«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

MENOR + ÁLCOOL PROIBIDO MAS NINGUÉM LIGA


Laura Diniz e Carolina Rangel

A lei proíbe menores de beber, mas ninguém, nem os pais, a respeita. Os jovens pagam o preço por isso, e ele é alto

De todas as leis ignoradas no Brasil — e a lista é longa —, poucas são descumpridas com tanta naturalidade, e na escala, como aquela que proíbe menores de 18 anos de beber. Pesquisa inédita feita  em sete capitais do país — São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Belém e Campo Grande — mostra que: 

  • adolescentes que tentam comprar bebidas alcoólicas têm sucesso em, pelo menos, 70% das vezes. 
  • Na capital paraense, esse índice chega a estupefacientes 88%
  • recorde seguido de perto pelo Rio, com 86%
  • Mesmo em São Paulo, onde uma norma estadual aumenta o rigor das punições aos donos de estabelecimentos que vendem bebidas para menores, 71% dos adolescentes têm trânsito livre para o balcão do bar
As décadas de descumprimento da lei fizeram mais do que consolidar a ideia de que ela não passa de letra morta — contribuíram para que os adultos se habituassem a ver o consumo de bebida por adolescentes como  um “mal menor”, comparado aos perigos do mundo. “Não é”, afirma o autor do estudo e uma das principais autoridades brasileiras no assunto, o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenador do Instituto Nacional de Políticas Públicas do Álcool e Drogas. “Os pais precisam entender que o álcool potencializa o risco de que aconteça aos seus filhos o que eles mais temem." Leia-se: que eles se metam em encrencas, e das grandes.


Dr. Ronaldo Laranjeira - psiquiatra
Levantamentos feitos no Brasil e no exterior comprovam que beber — em qualquer idade — potencializa comportamentos temerários. 
No adolescente, com sua onipotência e impulsividade características, o risco de o álcool provocar ou facilitar situações como: 

  • gravidez precoce, 
  • contaminação por doenças sexualmente transmissíveis, 
  • envolvimento com a criminalidade e 
  • uso de drogas ilícitas é perigosamente maior. 
Junte-se a isso o fato de que, num organismo jovem, o impacto e as consequências da ingestão de bebida são muito diferentes do que os que incidem sobre um adulto (veja o quadro abaixo), e a conclusão — unânime — dos especialistas é menores de 18 anos não devem beber sequer uma gota de álcool.


A experiência de muitos adultos, no entanto, ajuda a enfraquecer o que, para os cientistas, é uma certeza. Muitos pais pensam: “Tomei minhas doses quando era jovem e hoje tenho um emprego estável, uma família feliz e uma relação saudável com a bebida”. Por causa disso, novas pesquisas têm tentado matizar as categorias de bebedores jovens e precisar os riscos associados a cada perfil. Esse tipo de estudo é realizado há pelo menos uma década no exterior, mas só há pouco tempo começou a ser feito também aqui. 


Um precioso levantamento, a ser publicado no mês que vem na revista científica Drugs and Alcohol Dependence, ouviu 15.000 jovens nas 27 capitais brasileiras para mapear como, onde, quanto e o que bebem os adolescentes brasileiros. O foco escolhido foi o grupo que mais preocupa quem trata do problema: jovens que bebem ao menos cinco doses de álcool em uma única ocasião — ou seja, que incorrem na popular “bebedeira”. O cenário que emerge do estudo é alarmante:

  • Ao longo de um ano, um em cada três jovens brasileiros de 14 a 17 anos se embebedou ao menos uma vez
  • Em 40% dos casos mais recentes, isso ocorreu na sua casa ou na de amigos e parentes
  • Os números confirmam também a leniência com que adultos encaram a transgressão. Em 11% dos episódios, os menores estavam acompanhados dos próprios pais ou de tios.

