«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

S.O.S. HOMENS! - O QUE ESTÁ ACONTECENDO?

ELES SE MATAM MAIS

Jairo Bouer*
Jairo Bouer - psicanalista

Novos dados divulgados pelo Escritório de Estatísticas Nacionais do Reino Unido mostram que os homens têm três vezes mais chance de se matar do que as mulheres. A diferença na taxa de suicídio entre os dois sexos nunca foi tão alta no país. O aumento foi ainda mais evidente na faixa entre 40 e 44 anos de idade.
As informações foram reveladas pelos jornais The Telegraph e Mail Online na última semana. Em 1981, quando os dados começaram a ser computados, a proporção de homens para mulheres que cometiam suicídio era de 1,9. Em 2012, esse número saltou para 3,2. Entre os homens, as taxas mais elevadas migraram dos adolescentes e jovens para os de meia-idade.
Os dados britânicos mostram também que o suicídio foi a principal causa de morte entre os homens na faixa dos 20 aos 34 anos e dos 35 aos 49 anos. O número de suicídios na faixa dos 45 aos 59 anos aumentou 40% em relação à década anterior.
Para os especialistas, a crise e a recessão no país nos últimos anos explicariam, em parte, a elevação. Outros acreditam também em um "efeito de geração". Esse grupo de homens de meia-idade faria parte da mesma geração em que os mais jovens teriam as maiores taxas de suicídio há 20 anos.
Homens mais pobres vivendo em áreas mais carentes têm uma chance dez vezes maior de cometer suicídio do que homens mais ricos, que vivem em áreas mais nobres do Reino Unido. A diminuição de postos nas indústrias, as mudanças sociais das últimas décadas, com novas formas de organização familiar, questões de gênero, aumento das taxas de divórcio e maior autonomia das mulheres podem ter deixado esse homem de meia-idade em crise.
No Brasil, na segunda-feira passada, assistimos ao trágico desfecho de uma situação em que um pai de 52 anos se jogou da varanda do seu apartamento no 13.º andar de um edifício em Osasco, na Grande São Paulo, e levou no colo seu filho de 6 anos após um suposto acesso de raiva, em que teria agredido a mulher. O professor, casado havia sete anos, tinha um casamento anterior desfeito, em que estava impedido de se aproximar da outra filha.
Em São Paulo, um levantamento realizado pelo geógrafo Daniel Hideki Bando, em tese de doutorado defendida na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em 2013, notou um aumento da taxa de suicídio entre os homens na faixa dos 25 aos 44 anos da ordem de 8,6% ao ano, a partir de 2004. Foram dez mortes a cada 100 mil habitantes. Entre as mulheres, a taxa permaneceu estável nos últimos anos, com duas mortes a cada 100 mil habitantes.
Entre os maiores fatores de risco para o suicídio estão: ser solteiro (isolamento), ter sintomas depressivos, ser portador de outros transtornos mentais, estar enfrentando uma fase de readaptação após uma mudança na vida (final de relacionamento, perda de emprego, mudança de cidade, afastamento de familiares) e ter doenças graves ou degenerativas, entre outros.
Mas por que os homens reagem de forma mais grave às adversidades da vida? Mulheres dividiriam mais os problemas com amigos e parentes (têm uma rede social mais articulada) e estariam mais preparadas para lidar com situações como perdas, abandonos e solidão. Os homens teriam menos flexibilidade para lidar com mudanças e enfrentariam maior pressão social para ter de resolver as dificuldades por conta própria, sem conseguir dividir o peso das decisões com outras pessoas.
Com a velocidade com que ocorreram as transformações sociais e o novo papel da mulher aqui no Brasil, e no mundo ocidental como um todo, o homem de meia-idade, identificado com uma cultura mais machista e, paradoxalmente, mais dependente da mulher, teria perdido o rumo. Sempre bom lembrar que a identificação dos fatores de risco e a interferência precoce nesse processo, com o apoio de uma rede de suporte, podem fazer toda a diferença nessa hora.
* Jairo Bouer é psiquiatra.
Fonte: O Estado de S. Paulo - Metrópole - Domingo, 23 de fevereiro de 2014 - Pg. A26 - Internet: clique aqui.
ANÁLISE
PERIGOSO VAZIO
José de Souza Martins*
Drama do professor que se suicidou com o filho mostra um vácuo social
que novas normas não preenchem
A tragédia de Osasco, do pai que, com o filho de 6 anos de idade no colo, atirou-se do 13º andar de um prédio não constitui, infelizmente, caso isolado. Uma semana antes, em Jarinu, na vizinhança da mesma região metropolitana de São Paulo, um pai matou a tiro o filho de 7 anos de idade e se matou. Ainda na mesma região, em Alphaville, Santana de Parnaíba, em 2013, um pai matou a tiros três filhos, de 5 a 16 anos, e se matou em seguida. Outros casos ocorridos nos últimos anos indicam uma recorrência que ultrapassa o limite do caso eventual.
