«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 4 de maio de 2021

Religião no poder

 Bancada evangélica seria menor se igreja pagasse impostos, aponta estudo

 Bruno Ribeiro 

Estudo se baseou em dados fornecidos pelas igrejas à Receita Federal. Com uma alíquota de 34%, o total de igrejas poderia ser até 74% menor

No Brasil, hoje, há quase 220 mil igrejas (templos religiosos)

O número de igrejas abertas no País seria menor e a bancada evangélica no Congresso Nacional não teria chegado ao tamanho que tem hoje caso não houvesse isenção de impostos para o setor religioso. É o que aponta uma pesquisa proposta por dois economistas, da USP e do Insper, divulgada na semana passada. O benefício tributário ao setor religioso foi garantido pela Constituição de 1988. 

A pesquisa “A Economia Política do Pentecostalismo: Uma Análise Estrutural Dinâmica”, dos professores Raphael Corbi, da USP, e Fábio Sanches, do Insper, faz uma análise sobre efeitos práticos da política de incentivos fiscais vigente.

“Eleição a eleição, a gente vê um aumento da bancada evangélica. Esse aumento tem a ver, sim, com a expansão geográfica dos templos, que por sua vez está ligada aos incentivos fiscais”, disse Corbi.

A ideia foi medir a expansão das igrejas no País desde a aprovação da Constituição e projetar como esse movimento teria se dado caso elas pagassem impostos. Para isso, utilizaram modelos matemáticos já existentes, usados para indicar o peso das alíquotas de impostos variadas para o crescimento de outros setores. 

O estudo se baseou em dados fornecidos pelas igrejas à Receita Federal. Com uma alíquota de 34%, a taxa média cobrada das demais atividades, o total de igrejas no País, hoje de 216,3 mil poderia ser até 74% menor. 

A segunda parte do estudo avaliou o impacto político dessa eventual redução. Os pesquisadores cruzaram os mesmos dados da Receita com informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a eleição de candidatos da Frente Parlamentar Evangélica. E mediram a variação de votos que os candidatos da bancada tiveram em momentos anteriores ou posteriores à abertura de uma igreja em determinada região. Dessa forma, observaram que, após uma igreja ser aberta, candidatos desse grupo têm a participação nos votos subir de 2% a 3%. 

O fenômeno vale para as igrejas evangélicas, mas não para as católicas. A abertura de uma igreja romana não influencia os resultados eleitorais, de acordo com a pesquisa. “Fiéis de igrejas pentecostais tendem a ser mais participativos” e comparecem mais aos locais de reunião, disse Fábio Sanches, do Insper. 

Raphael Corbi, da USP, disse que a pesquisa “não tem julgamento de valor”. “É um artigo agnóstico no sentido de questionar se será que devemos ou não subsidiar igrejas. Não é um ataque às pentecostais. O subsídio ajuda a explicar essa ascensão meteórica dessas igrejas? Sim. Essa ascensão está associada à expansão desse grupo político? Sim. E a gente trouxe números para quantificar isso.” 

CEZINHA DE MADUREIRA - deputado federal pelo PSD de São Paulo

Contrapartida

O coordenador da Frente Parlamentar Evangélica na Câmara, deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP), disse que as igrejas prestam uma série de serviços sociais às comunidades onde estão instaladas. “Elas fazem o que o Estado não faz.” Por isso, na avaliação dele, a isenção fiscal garantida pela Constituição é revertida em serviços. 

Para o deputado, o crescimento da bancada é decorrente do aumento da população evangélica no País. Mas, na avaliação dele, o aumento desse porcentual não está ligado ao crescimento da abertura de novos templos. 

Madureira afirmou que as projeções são de crescimento ainda maior da população evangélica no País na próxima década. Desse modo, afirmou, “a bancada evangélica vai crescer ainda mais”. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – Política – Sábado, 1 de maio de 2021 – Pág. A8 – Internet: clique aqui (acesso em: 03/05/2021). 

Estado laico

 Marcelo de Azevedo Granato

Doutor em Direito pela USP e pela Università degli Studi di Torino, integrante do Instituto Norberto Bobbio. É professor da FACAMP (Faculdades de Campinas – SP) 

A sociedade não pode ter por voz os preceitos de uma religião, qualquer que seja ela, esta é a base do Estado laico


Estado laico é o que não adota ou apoia uma confissão religiosa, qualquer que seja. Um Estado laico, portanto, não emprega sua força, seu poder de polícia, para fazer cumprir as regras de uma religião; ele cultiva a diversidade de opiniões, crenças e opções provenientes do laikós, ou seja, dos indivíduos em geral, que, na tradição cristã, são os que não pertencem ao clero.