Um dos dados que mais chamam atenção na pesquisa é o que mostra que, ao contrário de países como os Estados Unidos, por exemplo, no Brasil, os jovens mais ricos são os que mais têm o hábito de se embebedar. O estudo mostrou  que quase metade dos jovens da classe A, em que a renda familiar média supera os 10.000 reais, se embriagaram ao menos uma vez no último ano. É quase o dobro do índice registrado entre as classes D e E (renda familiar média de  600 reais). Segundo uma das autoras do estudo, Zila Sanchez, isso se deve sobretudo ao fato de que os brasileiros ainda relevam os riscos do álcool, ao contrário do que ocorre entre os americanos. Além disso, jovens ricos têm uma vida social mais ativa e maior autonomia financeira do que os mais pobres, o que facilita o acesso à bebida. Influenciaria, ainda, um menor temor dos pais dessa classe média alta de que seus filhos se tornem marginais ou fracassados em razão do contato com o álcool, já que o ambiente de proteção social e o histórico familiar não apontam nessa direção. Essa realidade já influencia também a oferta de serviços de saúde. 
Há cerca de dois anos, os médicos do Hospital Israelita Albert Einstein, reduto da classe A, começaram a notar o fenômeno. “Não era comum atendermos adolescentes de 13 e 14 anos com intoxicações alcoólicas. Agora, dois ou três costumam dar entrada aqui por noite às sextas-feiras e aos sábados", explica a pediatra Paula Cristina Ranzini. da Unidade de Pronto Atendimento Infantil da unidade Morumbi do Einstein. Os jovens chegam entre 23 horas e meia-noite e são levados pelos pais ou por pais de amigos. A situação mais comum é terem exagerado em bebidas ice (como é conhecida a mistura de vodca com refrigerante ou suco de fruta) e destilados em festas na casa de amigos, chamadas de "esquenta". Os pais ficam perplexos e, muitas vezes, trocam acusações na frente dos médicos. Diante da situação, o hospital montou um protocolo de atendimento especial para adolescentes embriagados, que prevê encaminhamento para consulta com terapeuta e, nos casos mais graves, avaliação psicológica antes da alta.
Entrevistas feitas por VEJA com jovens, pais e funcionários de bares de norte a sul do Brasil refletem com precisão a teoria do “mal menor" captada pelas pesquisas. Uma mãe de Porto Alegre, por exemplo, disse que incentiva os filhos a beber em casa com os amigos para que não façam isso na rua, onde estariam desamparados. Ela acredita que assim está protegendo devidamente os meninos. Outros, como um garçom de Belém, admitem vender bebidas a menores, porque, se ele não o fizer, “outra pessoa vai  fazer". Documentos de identidade falsificados, companhia indispensável nas noitadas, são aceitos à larga


E a completa falta de fiscalização para coibir tanto o consumo como a venda das bebidas é a regra. Vende-se livremente porque não há a menor possibilidade de punição. 


Algumas iniciativas isoladas, no entanto, começam a atacar o problema.


Em outubro do ano passado, o governo paulista sancionou uma lei que prevê multa de até 92.000 reais a estabelecimentos que vendam bebidas a menores, mudando o eixo da correção da pessoa física — o garçom incauto — para a jurídica — o dono do empreendimento. Quase 200.000 locais já foram inspecionados, mas em menos de 1.000 houve punição, o que demonstra que ainda há um longo caminho a percorrer. Campanhas mais localizadas também têm surtido efeito. Em Pindamonhangaba, no interior de São Paulo, moradores se mobilizam desde 2008 para diminuir o consumo de álcool entre os jovens. Nem o tradicional quentão é mais servido nas festas juninas, e o número de lugares que vendem bebidas a menores caiu cerca de 50% — abaixo da média brasileira, mas ainda um escândalo.


Esse cenário de vergonha nacional requer, antes de tudo, uma mudança de mentalidade. Até recentemente, pouca gente achava que o cinto de segurança era um acessório útil — ou via algum problema em estar ao lado de um fumante num bar ou em outro ambiente fechado. Essas visões não mudaram a partir da criação de novas leis, mas a partir do momento em que a obediência às regras passou a ser cobrada. A fiscalização precisa ser apertada nas ruas e o rigor tem de aumentar em casa. Nos dois casos, o caminho mais seguro para proteger os adolescentes das ciladas do álcool é um só: seguir a lei. Bebida só depois dos 18.



Existe saída para a tragédia

André Petry
De Nova York

Aos olhos de um brasileiro, pode parecer um milagre, mas a obra é dos homens: os americanos estão conseguindo reduzir o nível de consumo de bebidas alcoólicas entre os jovens. Na última década, a fatia de adolescentes de 14 a 18 anos que consomem bebida alcoólica de vez em quando caiu de 50% para 38,7%. É um feito notável. Existem várias explicações para o sucesso, mas há  mais coisas evidentes: a educação preventiva é uma mania nacional, a lei é rigorosa  e a punição, ainda mais.
Até 1984, cada estado americano definia a idade mínima para comprar  bebida alcoólica. Desde então, criou-se uma regra nacional à qual os estados eram convidados a aderir: menores de 21 anos são proibidos de comprar qualquer  tipo de bebida alcoólica. Todos cinquenta estados americanos ratificaram a nova lei. Assim, os EUA tornaram-se o único país entre as democracias com idade tão avançadas para o consumo de bebida alcoólica. Cada estado é livre para legislar os detalhes, mas, em geral, a venda de bebida a menor de 21 anos dá multa raramente e, prisão. Vender bebida a menor  de 18 anos, no entanto, quase sempre da prisão. Nos últimos tempos, al­guns juizes decidiram dar sentenças exemplares para reforçar ainda mais o respeito à lei pelos bares e mercados.


