«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 14 de novembro de 2017

A democracia num beco sem saída?

Pe. Alfredo José Gonçalves
Congregação dos Missionários de São Carlos – Scalabrinianos
Vigário Geral
Roma – Itália

Reciprocamente, dinheiro compra poder e o poder faz acumular
mais dinheiro. Uma dinastia, a econômica, ressuscita
“milagrosamente” a outra, a política.
PE. ALFREDO JOSÉ GONÇALVES

A virada à direita em alguns países de relativa importância no universo ocidental, incluindo os Estados Unidos, significa que a democracia entrou num beco sem saída? Talvez convenha retomar a famosa frase de Bertrand Russell, o qual, comentando a filosofia de Locke, escreve que “as dinastias políticas desapareceram, mas as dinastias econômicas sobrevivem” (Cf. História do pensamento ocidental). Com tal pensamento, e de olho nas eleições de 2018, talvez nãos seja ocioso tecer algumas considerações.

Historicamente, de fato, a partir de um determinado momento a herança do poder, de pai para filho, deste para o neto, e assim sucessivamente, revelou-se um excrescência fóssil, cristalizada. Até então, o exercício do poder era não somente de caráter hereditário, mas em muitos casos de origem divina. Não raro os reis subiam ao trono com a benção da Igreja. O brilho do renascimento, as luzes do iluminismo, a declaração da independência dos Estados Unidos (1776) e a Revolução Francesa (1789), entre outros fatores, contribuíram para combater e banir as dinastias políticas. Nasce e expande-se, segundo Abraham Lincoln, “o governo do povo, pelo povo, para o povo”.

Nada disso, porém, impediu que as grandes heranças de ordem econômica, tais como contas bancárias, títulos e propriedades imobiliárias, permanecessem intocáveis. “Propriedade privada” – advertem as placas! Se, de um lado, é verdade que o processo democrático reduziu a dinastia política a um resquício histórico tolerado apenas em países retrógrados, também é certo que não conseguiu distribuir com maior equidade a riqueza e os bens por todos produzidos. Enquanto a primeira vinha relegada a uma peça de museu, uma relíquia de tempos antiquados, a assimetria econômica, longe de aproximar os extremos, alargava cada vez mais o fosso das desigualdades entre o topo e a base da pirâmide social.

Tanto é verdade que, mesmo hoje em dia, semelhante contradição é vista como normal por grande parte da população. Esta aceita com relativa naturalidade que os filhos e/ou familiares de um milionário ou bilionário falecido, e somente seus filhos e familiares, sejam os herdeiros legítimos de uma riqueza acumulada por vias nem sempre transparentes. Ao mesmo tempo, contudo, em nome da democracia, rejeita qualquer forma de hereditariedade quando está em jogo o exercício do poder. Neste caso, entra em cena a visão consolidada da democracia. Numa palavra, esta última agita as águas e as ondas superficiais da política, mas deixa intactas as correntes subterrâneas de uma economia cada vez mais globalizada e centrada no mercado financeiro.

O problema é que a contradição acima assinalada vai mais a fundo. Deixando o campo livre a essas heranças estratosféricas e incalculáveis, a dinastia econômica, com a força bruta da renda, da riqueza e da própria influência, adquire o poder de resgatar a dinastia política. É sabido e notório que para “fabricar” um candidato e disputar uma campanha eleitoral, é necessária uma soma de dinheiro nada desprezível. Bem poucos são capazes de arcar com tais custos. O resultado torna-se óbvio: somente os ricos podem dar-se ao luxo de antecipar tais despesas, comprando o espaço e o tempo nos meios de comunicação social, e até mesmo comprando diretamente o voto dos eleitores. Essas despesas, por outro lado, caso se confirme a vitória, serão generosamente reembolsadas.

Reinstala-se, assim, o círculo vicioso que une e entrelaça ambas as dinastias. A herança de enormes fortunas abre as portas ao exercício do poder, ao mesmo tempo que este abre canais e mecanismos para novas oportunidades de investimentos, os quais, a seu turno, trazem de volta a dinastia do governo. Daí as históricas oligarquias ao longo da trajetória política brasileira, para não falar do corporativismo partidário ou de classe, nem da corrupção crônica. Reciprocamente, dinheiro compra poder e o poder faz acumular mais dinheiro. Uma dinastia, a econômica, ressuscita “milagrosamente” a outra, a política. Ao fim e ao cabo, magnatas e homens de Estado, ricos e governantes, tornam-se “farinha do mesmo saco”.

Resta o desafio de purificar essa mútua promiscuidade. Depurar o processo democrático da força e da tirania dos gigantescos conglomerados de empresas transnacionais. É certo que o dinheiro tudo compra, e a quem o possui, tudo é passível de venda. Mas, no processo democrático, permanecem de pé determinados princípios éticos e morais que não podem entrar nessa lógica do mercado total. Às vésperas das eleições de 2018, é hora de rever tais princípios, no sentido de submeter a economia à política do bem-estar comum. E esta às necessidades básicas e urgentes da população de baixa renda. Disso resulta a insistência em retomar os critérios de participação nas causas populares, para avaliar cuidadosamente os candidatos. Só assim a democracia poderá ainda apresentar qualquer saída alternativa.

Fonte: Divulgação do próprio autor através de e-mail – Roma, 14 de novembro de 2017.

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