«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quarta-feira, 19 de março de 2014

“Estes são aqueles que resistem a Francisco”

Entrevista com Andrea Riccardi

Andrea Tornielli
Vatican Insider
18-05-2014
 
Andrea Riccardi
“Durante o século XX nenhum Papa teve tantas resistências como Francisco”, e todas elas “são sinal de que o Papa está mudando a Igreja”. São palavras fortes e em certo sentido surpreendentes. Elas foram escritas pelo professor Andrea Riccardi, historiador da Igreja, em um comentário publicado na revista Famiglia Cristiana [leia este artigo logo após esta entrevista]. O Vatican Insider o entrevistou para indagar a respeito.

Eis a entrevista.

Você escreveu que durante o último século nenhum Papa teve “tantas resistências como Francisco”. Não lhe parece exagerado?

Riccardi: Fiz essas afirmações como historiador. Francisco encontra-se diante de resistências internas nas estruturas eclesiásticas, nos episcopados e no clero. Enquanto é evidente a aliança que se instaurou com o povo.

E as oposições que Paulo VI enfrentou, ou as mais recentes que Bento XVI teve que enfrentar?

Riccardi: O único Papa que teve uma forte oposição foi, certamente, Paulo VI. Mas naquela época estava se vivendo um momento de protestos generalizados que afetaram tanto a Igreja como a sociedade. Enquanto as oposições contra Bento XVI, que você justamente recorda, eram mais da opinião pública externa e internacional. Repito, as que Francisco enfrenta são, na minha opinião, mais fortes e provêm do interior.

Poderia indicar alguns exemplos?

Riccardi: Há algumas que se manifestaram publicamente, outras foram sussurradas e outras não foram expressas e se caracterizam pelo silêncio e a distância. Há alguns que não suportam a menor insistência na pregação papal sobre temas éticos. Mas também o enfoque pastoral de Francisco, que coloca em discussão a forma de governar dos bispos, aos quais as pessoas dizem: “Por que não fazem como o Papa?” Não quero generalizar indevidamente, mas estou convencido de que estas resistências existem. Além disso, Francisco, nos primeiros meses do Pontificado, disse tudo o que pensa e indicou quais são os pontos sobre os quais se deve trabalhar e mudar. Não fez como Paulo VI, que se expressava a “conta-gotas”, tratando de ser equilibrado. As resistências provêm daqueles que não querem ser questionados e não querem mudar.

Por que o silêncio, na sua opinião, equivale a uma “resistência”?

Riccardi: É uma atitude, como se não tivesse acontecido nada, como se o Papa não fosse o testemunho de um modelo que é preciso seguir. Há alguns que destacam que Francisco é pouco “teólogo”. Dá-me vontade de rir quando penso naqueles que diziam que Bento XVI era muito “teólogo” (isto demonstra que o “Papa bom” sempre é o de antes). Claro, não é preciso dizer que estas resistências chegam daqueles que durante anos destacavam a importância da autoridade do Papa e da obediência ao Papa. É curioso que para alguns seja válido este raciocínio: se o Papa não é como eu digo e não faz o que eu digo, é um Papa pela metade. Mas o catolicismo não é uma ideologia, é uma força dinâmica que cresce na história. Quero repetir: não se deve generalizar, porque há muitos bispos muito entusiasmados, e nos lugares em que a mensagem de Francisco chegou (nem sempre chega a todos os lados) há uma reação muito grande e positiva na vida da Igreja em nível popular.

Algumas das críticas mais duras chegam da galáxia de sítios e blogs do chamado mundo tradicionalista, mas também (pelo menos no caso italiano) dos círculos midiáticos-intelectuais, como no caso dos artigos publicados pelo jornal Il Foglio...

Riccardi: Sim, mas os conteúdos que você indica são, de qualquer maneira, expressão compartilhada por setores do mundo eclesial. É uma reação de uma certa visão da sociedade secularizada na qual um cristianismo minoritário combate por certos valores éticos. Francisco, ao contrário, fala de um cristianismo do povo, mais missionário.

E como vê a reação dos movimentos diante do novo Pontificado?

Riccardi: O cristianismo não é uma ideologia, a Igreja não muda de “linha”, como os partidos políticos, mas, como disse, cresce na história. Os católicos são fiéis ao Papa desde Pio XII até Francisco. Isto significa ser católico. Do contrário, tudo se torna ideologia. E hoje há reduções e visões ideológicas que estão pulando. Também os movimentos devem se sintonizar com a Evangelii Gaudium [exortação apostólica do Papa Francisco] e não autorreproduzir-se a si mesmos.

