«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Extremismos no Brasil

 A extrema direita tem história

 Silvio Caccia Bava

Jornalista – Editorial 

O principal é a intolerância com os diferentes, com as reivindicações das minorias; a tendência é excluir ou mesmo eliminar os outros

A extrema direita no Brasil não surgiu ontem, ela tem uma longa história que remonta aos anos 1930 e se atualiza nos dias de hoje, com novas tecnologias, mas as mesmas ideias. Seu ideário defende as classes dominantes e seus privilégios e entende as desigualdades sociais como justas e amparadas pelas tradições, pelo sobrenatural. Influenciado pela ascensão do fascismo na Europa nos anos 1920, pelo tradicionalismo e conservadorismo da Igreja Católica e pela cultura escravocrata das elites locais, ele encontrou na conjuntura política do período as condições para sua expansão no país. 

Já nos anos 1920 foi criada a Legião do Cruzeiro do Sul (1922); na década de 1930 formaram-se vários movimentos, como a Ação Integralista Brasileira (1932), a Ação Social Brasileira (Partido Nacional Fascista), a Legião Cearense do Trabalho e o Partido Nacional Sindicalista. A Ação Integralista Brasileira, a maior, converteu-se em partido e contava, em 1936, com um importante contingente de militantes – entre 600 mil e 1 milhão, num país cuja população total à época rondava os 40 milhões de pessoas.[1] Esses grupos opunham-se:

* ao comunismo,

* à perda da ordem moral,

* à separação da Igreja e do Estado,

* à democracia,

* aos direitos humanos.

Eram nacionalistas e defendiam um Estado totalitário, controlador dos indivíduos e de suas organizações coletivas. 

Em 1960 foi criada a Tradição, Família e Propriedade (TFP), movimento que se alia à ala conservadora da Igreja Católica. Dois bispos brasileiros – Dom Geraldo Sigaud e Dom Antonio de Castro Mayer – lançaram nesse ano o livro Reforma agrária: questão de consciência, no qual expressam seu anticomunismo e sua oposição a processos de distribuição de renda.[2]

Durante a ditadura de 1964-1985, os militares buscaram nos evangélicos conservadores seus novos aliados, afastando-se da Igreja Católica progressista e de sua Teologia da Libertação. Essa aliança defendia a agenda anticomunista, contra os cristãos de esquerda, de reafirmação das desigualdades sociais e de defesa de uma moral conservadora. 

Com o fim da ditadura e a promulgação da Constituição de 1988, esses grupos não deixaram de existir, mas se recolheram. Novos atores entraram em cena, buscando aliciar adesões aos seus valores, à sua agenda. É o caso das emissoras de TV que sustentam programas de apologia da violência policial contra os pobres e promovem a identificação do favelado com bandido e o genocídio dos jovens negros. É o caso também das igrejas evangélicas neopentecostais, com sua agenda conservadora nos valores e sua oposição ao aborto e aos casamentos homossexuais. 

Chegando aos dias de hoje, a agenda da extrema direita se mantém. E é preciso dizer que ela e o governo Bolsonaro têm o suporte das principais entidades de representação patronal – Febraban, CNI, Fiesp –, do agronegócio, de setores do comércio, assim como dos principais jornais e emissoras de TV. Na interpretação do cientista político alemão Jean Werner Mueller, “as elites se retiraram do mundo social e político comum”; não lhes interessa saber ou participar da vida em sociedade e da convivência com os diferentes.[3]

A extrema direita éantissocial, autoritária, ultraliberal, promotora do armamento de civis, negacionista da ciência e da educação pública, controladora do pensamento científico, confrontadora das instituições democráticas, dos poderes da República, do voto, das eleições”.[4]

O principal é a intolerância com os diferentes, com as reivindicações das minorias; a tendência é excluir ou mesmo eliminar os outros. 