Mesmo em face de reduzido número de casos, é inevitável tentar compreendê-los a partir daquilo que neles se repete. No caso de Osasco, o pai decide morrer abraçado ao filho, levando-o junto. No caso de Jarinu, o pai matou o filho, que dormia, deitou ao seu lado e se matou. No caso de Alphaville, o pai deu aos filhos brigadeiro por ele preparado, provavelmente, com sonífero para poupar-lhes o sofrimento. Os três casos envolvem pessoas da classe média. No de Osasco, o suicida era professor de inglês, casado com professora de química na USP, com doutorado, dona de um respeitável currículo acadêmico. No de Jarinu, o suicida era empresário. No de Alphaville, era corretor de imóveis. Em dois dos três casos, os suicidas estavam em segundo casamento, tendo filhos do primeiro e do segundo. No caso de Osasco, o suicida sofria com a impossibilidade de encontrar e ver uma filha do primeiro leito. No caso de Alphaville, o suicida incluiu os filhos do primeiro casamento no homicídio.
Nos três casos, o modo como se deu a morte dos filhos não nega o afeto dos pais por eles. De certo modo, foram homicídios abraâmicos. Deus pede a Abraão que lhe ofereça o filho em sacrifício, o cordeiro do holocausto. Abraão amava Isaque, mas o pedido de Deus colocou-o entre a fé em Jeová e o amor por Isaque. A fé era maior que o amor, e entregar a Deus o próprio filho era o supremo ato de amor. Tratava-se de uma prova de fé e o sacrifício não foi consumado. A disposição de Abraão fora suficiente demonstração de fé. É claro que estou falando de uma referência mítica e arquetípica consubstanciada no dilema da relação entre Abraão e seu filho Isaque.
Um caso ocorrido em Piracicaba, em 2013, embora não envolva crianças, parece confirmar esse conteúdo sacrificial de homicídio e suicídio em família. Um pequeno comerciante, que com a esposa mantinha ao lado da casa um salão de cabeleireiro, tinha um único filho, de 21 anos, vendedor de automóveis. O rapaz, muito ativo, teve um problema na coluna, foi operado e ficou paralítico. A família, muito recatada e doméstica, entrou num processo depressivo. Não conseguiu aguentar a aparente falta de perspectivas para o filho. Num domingo, o pai matou a tiros a mulher e o filho, quando dormiam, foi para sua chácara, ali perto, e se matou.
Todos esses casos sugerem uma certa unidade orgânica da família, uma negação da individualização tão própria da sociedade moderna e urbana. Eram pessoas de vida regulada por valores da sociedade tradicional. Mesmo nos casos de Osasco e de Alphaville, de dois casamentos, em que significativamente as segundas esposas foram poupadas, esse valor referencial está presente. No caso de Osasco, o marido, lutador de judô, surrou a esposa violentamente pouco antes do suicídio e era contumaz na violência, tendo lhe quebrado um braço anteriormente. O que só reforça a concepção matrimonial arcaica, o segundo casamento secundário em relação ao primeiro, não obstante este já estivesse desfeito.
O caso de Osasco, de certo modo, repete outro, ocorrido há alguns anos em Santo André, quando um desempregado de classe média matou-se e ao filho, deprimido pela relação desigual com a esposa, uma profissional bem-sucedida. Não tem sido incomuns as referências, em relações matrimoniais desiguais, à impotência sexual do marido, com danos de identidade que acabam em tensão, doença e conflito. É claro que essas ocorrências não são a regra. São excepcionalíssimas, mas compreensíveis numa sociedade de fortes raízes patriarcais, como a nossa, expressões limites de uma possibilidade que está na própria estrutura histórica da família.
Esses casos não devem ser remetidos ao elenco de outros de violência doméstica. Há neles um altruísmo patológico, um medo à solidão compensado com o apego ao filho até na morte. O mesmo temor apareceu em caso oposto, recentemente, aqui em São Paulo, o do menino, filho único, doente, que matou os pais, da Polícia Militar, e também a avó e a tia, as pessoas que lhe eram mais próximas no cotidiano e seu grupo afetivo de referência. São variantes mais significativas da ocorrência frequente de infanticídios no Brasil. Trata-se um cenário muito diversificado de crise da família, mas também de crise social. A sociedade brasileira está mergulhada num cenário de crescente anomia, de corrosão das normas tradicionais de comportamento sem que novas e eficazes normas surjam para preencher o perigoso vazio.
* José de Souza Martins é sociólogo, professor emérito da Faculdade de Filosofia da USP. Entre outros livros, autor de A Sociologia Como Aventura (Contexto, 2013).
Fonte: O Estado de S. Paulo - Suplemento ALIÁS - Domingo, 23 de fevereiro de 2014 - Pg. E9 - Internet: clique aqui.

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