é a lei para o licenciamento das barragens.”
O rompimento em Mariana em novembro de 2015 gerou dúvidas
sobre a eficiência do Plano Nacional de
Segurança de Barragens. A política criada em 2010 prevê que as empresas
devem apresentar plano de ação de emergência, de segurança da barragem e fazer
inspeções e revisões periódicas.
Em 2016, uma comissão foi formada no Senado para debater o assunto. O diagnóstico mostrou que a lei precisava mudar, mas um projeto
que tornava mais rígida a segurança de barragens e que previa punições e mais
rigorosas foi arquivado no Senado
sem nem chegar a ser votado. Na Câmara,
outras cinco propostas estão paradas. Portanto, aí está! Os nossos
senadores e deputados federais, mais uma vez, sendo omissos, lentos e
ineficientes na aprovação de leis mais rígidas e melhores!
Vale do município de Brumadinho (MG) antes da tragédia |
Vale do município de Brumadinho após a tragédia |
BARRAGENS ARRISCADAS, MAS MAIS BARATAS
A grande maioria das plantas de exploração conta com barragens de resíduos chamadas de “a
montante”, ou seja, em que os resíduos
resultantes da exploração do minério são acumulados em várias camadas que
vão se empilhando ao longo do tempo. Existem
tecnologias mais modernas para o tratamento dos resíduos, mas elas são mais
caras. Seria a tecnologia de disposição
de rejeitos a seco. No Estado, a questão é agravada porque as barragens
estão muito próximas de áreas povoadas.
Professor de engenharia geotécnica da Coppe/UFRJ, Maurício Ehrlich explica que esse tipo
de barragem é construído em vales,
comuns na paisagem mineira. Conforme ela
se enche de resíduos, é fechada. Uma nova camada de resíduos é acumulada
por cima e, assim, sucessivamente. O método não é usado apenas no Brasil e
tampouco é ilegal. Mas é considerado de
maior risco.
“São várias questões, desde a drenagem da água, passando pela
inclinação do terreno, disposição dos rejeitos”, explica Ehrlich. “É mais difícil de controlar, mais sujeito
a surpresas, justamente porque se constrói por cima dos rejeitos não é tão
consolidado.”
Segundo o promotor de Justiça Guilherme de Sá Meneghin, que atuou no caso do rompimento da
barragem de Mariana, não se pode falar em acidente. “Do ponto de vista
penal, não é um acidente, não é algo imprevisível e incontrolável”, explicou. “É
um crime, um desastre causado pelo homem, fruto da irresponsabilidade de quem
comandou e operou a barragem.”
Clique sobre a imagem e o vídeo lhe mostrará o que aconteceu:
A VIDA HUMANA CEIFADA
O Corpo de Bombeiros de Minas Gerais confirma que resgatou o 34º corpo [hoje, domingo, já estão confirmadas 37 mortes!] em meio a lama que vazou da
barragem Mina do Feijão, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo
Horizonte. O número oficial, divulgado na tarde deste sábado (26 de janeiro), ainda não contabiliza os corpos
encontrados dentro de um ônibus. Portanto, o número de 37 mortos tende a
aumentar! Não pode ser considerado definitivo.
O levantamento revela que 176 pessoas foram resgatadas com
vida. Deste total, 23 estão hospitalizadas em hospitais da capital, de
Brumadinho, Ibirité, Sarzedo e Betim. Até
o momento, 296 pessoas seguem desaparecidas, sendo funcionários da Vale e
terceirizados da companhia.
Bombeiros tentam encontrar pessoas em meio à lama - centenas seguem desaparecidos |
QUAL DEVE SER O IMPACTO DO DESASTRE?
A Vale afirma que a lama não é tóxica. “O material dentro da
barragem já era razoavelmente seco e consequentemente não tem esse poder de se
deslocar por grandes regiões. A parte ambiental deve ser muito menor, e a tragédia
humana terrível”, disse o presidente da mineradora.
Mas especialistas afirmam que há danos ambientais graves, como a contaminação do solo e da água por minério fino que fica na sobra
dos rejeitos. O tamanho e a extensão do impacto ainda são difíceis de ser
medidos.