Durante os primeiros meses de Pontificado houve alguns que prognosticavam (e em alguns casos pareciam esperá-lo) o final da chamada “lua de mel” entre o Papa, a imprensa e as pessoas. Ao contrário, parece continuar...

Riccardi: A lua de mel não acabou porque não é um fenômeno midiático, mas algo que vai muito além, pois tem muita substância. Claro, o passo necessário na Igreja é acolher o que Francisco oferece como testemunho e um modelo de evangelização e de pastoral que propõe. O modelo que um Papa que nasceu, viveu e foi bispo de uma megalópole como Buenos Aires propõe está verdadeiramente à altura dos desafios da nossa época.

A tradução é de André Langer.


Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – quarta-feira, 19 de março de 2014 – Internet: clique aqui. A entrevista em seu original, em língua italiana, pode ser acessada aqui. 
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QUEM RESISTE AO PAPA FRANCISCO

Andrea Riccardi*
A simpatia das pessoas para com o Papa não se atenua após um ano. Francisco guia os cristãos à redescoberta do Evangelho (domingo passado pediu a todos para lê-lo). Deseja que se saia dos espaços habituais, das igrejas, dos lugares comuns, para comunicar a fé, encontrar as pessoas, sobretudo, os pobres. Fala a todos: bispos, padres, comunidades cristãs, leigos, fiéis em dificuldade, religiosos, irmãs... Ninguém é excluído, mesmo se as histórias e responsabilidades sejam diversas.

A proposta é “sair” com fé, como disse na Evangelii gaudium, seu verdadeiro programa. Acho entusiasmante participar desta “primavera”. No entanto, existem resistências dentro da Igreja. Por quê? É contraditório que cristãos não se alegrem com esta estação feliz. Sobretudo, é estranho que alguns, depois de haver tanto falado da autoridade do Papa, não prestem atenção a Francisco.

Alguns ignoram o Papa. Há resistências de quem não deseja mudar, não quer viver de modo comprometido ou, simplesmente, trabalhar mais. Parecem aqueles do filho mais velho da parábola do pai misericordioso [cf. Lc 15,11-32]: por que tanta atenção ao filho pródigo? Por que abrir tanto às pessoas?

Mas há resistências mais estruturadas. Desvaloriza-se o discurso do Papa, demasiado simples, ele é contraposto àquele de Bento XVI, mais elevado e douto (desse modo, se vai contra o profundo sentimento do Papa emérito). Para uma visão ideológica do cristianismo, a Igreja não deve crescer, mas se bloquear em um modelo ou numa fórmula. Talvez, não se dá conta dos graves desafios, em várias partes do mundo, direcionados ao cristianismo.

As muitas resistências são um sinal de que o Papa está mudando a Igreja. O historiador sabe, porém, que nos anos 1900 um Papa jamais teve tantas resistências como Francisco. Houve a forte crítica pós-conciliar a Paulo VI. Mas, então, havia uma contestação geral em relação a todos. Critica-se Bergoglio porque descuidaria dos valores éticos. Ele insiste que sua preocupação é comunicar, sobretudo, o coração do Evangelho. A atitude do Papa, não propensa ao clericalismo, abriria caminho à crítica (indisciplinada) dos fiéis em relação aos bispos e aos padres.

Na realidade, as pessoas acolhem o exemplo do Papa como estímulo para todos. Não é positivo criar um movimento de interesse pela Igreja e pela fé? A verdade é que o Papa, com suas intervenções, abriu o coração, revelou pensamentos, preocupações e prioridades. Não se comportou de modo político com a Igreja. A sua sensibilidade é pastoral. Pede para compartilhá-la numa renovada missão. Uma proposta franca e evangélica coloca todos diante de suas próprias responsabilidades. Desse modo, nascem as resistências. Mas, acima de tudo, um vasto povo de Deus colocou-se em movimento: em direção a uma nova escuta do Evangelho  e às pessoas. Como não ficar contente com isso?

Tradução do italiano por Telmo José Amaral de Figueiredo.

Andrea Riccardi é um historiador e acadêmico italiano. Graduado em História Contemporânea pela Universidade de Estudos de Roma III, é notável estudioso da Igreja na Idade Moderna e Contemporânea, bem como fundador da Comunidade de Santo Egídio.

Fonte: Famiglia Cristiana – 17/03/2014 – Internet: clique aqui.

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