«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sábado, 7 de setembro de 2019

23º Domingo do Tempo Comum – Ano C – Homilia

Evangelho: Lucas 14,25-33
Ouça a proclamação deste evangelho, clicando aqui.

José María Castillo
Teólogo católico espanhol

O verdadeiro discípulo(a) de Jesus

O texto que utiliza, aqui, o evangelho de Lucas é mais forte e duro do que imaginamos. Porque, em sua língua original, os evangelhos [sinóticos – Mateus, Marcos e Lucas] utilizam o verbo grego miseô, que nos requer que «odiemos» até nossa própria família e a nós mesmos por causa de Jesus (Lc 14,26). Isso é possível? É recomendável? Pode-se exigir semelhante conduta de alguém?

Esta dificuldade se agrava se levamos em conta que o Evangelho não fala de «adiar» os parentes, isto é, deixá-los em segundo plano ou para depois, mas de «odiá-los». De fato, em Lucas 14,26 o verbo miseô significa literalmente «odiar» ou «desprezar». É o mesmo verbo que se utiliza quando o Evangelho fala de «ser odioso» por causa de Jesus (Mc 13,13 e paralelos; Mt 24,9-10; 10,22; Lc 21,17; 6,2). Isto posto, insistimos na pergunta: podemos imaginar que Jesus nos coloca no dilema de escolher entre o amor ou o ódio a nossos pais ou aos nossos filhos?

Se o dilema é escolher entre o amor a Deus e o ódio a nossos seres mais queridos e a nós mesmos, não resta mais saída que esta: cremos em um Deus (Jesus) que, para amá-lo não temos outra solução que odiar o mais humano, ou seja, Deus e o humano são incompatíveis. Em qual cabeça cabe semelhante conclusão?

Qual é a interpretação possível e correta?

Não há outra solução senão aceitar essas duas convicções: 1) Deus, em Jesus, encarnou-se no humano, isto é, humanizou-se plenamente. 2) Nós somos humanos. Porém, também levamos inscrita em nossa humanidade a desumanização. Por isso, nossas relações com os demais, incluídas as relações de parentesco, são muitas vezes tão desumanas. Daí, que o dilema, que Jesus coloca, não consiste em escolher entre o amor a Deus e o ódio ao humano, mas em optar entre nossa «humanidade desumanizada» ou a «humanidade plena», que sempre encontramos em Jesus.

Nesse ponto, estamos tocando a própria raiz do seguimento de Jesus:

Somente pode ser seguidor de Jesus
quem é plenamente humano e, por isso,
supera e vence toda possível desumanização.
Imagem relacionada 
Enzo Bianchi
Monge, biblista e escritor
Fundador da Comunidade de Bose – Itália

Exigências para o seguimento de Jesus

[...] Esse regime dos afetos é duro, custa esforço, mas é «carregar a própria cruz», isto é, carregar o instrumento de execução do próprio «eu» philautico, egoísta. Cada um tem uma cruz própria para carregar, ninguém está isento disso, mas não se deve fazer comparações. Jesus, de fato, sabe que aqueles que o seguem fielmente também estarão envolvidos na sua paixão e morte, quando ele carregar a cruz. É uma questão de aprender com Jesus, quando ele fala, age, mas também quando for condenado, torturado e morto na ignomínia da cruz. Ser discípulo de Jesus não é a experiência de um momento (cf. Mc 4,12-13; Mt 13,20-21), não é um provar para verificar, mas é a decisão de responder a um chamado, é um «amém», que deve ser dito com ponderação, com discernimento, sem obedecer às emoções do momento.

Por isso, Jesus anuncia duas parábolas que soam como uma advertência, um aviso: ele não faz propaganda para as vocações, mas, ao contrário, dissuade... Teríamos muito a aprender com essa atitude de Jesus, sobretudo quando a escassez de vocações nos angustia e nos dá medo: este último é um mau conselheiro, que nos exorta a acolher a todos com muita superficialidade e a não reconhecer e comunicar as dificuldades objetivas do seguimento de Jesus.

Com a primeira parábola [Lc 14,28-30], Jesus adverte: «Qual de vós, querendo construir uma torre, não se senta primeiro e calcula os gastos, para ver se tem o suficiente para terminar». Seguir Jesus – e preste-se atenção a uma leitura pouco inteligente dos relatos vocacionais do Evangelho! – requer não o fogo de um momento, nem o entusiasmo, nem só o «enamoramento», mas também um tempo de calma, de silêncio, de exame de si mesmo. É a ação do discernimento, difícil, mas absolutamente necessária para perceber a voz do Senhor não fora de nós, não apenas nas eventuais palavras de um outro, mas também no nosso coração mais profundo, lá onde Deus nos fala pessoalmente.

Escutando o profundo, a própria intimidade, discernindo a palavra de Deus das outras palavras que nos habitam, olhando com realismo para aquilo que somos e para as nossas possibilidades, nós podemos chegar a uma escolha; talvez nos deixando ajudar por aqueles que estão na nossa frente na vida segundo o Espírito, mas sempre conscientes de que o amém só pode ser nosso, muito pessoal, e um amém para sempre, não temporário ou com prazo de validade!

Da mesma forma, a segunda parábola [Lc 14,31-32] adverte que é preciso medir bem as próprias forças, para vencer aquele que é um combate espiritual sem trégua, até o final. Porque o seguimento de Jesus exige a capacidade de fazer guerra contra o inimigo, o diabo que nos tenta e gostaria de nos fazer cair, levando-nos a abandonar o próprio seguimento.

Portanto, a pessoa chamada sabe: tendo escutado a palavra de convite, deve, acima de tudo, «ficar firme», permanecer em solidão e em silêncio (cf. Lamentações 3,28) para discernir bem aquilo que escutou e o que o coração lhe diz; depois, deve se aconselhar (como diz literalmente o verbo bouleúomai); por fim, deve chegar à decisão muito pessoal, confiando apenas na graça do Senhor. Em suma, deve saber que a vida cristã é uma luta, uma batalha dura e cansativa contra as tentações do demônio: uma luta que deverá ser perseverança, coragem e invocação da fortaleza, essa virtude que é dom do Espírito Santo. À pessoa chamada, não cabe apenas iniciar, mas também levar a termo, com a ajuda da graça, que nunca é negada àqueles que a invocam e a buscam com coração sincero.

Jesus, depois, acrescenta uma palavra não presente no trecho litúrgico, mas conectada com o que o precede. Ele diz que, para uma história de vocação, ocorre aquilo que acontece com o sal: «O sal é bom, mas se perde a capacidade de salgar, de que serve? É jogado fora!» (cf. Lc 14,34-35). Do mesmo modo, uma vocação pode ser boa, mas na vida pode ser contradita, abandonada, e, então, aquela vida permanece como uma vida desperdiçada.

Dizia o meu pai espiritual: «Quando alguém pensa em aumentar o número de vocações na Igreja e impõe a vocação aos outros, não cria santos, mas apenas pessoas miseráveis!».

Tradutores: o texto de CASTILLO foi traduzido por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo; o texto de BIANCHI por Moisés Sbardelotto.

Fontes: CASTILLO, José María. La religión de Jesús: comentario al Evangelio diario – Ciclo C (2018-2019). Bilbao: Desclée De Brouwer, 2018, páginas 339-340; Instituto Humanitas Unisinos – Comentário do Evangelho – Sexta-feira, 6 de setembro de 2019 – Internet: clique aqui.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.