Estima-se que a lama percorra 200 km de área e chegue ao rio
São Francisco. Ela está descendo a Serra dos Dois Irmãos, que é rica em Mata
Atlântica, deve cair no rio Paraopeba, que abastece um terço da região
metropolitana de Belo Horizonte, e desaguar no rio São Francisco.
Mas nesse caminho a lama tem que passar pela Usina Hidrelétrica de Retiro Baixo e,
por isso, espera-se que essa usina reduza a quantidade de lama que chegará ao
rio São Francisco.
Assista este vídeo com imagens que falam por si mesmas, clique:
O QUE A JUSTIÇA FEZ ATÉ AGORA?
A Justiça mineira determinou o bloqueio de R$ 5 bilhões da mineradora Vale. A medida, segundo o
órgão, é para garantir a adoção de medidas emergenciais em defesa do meio
ambiente. A Justiça já havia determinado bloqueio de R$ 1 bilhão, após pedido
da Advocacia-Geral do Estado.
Os recursos vão ser usados para ajudar as vítimas e na redução de danos. A primeira decisão liminar
também exigiu da Vale:
* Estancar o vazamento em até 5
dias.
* Iniciar a remoção do volume de
lama.
* Mapear danos para elaborar plano de recomposição da
área.
* Adotar medidas para evitar contaminação de nascentes.
* Controlar proliferação de pragas e
vetores de doenças.
O inquérito
aberto pela Polícia Federal vai investigar a autoria e a materialidade do crime
e recolher documentos, fazer interrogatórios e eventuais buscas. A
corporação informou que o inquérito tem 30 dias para ser concluído. A Polícia Civil de Minas Gerais também
instaurou um inquérito.
O Ibama multou a vale
em R$ 250 milhões e a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais (Semad)
impôs outra multa de R$ 99 milhões. Resta saber se, após tantos recursos
jurídicos que a Vale irá interpor, ao final, pagará ou não alguma dessas
multas!
VOCÊ PODE AJUDAR?
Diante da tragédia ocorrida em Brumadinho (MG), a arquidiocese
de Belo Horizonte (MG) inicia campanha solidária para arrecadar
roupas, alimentos e água, destinados aos atingidos pelo rompimento da barragem.
As doações podem ser entregues no seguinte endereço:
Rua Além Paraíba, 208 – Lagoinha – Belo Horizonte (MG)
Contato: (31) 3423-2187 e 3422-7141.
Também é possível doar pela conta:
Vicariato Episcopal para a
Ação Social e Política
Banco do Brasil
Agência: 3494-0
Conta Corrente: 26227-7
Segue, logo abaixo, mensagem
do arcebispo dom Walmor Oliveira de Azevedo:
Minas está de luto
Mais uma “abominação da
desolação”, como disse Jesus no Evangelho de Marcos, referindo se aos absurdos
nascidos das ganâncias e descasos com o outro, com a verdade e com o bem de
todos: mais uma barragem rompida em Minas Gerais, agora em Brumadinho, Região
Metropolitana de Belo Horizonte. A Arquidiocese de Belo Horizonte une-se a cada
um dos atingidos, compartilhando suas dores. Nossas comunidades de fé,
especialmente às que servem ao Vale do Paraopeba, estejam juntas, para levar
amparo, ajuda, a todos que sofrem diante de tão lamentável tragédia.
Os danos humanos e
socioambientais são irreparáveis e apontam para uma urgência, já tão evidente: é
preciso repensar modelos de desenvolvimento que desconsideram o respeito à
natureza, os parâmetros de sustentabilidade. Uma triste coincidência: nesta sexta-feira,
dia 25, quando uma barragem se rompe no coração da nossa amada Brumadinho,
entrou em pauta, no Conselho da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável, autorização para a retomada da mineração na
Serra da Piedade. Uma tragédia se efetiva e outra se anuncia.
A Arquidiocese de Belo
Horizonte defende, incansavelmente, de modo inegociável, a natureza, obra do
Criador, compreendendo que o ser humano, as plantas e os animais devem viver em
completa harmonia, pois são todos habitantes do planeta, a Casa Comum.
