28° Domingo do Tempo Comum – Ano C – Homilia

Evangelho: Lucas 17,11-19

11Aconteceu que, caminhando para Jerusalém, Jesus passava entre a Samaria e a Galileia.
12Quando estava para entrar num povoado, dez leprosos vieram ao seu encontro. Pararam à distância, 13 e gritaram: “Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!”
14 Ao vê-los, Jesus disse: “Ide apresentar-vos aos sacerdotes”. Enquanto caminhavam, aconteceu que ficaram curados.
15 Um deles, ao perceber que estava curado, voltou glorificando a Deus em alta voz;
16 atirou-se aos pés de Jesus, com o rosto por terra, e lhe agradeceu. E este era um samaritano.
17 Então Jesus lhe perguntou: “Não foram dez os curados? E os outros nove, onde estão?
18 Não houve quem voltasse para dar glória a Deus, a não ser este estrangeiro?”
19 E disse-lhe: “Levanta-te e vai! Tua fé te salvou”.

Enzo Bianchi
Monge, teólogo e biblista italiano, fundador da Comunidade de Bose (Itália)
Resultado de imagem para o leproso purificado 
Sabemos dar graças?

Em seu caminho de subida a Jerusalém, Jesus atravessa a Galileia e a Samaria. Ao passar por uma aldeia, saem ao seu encontro dez pessoas afetadas pela lepra. É sabido que, no antigo Israel, o leproso é o marginalizado por excelência, golpeado por uma doença considerada não só repugnante, mas inclusive – assim se pensava infelizmente – estreitamente ligada ao castigo de Deus por seus pecados (cf. Nm 12,14); por isso vivia fora das cidades, em lugares desertos, em uma solidão desesperada (cf. Lv 13,45-46). Devido a isso, esses enfermos não se atreviam nem sequer aproximarem-se de Jesus, mas de longe lhe imploravam: «Jesus, Mestre, tem piedade de nós», confiando em sua compaixão.

Jesus, como já havia feito em um caso similar (cf Lc 5,14), convida os leprosos a apresentarem-se aos sacerdotes, isto é, obedece à lei mosaica remetendo à autoridade religiosa, a qual corresponde certificar a cura obtida pelas pessoas e readmiti-las na convivência social (cf. Lv 13,16-17; 14,1-32). «E, enquanto iam caminhando, ficaram limpos»: os dez são curados, mas somente um reconhece que isso ocorreu graças ao poder de Jesus e, por isso, volta «louvando Deus com voz alta e prostrando-se aos pés de Jesus para dar-lhe graças».

Ao dirigir-se primeiro a Jesus, sem haver ido antes ao Templo mostrar-se aos sacerdotes, está confessando que a presença de Deus ele encontrou na pessoa Jesus, seu templo (cf. Jo 2,21), sua manifestação plena e definitiva.

Quando constata, com certa admiração, que somente um dos dez – e, ainda por cima, samaritano, que para os judeus era o «inimigo» religioso, o crente «cismático e herético» (cf. Lc 9,53) – volta para «dar glória a Deus», Jesus sabe interpretar com profundidade o acontecimento que tem lugar diante de seus olhos e afirma: «Tua fé te salvou». Estabelece uma relação estreita entre a fé deste homem, que sabe reconhecer e acolher a salvação realizada por Deus, e sua capacidade de dar graças.

De fato, se a fé é relação pessoal com Deus, a dimensão da ação de graças não é somente uma resposta pontual em acontecimentos que se descobre a presença e a ação de Deus na própria vida, nem se refere unicamente à forma exterior de algumas orações, mas que deve comprometer toda a pessoa. À gratuidade da ação de Deus em relação ao ser humano, corresponde o reconhecimento do dom e da gratuidade de quem sabe que «tudo é graça», que o amor do Senhor precede, acompanha e segue sua vida.

As palavras de Jesus sobre a fé deste homem significam, além disso, que a salvação é verdadeiramente tal se é celebrada: o dom de Deus é acolhido quando se sabe dar graças por ele, ou melhor, reconhecer e confessar sua origem. Por isso, o coração da fé cristã é a Eucaristia, que – não se esqueça – significa propriamente «ação de graças»: o lugar central da Eucaristia recorda-nos que o culto cristão consiste essencialmente em uma vida capaz de responder com gratidão ao dom inestimável de Deus, o dom do Filho Jesus Cristo, que o Pai, em seu imenso amor, fez à humanidade (cf. Jo 3,16).

E assim, seguindo Jesus Cristo, o ser humano que soube fazer de toda a sua vida uma resposta ao amor procedente do Pai até oferecê-la totalmente nos sinais do pão e do vinho, os cristãos dão graças a Deus fazendo de sua existência uma eucaristia vivente. Ao dom de Deus somente se pode responder procurando converter-se em homens e mulheres eucarísticos (cf. Cl 3,15; 1Ts 5,18), capazes de viver «em ação de graças» (1Tm 4,4); os cristãos deveriam ser aqueles que «dão continuamente graças a Deus Pai por todas as coisas em nome do Senhor Jesus» (cf. Ef 5,20).

A ação de graças é, pois, a atitude radical de quem abre, a cada dia, a trama de sua existência à ação de Deus, até predispor tudo para que Deus mesmo, aquele que deseja para todos os seres humanos a vida plena (cf. Jo 10,10), transfigure a morte em acontecimento de nascimento à vida nova.

Como esquecer que a última palavra de Santa Clara de Assis [companheira de São Francisco] foi: «Dou-te graças, Senhor, por haver-me criado»?
Sim, cada dia é para nós um dom do amor de Deus em Cristo Jesus.

Traduzido do espanhol por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

Fonte: BIANCHI, Enzo. Hoy se cumple para vosotros la Escritura: comentario a los evangelios dominicales del ciclo C. Salamanca: Ediciones Sígueme, 2009, páginas 171-173.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A necessidade de dessacerdotalizar a Igreja Católica

Vocações na Igreja hoje

Eleva-se uma voz profética