«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 18 de junho de 2013

COMPREENDENDO AS MANIFESTAÇÕES DE PROTESTO

[Caríssimos amigos e amigas, reproduzo abaixo algumas análises que foram publicadas na imprensa de hoje, terça-feira, dia seguinte às maiores manifestações que este país já teve desde o 
"Fora, Collor" de 1992!!!
Acredito que seja importante refletir sobre o significado delas e investirmos na organização das reivindicações que estão sendo feitas.
Boa leitura e reflexão!!!]

VINTE CENTAVOS BASTAM

Carlos Melo
Geraldo Alckmin e Fernando Haddad - respectivamentes Governador e Prefeito de São Paulo
O recuo de Geraldo Alckmin e Fernando Haddad, em relação às manifestações que tomam a cidade, foi indisfarçável e estampou as primeiras páginas dos principais jornais. O posicionamento frio do prefeito, assemelhado ao de técnicos biônicos do passado, e a postura beligerante do governador - poder-se-ia chamá-lo "Erasmo" Alckmin? - mudaram radicalmente, num cavalo de pau forçado pelas circunstâncias e pelos erros que eles próprios cometeram. E, por isso, foram obrigados a desdizer o que se disse como se antes não dissessem absolutamente nada - e, de fundamental, foi quase tudo o que de fato disseram.

Em Paris, na monotonia burocrática dos cargos que ocupam, foram pegos de surpresa. Agiram extemporaneamente como se lidassem com um bando de garotos. E não perceberam que os vinte centavos de aumento das tarifas eram muito mais que um dinheiro de troco. Que, na verdade, continham o potencial do repúdio ao processo crescente de desgaste e ineficiência do Estado e do sistema político, retratado na cidade que deixou de funcionar, há tempos. Lugar em que se localizam concretamente os problemas da nação e a tragédia cotidiana abraça a cidadania que, em vários aspectos, passou a valer muito menos que uma moeda.

Ora, quem há de negar que a qualidade de vida nos centros urbanos tangencia o desespero? 
  • A imobilidade urbana, 
  • a vertiginosa e sufocante verticalização, 
  • a baixa qualidade da saúde, 
  • o descaso com a educação, 
  • as enchentes, 
  • o custo de vida... 
  • E, é claro, a insegurança: já esquecemos que o noticiário dos últimos meses veio recheado de casos os mais escabrosos, os quais o governador teima em transformar em mera questão de menoridade penal? Alguém é capaz de negar que, em 12 de junho, Dia dos Namorados, a principal preocupação na cidade era se haveria ou não arrastões pelos bares e restaurantes naquela noite?
Alckmin e Haddad negligenciaram o potencial explosivo da situação; a presidente da República e os partidos políticos, todos, também. Voltado quase que exclusivamente à manutenção mecânica de espaços de poder, o sistema político nacional deixou de olhar e sentir a pulsação social, o clima das ruas; a nova sociedade. E é hoje incapaz de compreender, canalizar demandas e representar os cidadãos. Sim, ainda que menos comuns e mais difusos que no passado, há cidades e cidadãos que reagem ao mal-estar que suas autoridades não percebem. Será sempre questão de tempo para que uma fagulha ilumine perigosamente o paiol. Coisa pouca, vinte centavos bastam!

* CARLOS MELO É CIENTISTA POLÍTICO E PROFESSOR DO INSPER.

Fonte: O Estado de S. Paulo - Metrópole - Terça-feira, 18 de junho de 2013 - Pg. A18 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,analise-vinte-centavos-bastam-,1043632,0.htm
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UMA NOVA FORMA DE ATUAÇÃO POLÍTICA 
E SEUS DESAFIOS


Rafael Alcadipani, Fernando Luiz Abrucio 
e Marco Antonio Teixeira*
Manifestação em São Paulo:
Movimento Passe Livre
A Constituição de 1988 trouxe avanços em relação à democracia participativa, com a possibilidade de convocação de referendos e plebiscitos, além do envio de projetos de leis de iniciativa popular. Este modelo institucional é uma conquista da sociedade brasileira. Porém, efetivamente, pouquíssimas são as iniciativas populares que vingaram, como ocorreu recentemente com a Lei da Ficha Limpa. Em matéria de plebiscito e referendo nacionais, desde 1988 foram realizados apenas dois.

