Destruindo a educação e a ciência no Brasil
O desmonte do conhecimento
Editorial
Jornal «O Estado de S. Paulo»
Áreas
de ensino, ciência e pesquisa não têm prioridade no governo Bolsonaro
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Sem investimento pesado em ciência, pesquisa, ensino universitário não há progresso e independência, de fato, de nenhuma nação no mundo! |
Quem perde e o quê?
I. Verbas para pesquisa
1) No Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a redução do orçamento
obrigou o órgão a financiar em 2021 somente 13% das 3.080 bolsas de
pós-graduação e pós-doutorado que já haviam sido aprovadas. A informação
foi divulgada recentemente pelo próprio órgão, deixando a comunidade científica
perplexa.
2) Já a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes) perderá neste
ano quase um terço do que recebeu em 2019.
3) O Fundo Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) também sofreu cortes
drásticos, segundo levantamento da Academia Brasileira de Ciências, da
Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior
(Andifes) e do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica (Conif).
4) Essas entidades também lembraram que o orçamento previsto para o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), em 2021, equivale a menos de um terço do que foi repassado uma década atrás.
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Até a coleta de lixo na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), desde 2020 está inviabilizada devido à falta de verbas! |
II. Universidades Federais
No ensino superior, as universidades
federais enfrentam graves dificuldades para pagar despesas de custeio, como
água, energia e segurança, não dispondo também de recursos para manter
pesquisas em andamento.
1) Por causa dos cortes, o orçamento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) voltou
ao patamar de 2008, quando tinha 20 mil alunos. Hoje ela conta com mais de
36 mil alunos, dos quais 8,5 mil são apoiados por programas de ações
afirmativas.
2) Na Universidade Federal de
Juiz de Fora (UFJF), o reitor Marcus David informou que as atividades
de ciência e tecnologia estão “acabando” na instituição.
3) Já na Universidade Federal da
Bahia (UFBA), a Reitoria anunciou que o orçamento aprovado para 2021
equivale ao do exercício de 2010 e alegou que a redução de recursos
orçamentários, conjugada com contingenciamentos, está levando à “destruição”
da instituição.
4) A reitora Denise de Carvalho e o vice-reitor Carlos
Rocha, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
publicaram artigo no jornal O Globo alertando para o risco de a
instituição “fechar as portas” a partir de julho. “A universidade está
sendo inviabilizada”, concluíram.
5) Outra instituição importante, a Universidade de Brasília (UnB) distribuiu nota
lembrando que “a redução crescente dos recursos, associada a bloqueios e
contingenciamentos, prejudica a execução do planejamento da instituição. A
política de contínua redução orçamentária trouxe dificuldades e desafios nunca
antes vivenciados”.
Por seu lado, o MEC lamenta a redução dos recursos da rede federal de ensino superior e informa que não tem medido esforços no Ministério da Economia para tentar “uma recomposição e/ou mitigação das reduções orçamentárias das instituições federais de ensino superior” e obtido um repasse que, apesar de pequeno, garante a elas algum fôlego financeiro para os próximos meses.
Independentemente desses
esforços, a situação em que as áreas de ensino, ciência e pesquisa se encontram
não se deve apenas à crise econômica. Ela trouxe inúmeros problemas, não se
pode negar.
Mas a verdade é que as dificuldades enfrentadas por essas três
áreas decorrem do fato de elas jamais terem sido consideradas prioritárias
desde o início de um governo que não sabe o que é planejamento e não tem
noção de futuro.
Determinado por razões políticas e ideológicas no início do governo, o desinvestimento no CNPq, na Capes e nas universidades federais vem, paradoxalmente, ocorrendo no momento em que o Brasil mais necessita de pesquisadores e universidades trabalhando a pleno vapor. Por isso, atribuir a asfixia financeira do ensino, da ciência e da pesquisa às dificuldades econômicas causadas pela pandemia, como as autoridades educacionais vêm fazendo, é mais do que escamotear a verdade.
É um
crime praticado contra os cidadãos e as futuras gerações.
Fonte: Estado de S. Paulo – Notas & Informações – Sábado, 15 de maio de 2021 – Pág. A3 – Internet: clique aqui (acesso em: 16/05/2021).
