«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Matrimônio - Expectativas extravagantes

JOÃO PEREIRA COUTINHO *

O casal não conhece limites em seus desejos contraditórios. 
Reclama de paixão e de razão

Casamentos combinados? Nada contra. Mas existem combinações e combinações. Conhecer a noiva ainda no berço não é a ideia perfeita de romantismo. Casar com ela durante a infância também não.


Mas confesso inveja pelos indígenas de Tikopia, uma pequena ilha do Pacífico, onde as combinações matrimoniais impostas pela tribo admitem um período de conhecimento e, digamos, "experimentação". Se as coisas não resultarem, nenhum drama: é hora de tentar uma nova combinação.


É nessas alturas que uma pessoa pensa nas desvantagens de viver no Ocidente pós-moderno, onde estamos por nossa conta e risco na busca da princesa encantada. E tanto esforço, e tanta despesa, e tanta angústia para quê?


Vivesse eu em Tikopia e poderia estar tranquilamente em casa, lendo e escrevendo, enquanto a tribo procurava fêmea compatível para mim. Quando a encontrasse, era só bater na minha porta e eu receberia a noiva do mês para o respectivo período de conhecimento e "experimentação". Haverá coisa mais civilizada?


Paul Hollander não se pronuncia. Mas o seu "Extravagant Expectations" [foto da capa - ao lado], onde conheci os tikopianos, é um dos meus livros de 2011. Hollander, como estudioso dos regimes totalitários do século 20, dispensa apresentações.


Só que, dessa vez, o sociólogo americano resolveu fazer uma pausa nas suas trincheiras para investigar como amam os americanos. O que procuram eles na cara metade. E por qual motivo se desiludem tão rapidamente com o parceiro.


Essas perguntas exigiram "trabalho de campo": Hollander mergulhou nos classificados pessoais de relacionamento; consultou sites de encontros na internet; e leu a bibliografia popular e a acadêmica sobre o assunto.

Conclusão: a crise das relações modernas está, como o título indica, nas "expectativas extravagantes" que os americanos - e, desconfio, os ocidentais em geral - transportam para o matrimônio.

Na conjugalidade, o casal não conhece limites em seus desejos contraditórios. Reclama doses homéricas de paixão e de razão; de aventura permanente mas também de segurança permanente; de estabilidade emocional e de excitação emocional; de beleza física e de intelecto apurado.


Haverá relação que aguente o peso dessas expectativas?


Dificilmente. Mas o interesse do livro de Paul Hollander está sobretudo na explicação genética das "expectativas extravagantes". Que, obviamente, seriam incompreensíveis para nossos antepassados.


E seriam incompreensíveis porque a dimensão "romântica" do casamento é recente na história do Ocidente: tradicionalmente, as relações entre homens e mulheres eram tuteladas por "agentes intermediários", a começar pela família, que proviam e promoviam essas relações. Os "sentimentos" das partes envolvidas não eram os argumentos mais preponderantes.


O romantismo próprio da modernidade acabaria por enterrar esse mundo, atribuindo ao indivíduo (e ao "sentimento") a construção do seu destino "autêntico".


E, claro, acabou também por determinar o recuo da família, da tradição e mesmo da religião. Não apenas como "agentes intermediários"; mas também como fontes válidas de conhecimento ou consolação.


O problema, escreve Hollander, é que esse recuo não significou o fim das carências -espirituais, éticas, intelectuais- que continuam a pulsar na natureza humana. E que são agora transplantadas pelo indivíduo socialmente isolado para dentro da sua privacidade.


Hoje, os ocidentais desejam que as relações íntimas possam suprir todas as exigências que anteriormente estavam repartidas por várias esferas da sociedade.


Azar: o casamento não comporta essas exigências múltiplas e contraditórias. 


A pessoa com quem casamos não consegue reunir as qualidades perfeitas de amante, amigo, confessor, professor, guia turístico, estátua grega e terapeuta. No Ocidente pós-moderno, a taxa de divórcio não para de subir. Brasil incluso. 


Um cínico diria que o fenômeno tem explicação simples: as pessoas divorciam-se porque podem.


Mas é possível oferecer uma explicação alternativa: as pessoas divorciam-se porque casam. E não há casamento que resista quando se exige dele tudo e o seu contrário.


* João Pereira Coutinho [foto no alto] nasceu em Portugal, na cidade do Porto, em 1976. Formado em História, na variante de História da Arte, é também doutorado em Ciência Política pela Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa, onde ensina como professor convidado. Foi colunista dos semanários portugueses “O Independente” (1998-2003) e "Expresso" (2004-2009). Atualmente, é colunista do "Correio da Manhã", o maior diário português, e comentador do programa televisivo "A Torto e a Direito", no canal TVI-24. É ainda entrevistador da revista "GQ". Publicou, em Portugal, a novela "Jaime e Outros Bichos" (1997) e o volume de crônicas "Vida Independente" (2003). O seu último livro de crônicas, "Avenida Paulista", onde reuniu seus artigos para a Folha de S. Paulo, foi publicado no Brasil pela Record. Na Folha, assina coluna na Ilustrada às terças-feiras e, quinzenalmente, às segundas-feiras, na Folha On Line.


Fonte: Folha de S. Paulo - Ilustrada - Terça-feira, 27 de dezembro de 2011 - Pg. E10 - Internet: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrada/17014-expectativas-extravagantes.shtml

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.