Um caso desse tipo aconteceu em Riverview, perto de Tampa, na Flórida. No dia 28 de fevereiro de 2008, o ado­lescente David Holdsworth, então com 17 anos, entrou duas vezes no mercado Best for Less e comprou cerveja. Pagou mais caro pela bebida, usou dinheiro vivo e saiu do local com as garrafas dentro de uma sacola de papel pardo. O Best for Less era conhecido pelos jo­vens da região por vender bebida a me­nores de idade nessas condições: preço maior, dinheiro vivo e embalagem dis­creta. Holdsworth bebeu as cervejas e, na volta para casa, arrebentou seu Camaro na avenida à beira-mar e matou um jovem de 32 anos. Agora, quatro anos mais tarde, o caso está encerrado. Holdsworth pegou cinco anos de pri­são, mas os donos do Best for Less ar­caram com a multa mais pesada da his­tória: 716 milhões de dólares. Ao dar a sentença, o juiz Sam Pendino deixou claro que queria mandar uma mensa­gem: quem vende bebida a menores de idade está arruinando vidas — e o pre­ço é incalculável. Com casos assim, o respeito à lei que proíbe a venda de be­bida alcoólica a menores tem sido cada vez maior.


Os americanos estão abrindo outro capítulo na batalha contra o consumo de álcool pelos jovens. É a Lei do Anfi­trião, que pune quem dá uma festa, mesmo que em sua casa, e permite o consumo de bebida alcoólica por meno­res de idade. Em alguns estados, a lei não se limita a festas. Em Washington, tornou-se crime oferecer bebida a me­nores em qualquer ocasião e em qual­quer lugar. Em Massachusetts, um dos estados politicamente mais liberais, a Lei do Anfitrião já gerou um caso peda­gógico. Tiffany Clark, 37 anos, foi man­dada para a cadeia por deixar que me­nores bebessem numa festa em sua ca­sa. Foi a primeira vez que um episódio em que não houve vítimas fatais acabou em prisão para o anfitrião. De novo, o juiz do caso quis mandar um recado à comunidade. Tiffany Clark ficará seis meses na cadeia e outros seis meses em prisão domiciliar, quando terá de usar tornozeleira eletrônica. Por três anos, estará sob vigilância da lei. Se cometer alguma infração, voltará para a cadeia.


Numa terra em que a lei vale para todos, o filho do governador de Rhode Island também está enrolado com a Lei do Anfitrião. Caleb Chafee, 18 anos, deu uma festa na mansão do pai para comemorar a formatura no ensino mé­dio. Serviu cerveja e vodca aos amigos menores de 21 anos. A polícia estadual soube da farra e abriu uma ocorrência. "Stephanie e eu ficamos muito chatea­dos", disse o governador, referindo-se à sua mulher. Ele acrescentou que o caso seria tratado como “assunto privado”, mas fez questão de explicar que nem ele nem a mulher estavam em casa no dia da festa. Lei é lei: em abril, o filho do governador foi flagrado tentando com­prar cerveja. Foi condenado a pagar 100 dólares mais — detalhe imperdível - 3,50 em custas judiciais.


A Lei do Anfitrião já teve reflexo nos acidentes de trânsito. A professora Angela Dills, do Providence College, analisou os acidentes com vítimas fatais provocados pela embriaguez de jovens entre 18 e 20 anos. Examinando os da­dos dos últimos trinta anos, Angela constatou que esse tipo de acidente caiu em todos os estados americanos, mas, naqueles que adotaram a Lei do Anfi­trião, a queda foi 9% maior. A conclu­são é que a lei reduz o número de jovens alcoolizados ao volante. As estatísticas ainda são uma tragédia — a cada ano, 5000 americanos menores de 21 anos morrem em decorrência de algum aci­dente relacionado ao consumo de álcool —, mas poderiam ser piores.


A experiência americana mostra que, para evitar o desperdício de vidas jovens, não é preciso invocar um mila­gre. A educação preventiva sobre os ris­cos do álcool é um imperativo no siste­ma escolar americano. Os especialistas dizem que a colaboração da comunida­de, e sobretudo dos pais, é outro fator decisivo. Além disso, a sociedade ame­ricana sabe que há duas possibilidades diante da lei: cumpri-la ou ser punido por ela. Uma terceira alternativa — vio­lar a lei e ficar tudo por isso mesmo — também acontece nos Estados Unidos, mas é um risco tão alto que, em geral, não vale a pena correr. Tiffany Clark aprendeu isso com a liberdade. Os do­nos do Best for Less, com o bolso.


Fonte: Revista VEJA - Especial - Edição 2277 - Ano 45 - Nº 28 - 11 de julho de 2012 - Pgs. 80 a 87 - Edição impressa - Internet: https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/7/9/menor-alcool-proibido-mas-ninguem-liga/ e https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/7/9/existe-saida-para-a-tragedia/

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