O pastor pede pelo
MEC
Renata Cafardo
Repórter especial do jornal O Estado de S. Paulo e fundadora da Associação de Jornalistas de Educação (JEDUCA)
Não
há verba na pasta para quem quer entrar na faculdade ou para quem já está nela
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MILTON RIBEIRO é o atual Ministro da Educação, mais um pastor evangélico no poder! |
Avisou
que os cortes de verbas inviabilizam “a realização de diversas políticas
estratégicas para a melhoria da educação no País”.
Incrível, o próprio MEC insiste em negar oficialmente, mas o documento mostra que não há dinheiro para fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) neste ano. A prova é a mais importante do País e esperada por cerca de 6 milhões de jovens em busca de um lugar na faculdade.
Também não há para bolsas
de pesquisa ou auxílio estudantil para quem já conseguiu um lugar no ensino
superior. O ofício diz ainda que...
... o
“funcionamento geral” das universidades federais vai ficar comprometido se as
verbas não forem desbloqueadas.
Bobagens ditas por Paulo Guedes
Há poucas esperanças de uma resposta animadora. O destinatário da carta, há cerca de 15 dias, insistiu em atacar de forma grotesca essas instituições e as pessoas que lá trabalham ou estudam. Em uma reunião em que defendia a educação privada, Guedes disse que as federais estão em estado “caótico”, “ensinando sexo para criança de 5 anos, com maconha, bebida, droga”. Citou ainda o educador Paulo Freire, alvo predileto quando bolsonaristas falam de ensino, aclamado no mundo por defender a educação democrática e focada no cidadão.
Quem tem o mínimo de sensatez se pergunta o que crianças de 5 anos estariam fazendo numa universidade. Ou o que Freire tem a ver com as centenas de laboratórios que pesquisam vacinas e tratamento para a covid nas federais. E ainda qual relação teria essa bobagem dita por Guedes com os hospitais universitários, referências em suas regiões, que atendem vítimas da pandemia.
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PAULO GUEDES, Ministro da Economia, não esconde sua aversão às Universidades Federais, a sua falta de visão de futuro por não priorizar a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico |
O MEC sofre este ano uma redução de recursos sem precedentes. O pastor Ribeiro clama a Guedes desbloqueio de R$ 2,7 bilhões e mais R$ 2,6 bilhões. O orçamento das federais, por exemplo, foi aprovado por Bolsonaro com corte de R$ 1 bilhão e houve ainda mais dois bloqueios de verbas.
Hoje, o valor livre que pode ser usado pelas 69 instituições
[Universidades Federais] é equivalente ao que havia em 2004. Naquela
época, só existiam 51 federais.
E não há exagero, muitos espaços nas instituições podem ficar sem funcionar por falta de energia, limpeza, materiais básicos, que é para onde vai esse dinheiro. Só na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), há cerca de 200 projetos de pesquisa relacionados à covid. Um deles, de uma vacina feita com o Incor, precisa de R$ 400 milhões para avançar para a fase clínica. E dinheiro para se armazenar sangue, fazer experimentos, comprar EPIs para os pesquisadores.
Uma universidade não é só aula. O ensino de disciplinas teóricas está sendo feito online, mas isso não é desculpa para redução drástica no orçamento. Nos últimos anos, as federais dobraram de tamanho, com um investimento recorde durante os governos do PT, também criticado por Guedes e sua turma. Aumentaram em estrutura e em alunos, abrindo espaço para estudantes mais pobres, que precisam de ajuda para se manterem na graduação – casa, alimentação, materiais. Atualmente, 25% dos alunos são de famílias com renda inferior a um salário mínimo. E outros 50%, de um salário e meio.
Depois de 2015, o dinheiro para as universidades já começou a diminuir, mas nada como se viu durante o governo Bolsonaro – que traz junto ataques ideológicos e políticos. E, pior, no ano da pandemia, quando o Brasil mais precisa de educação e ciência. Os efeitos no curto prazo são claros. No médio e longo prazos, é o desenvolvimento de um país que vai escorrendo pelo ralo.
Fonte: O Estado de S. Paulo – Educação / Colunista – domingo, 16 de maio de 2021 – Pág. A15 – Internet: clique aqui (acesso em: 16/05/2021).
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