Essa extrema direita é uma minoria – alguns analistas falam em 12% do eleitorado; outros até menos hoje em dia. Segundo pesquisas, existe no Brasil (agosto de 2020):

* 15% de eleitores fascistas e

* 15% de conservadores não fascistas simpatizantes que apoiam o governo Bolsonaro.[5]

Desde então esse número vem caindo e os simpatizantes reduziram. 

Essa minoria que compõe o núcleo duro do bolsonarismo é radical. Ela trabalha com:

* desinformação,

* aliena seu público da realidade,

* retira a possibilidade do pensamento crítico,

* se baseia na política do medo.

“Na guerra, vale tudo”, argumentam os coordenadores desses processos de produção de fake news. Sua presença nas redes sociais veio se tornando forte graças a políticas do Facebook e do WhatsApp, principalmente; com seus novos algoritmos, que buscam radicalizar o que cada um vê, vão puxando para o centro das atenções sites de extrema direita que antes eram marginais. 

As tecnologias de inteligência artificial modificaram profundamente o tecido social. Manipulam o comportamento humano, as escolhas, a formação da opinião. Mas isso não basta. O que vemos agora é o governo procurando monitorar o comportamento e a visão política dos opositores, perseguir quem é contra, reduzir a participação da sociedade em questões políticas. A negociação do governo federal com Israel para comprar tecnologia de vigilância, o Pegasus, é para esse fim.[6]

Com recursos públicos, o governo federal criou o “gabinete do ódio”, para produzir as fake news, destruir reputações, criar a narrativa que identifica os inimigos e defender o governo. A partir daí, cerca de 100 hubs reproduzem e distribuem esse conteúdo; são:

* influenciadores digitais (65%),

* políticos e partidos de direita (20%) e

* o público geral de direita (5%) que propagam essas mensagens.[7]

A agenda é criada para desviar a atenção das questões centrais, como a destruição das políticas sociais, o aumento da desigualdade ou a deliberada omissão no tratamento da pandemia, para propor uma guerra cultural.

As milícias digitais completam o serviço, ameaçam os opositores e destroem reputações. 

Essa extrema direita se fortalece com a guerra híbrida promovida pelos Estados Unidos no Brasil desde a primeira eleição de Lula, recrudescendo a partir de 2016. É o estímulo de conflitos identitários que exploram diferenças históricas, étnicas, religiosas, socioeconômicas e geográficas e promovem a polarização na sociedade. O objetivo é impedir o PT de chegar ao governo. A Lava Jato, orientada pela Agência de Segurança Nacional (NSA) norte-americana, foi um de seus principais instrumentos.[8]

N O T A S 

[1] Hélgio Trindade, “Integralismo”. Disponível em: www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/integralismo.

[2] Benjamin Cowan, “Maiorias morais nas Américas: Brasil, Estados Unidos e a criação da direita religiosa”. In: André Pagliarini, “Religiosos e reacionários”, Folha de S. Paulo, 25 jul. 2021.

[3] Entrevista com Jean Werner Mueller, O Estado de S. Paulo, 25 jul. 2021.

[4] Eliezer Rizzo, “Protagonismo militar está em pleno ato”, O Estado de S. Paulo, 25 jul. 2021.

[5] Mauricio Mogilka, “Ascensão da extrema direita e reconstrução do campo progressista no Brasil”. Disponível em: https://periodicos.unifap.br/index.php/pracs/article/view/6389.

[6] Francisco Gaetani e Virgílio de Almeida, “Inteligência artificial e democracia”, Valor, 22 jul. 2021.

[7] MAP – agência de análise de dados da mídia, resultados analisando a polêmica do voto impresso. “Renda e saúde: a ‘vida real’ nas redes sociais”, O Estado de S. Paulo, 25 jul. 2021.

[8] Eleonora de Lucena e Rodolfo Lucena, “Agentes externos provocaram uma ‘guerra híbrida’ no Brasil, diz escritor”, Brasil de Fato, 19 out. 2018. 

Fonte: Le Monde Diplomatique Brasil – Editorial – Agosto 2021 – Edição nº 169 – Pág. 3 – Internet: clique aqui (acesso em: 09/08/2021).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.