«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

domingo, 27 de abril de 2014

À direita dos direitos

ALDO FORNAZIERI*
Aldo Fornazieri - sociólogo

As temáticas conservadoras rondam as eleições presidenciais de 2014. O presidenciável Eduardo Campos saiu na frente nessa perspectiva, afirmando que é contra o aborto. O tema é complexo, pois envolve um posicionamento moral. Qualquer um pode ser contra o aborto, mas é preciso distinguir aqui duas questões: a) o posicionamento moral de cada um sobre o tema; b) a questão de saber se a mulher tem ou não o direito ao aborto a partir de determinadas opções e condicionalidades temporais. Geralmente, as duas coisas se confundem.

Mas o problema é bem mais amplo e não se restringe à discussão sobre o aborto. O fato é que a política mundial sofre hoje uma mudança de perspectivas temáticas. Os temas tradicionais, ligados aos direitos sociais, à luta de classes, à revolução, à reforma e à construção do Estado do bem-estar social vêm perdendo terreno para os temas da chamada política da moralidade e para os temas religiosos. Em parte, esses temas perdem terreno por causa do enfraquecimento das coletividades dos trabalhadores e de suas representações sindicais, fruto das mudanças tecnológicas e do enfraquecimento dos valores da solidariedade, da igualdade e da própria liberdade.
A emergência dos temas da política da moralidade tem duas causas principais. A primeira diz respeito às temáticas sexuais e de gênero. O debate acerca do direito à liberdade de orientação sexual, incluindo o tema do direito à união civil de pessoas do mesmo sexo, ganhou terreno a partir do início do século 21 e ingressou como tema relevante do debate político-eleitoral. Da mesma forma, o debate acerca da igualdade de gênero e dos direitos da mulher vem ganhando força e avança na ocupação de espaços no debate político. Como nenhum dos temas está satisfatoriamente resolvido no campo da garantia dos direitos, essas pautas tendem a perdurar no tempo como temas políticos e eleitorais.
Outro tema que vem deslocando o debate político tradicional para um plano secundário diz respeito à questão ambiental. A questão é real e os governos têm revelado um retumbante fracasso nessa área, quando não uma omissão que chega a beirar o crime. O mundo caminha para uma situação cada vez mais dramática, com o aparecimento dos chamados "eventos extremos" suscitadores de catástrofes ambientais e humanas. Mesmo que a contragosto, os candidatos serão obrigados a abordar esse tema. Os direitos dos animais e os dos consumidores também fazem parte de novas temáticas que ocupam espaços crescentes no debate político.
Existe, porém, outra frente cada vez mais forte da política da moralidade que diz respeito à bioética, ou biopoder. Trata-se das temáticas relacionadas às experimentações com seres humanos e com outras espécies vivas, seja para fins de políticas de saúde pública e de medicina social, seja para fins de melhoramentos ou modificações de ordem genética. Essa temática está relacionada ao poder de controlar o corpo e, ao mesmo tempo que pode proporcionar soluções para vários tipos de doenças, pode também implicar graves consequências de ordem ética e política, relacionadas ao controle político e social. A discussão em torno da legalização da maconha e do uso de drogas entra nesse rol de questões do biopoder.
Outro campo do debate que se conecta com a política da moralidade se refere à temática religiosa. É sabido por todos que hoje o mundo vive uma efervescência religiosa, denominada por alguns de "revanche de Deus", e que ela se liga fortemente às disputas eleitorais e até militares em determinadas regiões do mundo. Nesse terreno, o mundo vive um paradoxo: quanto mais a sociedade e a vida se tornam tecnológicas, cada vez menos são capazes de responder às questões existenciais e de sentido da humanidade. O próprio fracasso das ideologias do século 20 contribui para isso. A religiosidade militante, o radicalismo e as clivagens da política por conflitos religiosos são fenômenos em expansão. No Ocidente, ao mesmo tempo que se observa um avanço do neopentecostalismo e das tentativas do papa Francisco de reativar a militância católica, cresce também a penetração de práticas, ritos e meditações provindas do Oriente. A política brasileira e as campanhas eleitorais estão fortemente contaminadas pelas questões religiosas, e os candidatos fazem concessões de princípios aos diversos grupos religiosos, em detrimento da política laica e republicana.
Por fim, há que se indicar que, desde as manifestações de junho de 2013, a sociedade brasileira procedeu a uma guinada conservadora. Os motivos são vários: temor ao radicalismo, falta de perspectivas quanto ao futuro, incapacidade do governo de gerar otimismo e esperança na sociedade e nos agentes econômicos, baixo crescimento da economia, inflação, crescimento da violência, aumento da percepção de corrupção, sensação da existência de um vale-tudo no País ou de desordem, etc. O resultado de tudo isso se traduz em duas palavras: insegurança e medo.
A regra geral é que, quando um ambiente social e psicológico dessa ordem se instaura numa sociedade, a reação que ele provoca é o conservadorismo. Esse ambiente se infiltra em todos os setores sociais, inclusive na mídia. Os estratos sociais que mais temem perder status passam a exigir soluções radicais e conservadoras, tais como pena de morte, redução da maioridade penal, moralização da sociedade e da política. As eleições de 2014 tendem a ser fortemente marcadas por esse ambiente de moralização conservadora.
* ALDO FORNAZIERI É PROFESSOR DA FUNDAÇÃO ESCOLA DE SOCIOLOGIA, POLÍTICA DE SÃO PAULO (FESPSP).
Fonte: O Estado de S. Paulo - Suplemento ALIÁS - Domingo, 27 de abril de 2014 - Pg. E3 - Internet: clique aqui.

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