Rezemos pelas vítimas desta
tragédia, unidos ao coração de cada pessoa e de todas as famílias que sofrem, renovemos,
mais uma vez, o nosso compromisso com a solidariedade. É urgência minimizar
a dor dos atingidos por mais esse desastre ambiental, sem se esquecer de
acompanhar, de perto, a atuação das autoridades, na apuração dos responsáveis
por mais um triste e lamentável episódio, chaga aberta no coração de Minas
Gerais. A justiça seja feita, com lucidez e sem mediocridades que geram
passivos, com sentido humanístico e priorizando o bem comum, com incondicional
respeito e compromisso com os mais pobres. Minas Gerais está de luto.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo
de Belo Horizonte
* Observação:
o conteúdo deste artigo não é original do autor. O mesmo serviu-se de material
publicado pela imprensa brasileira, cujos links na internet estão relacionados
abaixo. Do autor são, apenas, alguns breves comentários.
Fontes originárias do conteúdo deste artigo:
4ª) Folha de S. Paulo – link consultado: clique aqui.
«Mineradoras preferem aumentar
margem de lucro»,
margem de lucro»,
diz deputado que previu tragédia
Paula
Reverbel
Deputado estadual João Vítor Xavier (PSDB-MG) quer
entregar
projeto para Jair Bolsonaro
As empresas mineradoras impediram, em ao menos duas ocasiões,
a aprovação de projetos de lei iriam tornar mais rígidas as normas para
exploração, de acordo com o deputado estadual João Vítor Xavier (PSDB),
presidente da Comissão de Minas e Energia da Assembleia de Minas Gerais (ALMG).
Em julho do ano passado, a comissão rejeitou um texto que
havia sido considerado ideal pelo Ministério Público, pelo Ibama, por mais de
50 ONGs e pelo corpo técnico da ALMG. A proposta contou ainda com a
participação dos autores do projeto “Mar de Lama Nunca Mais”, iniciativa
popular, que reuniu mais de 50 mil assinaturas depois da tragédia de Mariana.
“Foi barrado por pressão das mineradoras, tenho certeza
absoluta”, disse Xavier ao jornal O Estado de S. Paulo. “Elas
preferem aumentar a margem de lucro a aumentar a margem de segurança”,
completou.
Quando seu projeto estava para ser derrotado, o deputado
alertou para a iminência de novas tragédias. “Não estou dizendo que
poderemos ter novas rupturas. Por tudo o que vi, eu não tenho dúvidas de que
teremos rupturas”, previu, em 5 de julho de 2018.
O projeto perdeu por três votos a um – o de
Xavier. Dois dos que votaram contra nem pertenciam à comissão, segundo o
tucano. Foram indicados por seus partidos, substituindo titulares que
faltaram, prática permitida pelo regimento da ALMG.
Depois da derrota, Xavier reapresentou o seu texto, que está
nos estágios iniciais de tramitação. Ele afirmou ao jornal O Estado de S.
Paulo que gostaria de se encontrar com o presidente Jair Bolsonaro, para
que o mandatário encampe a ideia em nível nacional.
Projeto obrigava mineradora
a adotar processos a seco
O projeto defendido por Xavier obriga as empresas mineradoras
a adotarem processos a seco – que custa mais caro e é usado em vários
países do mundo –, ao invés de praticar mineração com água, que torna as
barragens necessárias.
O texto também:
a) veta montar barragens a menos de 10 km de distância de
zonas povoadas,
b) proíbe que secretários de Estado ou governadores
liberem sua construção – sem passar por processo ambiental com audiências – e
c) impede que uma barragem tenha sua
altura aumentada.
“Essas barragens caem porque são verdadeiros lagos que as
empresas vão empilhando”, disse Xavier. Segundo ele, as mineradoras apresentam
projetos para aumentar a altura de barreiras que já existem. “Uma que é
aprovada inicialmente para ter 10 metros, quando você vai ver, está com 100
metros de altura. Isso que aconteceu em Mariana”, explicou.
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