No Estado laico, os indivíduos não estão sujeitos à direção espiritual do clero.

Isso não significa, absolutamente, que as religiões não tenham lugar num Estado laico. O Estado laico não é ateu, é simplesmente neutro em matéria religiosa. Por isso mesmo, um Estado laico considera “inviolável a liberdade de consciência e de crença”, assegura “o livre exercício dos cultos religiosos” e garante, “na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” (artigo 5.º, inciso VI, da Constituição Federal). 

A discussão sobre a laicidade do Estado brasileiro foi retomada com o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n.º 701, relativa à proibição de celebrações religiosas presenciais por motivos ligados à prevenção da covid-19. Na véspera da Páscoa, o ministro Kassio Nunes Marques concedeu medida cautelar autorizando a realização dessas celebrações sob as condições fixadas em sua decisão (presença limitada a 25% da capacidade do local, “janelas e portas abertas, sempre que possível”, etc.). 

Diante da repercussão dessa decisão – duramente criticada no meio jurídico –, agravada por decisão em sentido oposto do ministro Gilmar Mendes, o caso foi rapidamente levado ao plenário do Supremo. Antes do seu julgamento pelos ministros, o advogado-geral da União, André Mendonça, fez sua sustentação oral. Centrado em aspectos religiosos, Mendonça afirmou que “os verdadeiros cristãos” estariam “sempre dispostos a morrer para garantir a liberdade de religião e de culto”. Na fala do advogado-geral da União, a religião emerge como valor supremo dos cristãos, pelo qual estariam dispostos a dar a própria vida (e, deduz-se, a eventualmente contaminar terceiros). 

De início, chama atenção o fato de que o advogado-geral não tem por função falar em nome dos cristãos. Ainda mais porque a decisão de Kassio Nunes Marques se voltou para “cultos, missas e reuniões de quaisquer credos e religiões”. 

ANDRÉ MENDONÇA - atual Advogado-Geral da União é pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB), atende por reverendo André na igreja da asa sul, em Brasília (DF)

A par disso, a fala de Mendonça sobre o valor da religião e sua prática impõe ressaltar que num Estado laico e democrático, como o Brasil, nenhum valor é absoluto; a cada um de nós é conferida a liberdade de adotar os próprios valores (e opiniões, crenças, etc.), respeitada a mesma liberdade dos demais. 

Laicidade e democracia são verdadeiros métodos de convivência; métodos que não têm um conteúdo predeterminado, não se orientam por “verdades”, justamente porque se pautam pela persuasão, pelo diálogo de indivíduos que “são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” (artigo 5.º da Constituição Federal). Essa igualdade independe do fato de termos características, opiniões, opções ou crenças que nos diferenciam uns dos outros.

A todas as nossas diferenças, que tornam cada um de nós pessoas únicas, a Constituição atribui o mesmo valor jurídico.

Assim, não importa que, como constou da decisão de Kassio Nunes na ADPF 701, “mais de 80% dos brasileiros” se tenham declarado cristãos no Censo de 2010. Num Estado laico, os direitos não são funções da vontade da maioria. Da mesma forma, nas democracias não é a aplicação da regra da maioria que torna democrática uma decisão. A regra da maioria é um expediente pelo qual pessoas com opiniões diferentes chegam a uma decisão coletiva.

O que torna democrática uma decisão é a participação direta ou indireta de todos os membros da comunidade no processo de decisão.

Sendo assim, os grupos religiosos devem ter voz na sociedade, MAS a sociedade não pode ter por voz os preceitos de uma religião, qualquer que seja.

É o que resulta do artigo 19, inciso I, da Constituição Federal, que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios não só “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento”, mas também “manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança”, ressalvada a colaboração de interesse público “na forma da lei”. 

É o que também resulta do Direito Internacional. Tanto o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966) quanto a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969) atribuem status elevado à liberdade religiosa, mas autorizam limitações legais...

... “que se façam necessárias para proteger a segurança (...) a saúde (...) ou os direitos e as liberdades das demais pessoas” (artigos 18 do pacto e 12 da convenção).

Em suma, ao Estado laico cumpre a defesa da ordem social – em sua pluralidade –, e não a de uma específica visão global de mundo, religiosa ou não. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – Espaço Aberto – Sábado, 1 de maio de 2021 – Pág. A2 – Internet: clique aqui (acesso em: 03/05/2021).

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