«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

O QUE ESTÁ EM JOGO NA UCRÂNIA

Timothy Garton Ash*

A crise ucraniana mostra que protestos em massa ainda são capazes de resultar em uma transição negociada
Manifestações em Kiev - capital da Ucrânia

Além das barricadas em chamas e dos corpos nas ruas, aqui estão cinco elementos importantes em jogo na atual insurreição na Ucrânia.
1. O futuro da Ucrânia como Estado-nação independente
A violência intensa dentro de um país, mesmo não se tratando de uma guerra civil, pode levar a dois caminhos totalmente diferentes. Pode dilacerar o Estado, como na Síria e na ex-Iugoslávia ou, se as pessoas cooperarem, isso poderá consolidar o Estado-nação, como na África do Sul. Um Estado-nação é aquele em que uma identidade nacional civil compartilhada é criada pelo Estado em vez de uma única identidade nacional étnica consolidada por ele.
Uma razão pela qual os últimos tempos na Ucrânia têm sido caóticos é que o país, embora independente há mais de duas décadas, não é um Estado em pleno funcionamento nem uma nação completamente formada. Usar a frase "as forças da lei e da ordem", sobre o que ocorreu na Ucrânia na semana passada, é como dizer "chá e sanduíches" para descrever uma aguardente feita de vodca, cartilagem e sangue.
O presidente Viktor Yanukovich é um bandido, mas um bandido ineficaz. Forças de segurança eficientes e disciplinadas não atiram contra manifestantes, matando-os aleatoriamente, abandonando as ruas para eles em seguida.
Similarmente, o governo, o Parlamento e a economia não são como aquelas de um Estado europeu normal. Eles estão infiltrados e são manipulados por um número extraordinário de oligarcas e pela família do presidente. Para dar um exemplo, de acordo com a edição ucraniana da revista Forbes, o filho de Yanukovich, um dentista, venceu 50% de todas as licitações feitas pelo Estado em janeiro de 2014 - possivelmente a maior extração de dentes da história.
Isso, como também a brutalidade das milícias, é o que mais enfurece os ucranianos e o que alguns deram suas vidas para mudar. No entanto, se o acordo proposto na quinta-feira - no sentido de um governo de coalizão, uma reforma constitucional que dá mais poderes ao Parlamento e uma eleição presidencial antes do fim do ano - se mantiver, então, esses dias sangrentos podem ser tratados nos livros de história da Ucrânia como um capítulo decisivo no caminho de uma nação independente. Caso contrário, persiste a ameaça de desintegração.
2. O futuro da Rússia como Estado-nação ou um império
Com a Ucrânia, a Rússia ainda é um império - sem a Ucrânia, a Rússia tem a chance de se tornar um Estado-nação. O futuro da Ucrânia é mais crucial para a identidade nacional da Rússia do que o da Escócia é para a Grã-Bretanha. Há séculos, as pessoas que viveram onde hoje está a Ucrânia eram russos nativos. Neste século, as pessoas que se identificam como ucranianos moldarão o futuro do que hoje é a Rússia.
3. O futuro de Vladimir Putin
Konstantin von Eggert, jornalista independente russo, observou certa vez que o fato mais importante da política russa na última década não ocorreu na Rússia. Foi a Revolução Laranja, de 2004, na Ucrânia. Para o governo de Vladimir Putin, foi a mais e recente e mais ameaçadora de uma série de revoluções em 15 anos. Assim, com uma habilidade considerável e sucesso, os "tecnólogos políticos" de Putin desenvolveram técnicas para conter a onda - que envolveram brutalidade, naturalmente, mas também muito dinheiro, as Gongo's (ONGs organizadas pelo governo, na sigla em inglês) e a manipulação da mídia.
Quando Putin superou a oferta de associação feita pela UE [União Europeia] à Ucrânia, repleta de regras, mas com pouco dinheiro, propondo uma ajuda de US$ 15 bilhões ao país, um político russo conhecido, Marat Gelman, tuitou que "a instalação de Maidan foi vendida por US$ 15 bilhões, o mais caro objeto de arte visto até hoje" - Maidan é a Praça da Independência de Kiev, epicentro dos protestos.
Entretanto, as coisas não ocorreram como planejado. Assim que Putin e Yanukovich se reuniram em Sochi, na segunda-feira, a Rússia liberou mais uma parcela dos US$ 15 bilhões. No dia seguinte, as milícias de Yanukovich começaram a usar munição real contra os manifestantes, cada vez mais desesperados e, às vezes, violentos. O fato de Putin estar disposto a pôr em risco o sucesso internacional das Olimpíadas de Sochi mostra o quão vital é a Ucrânia para ele. Agora, Putin se retirou taticamente, diante do que ocorreu, mas não tenhamos ilusões de que ele deixará de intervir.
4. O futuro da Europa como poder estratégico
Assim como a Ucrânia não está simplesmente dividida entre leste e oeste, também a questão geopolítica aqui não é se a Ucrânia se une à Europa ou à Rússia, mas se a Ucrânia se integrará cada vez mais na comunidade política e econômica da Europa, mantendo uma relação estreita com a Rússia. E também se a União Europeia defenderá seus valores fundamentais à sua porta, como deixou de fazer na Bósnia há 20 anos.
Está claro agora que a UE agiu mal ao dar um ultimato tipo "nós ou eles", no ano passado, sem oferecer à Ucrânia os recursos que o país necessitava desesperadamente e sem dar uma perspectiva clara de uma adesão ao bloco. Como disse o especialista em Ucrânia Andrew Wilson, a UE trouxe a baguete numa luta de facas. Nas últimas semanas, seu desempenho foi melhor. O compromisso proposto sexta-feira foi um sucesso verdadeiro dos chanceleres de França, Polônia e Alemanha. No entanto, uma Europa debilitada pela crise da zona do euro terá a imaginação estratégica e determinação no longo prazo?
5. O futuro da revolução
Já defendi que, na nossa época, 1989 suplantou 1789 enquanto modelo padrão de revolução: em vez de radicalização progressiva, violência e guilhotina, buscamos protestos pacíficos em massa seguidos por uma transição negociada. Esse modelo sofreu golpes recentemente, não apenas na Ucrânia, mas no outono violento que se seguiu à Primavera Árabe.
Mas, se esse frágil acordo for mantido e se for possível conter a fúria das ruas, a Europa pode mostrar mais uma vez que, ocasionalmente, aprendemos as lições da história.
* Timothy Garton Ash é jornalista norte-americano.
Tradução de Terezinha Martino.
Fonte: O Estado de S. Paulo - Internacional/Visão Global - Domingo, 23 de fevereiro de 2014 - Pg. A16 - Internet: clique aqui.

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