O mundo de hoje contém um paradoxo: há incentivos para a desmobilização dos indivíduos frente à esfera pública, sobretudo por causa do avanço da lógica do consumismo hedonista, mas também as pessoas conversam cada vez mais entre si pelas redes sociais. É preciso, portanto, aproveitar este vetor positivo de participação, principalmente em relação aos mais jovens.

Em um mundo em que a tecnologia permite conexões espontâneas e rápidas, onde a notícia navega em altíssima velocidade, onde as opiniões são facilmente disseminadas, o Movimento Passe Livre nos mostra que precisamos, urgentemente, pensar em formas alternativas de permitir a manifestação dos cidadãos sobre as políticas públicas. Criar novos campos participativos é fundamental para reduzir a distância entre os governos e as demandas sociais.

Mas as manifestações devem enfrentar um grande desafio: como coadunar sua lógica das ruas com a necessária atuação nas instituições ditas tradicionais. No caso do Movimento Passe livre, sua vitória ocorrerá se ele conseguir abrir canais de comunicação com os Poderes Executivo e Legislativo dos três níveis de governo. Uma ideia nesta linha seria a criação, em São Paulo, de um Fórum sobre a Mobilidade Urbana, no qual pudessem participar vários atores políticos e sociais, e que tivesse um prazo para produzir debates, negociações e propostas. Ao final, este processo seria transformado em leis e decisões governamentais.   

* SÃO PROFESSORES DA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS (FGV-SP).

Fonte: O Estado de S. Paulo - Metrópole - Terça-feira, 18 de junho de 2013 - Pg. A12 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,analise-uma-nova-forma-de-atuacao-politica-e-seus-desafios-,1043625,0.htm
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PROPOSTA CONCRETA

VLADIMIR SAFATLE
Manifestação no Rio reuniu 100 mil pessoas
Foto: Rudy Trindade, Agencia RBS
Há várias maneiras de esconder uma grande manifestação. Você pode fazer como a Rede Globo e esconder uma passeata a favor das Diretas-Já, afirmando que a população nas ruas está lá para, na verdade, comemorar o aniversário da cidade de São Paulo.

Mas você pode transformar manifestações em uma sucessão de belas fotos de jovens que querem simplesmente o "direito de se manifestar". Dessa forma, o caráter concreto e preciso de suas demandas será paulatinamente calado.

O que impressiona nas manifestações contra o aumento do preço das passagens de ônibus e contra a imposição de uma lógica que transforma um transporte público de péssima qualidade em terceiro gasto das famílias é sua precisão.

Como as cidades brasileiras transformaram-se em catástrofes urbanas, moldadas pela especulação imobiliária e pelas máfias de transportes, nada mais justo do que problematizar a ausência de uma política pública eficiente.

Mas, em uma cidade onde o metrô é alvo de acusações de corrupção que pararam até em tribunais suíços e onde a passagem de ônibus é uma das mais caras do mundo, manifestantes eram, até a semana passada, tratados ou como jovens com ideias delirantes ou como simples vândalos que mereciam uma Polícia Militar que age como manada enfurecida de porcos.

Vários deleitaram-se em ridicularizar a proposta de tarifa zero. No entanto, a ideia original não nasceu da cabeça de "grupelhos protorrevolucionários". Ela foi resultado de grupos de trabalho da própria Prefeitura de São Paulo, quando comandada pelo mesmo partido que agora está no poder.

Em uma ironia maior da história, o PT ouve das ruas a radicalidade de propostas que ele construiu, mas que não tem mais coragem de assumir.

A proposta original previa financiar subsídios ao transporte por meio do aumento progressivo do IPTU. Ela poderia ainda apelar a um imposto sobre o segundo carro das famílias, estimulando as classes média e alta a entrar no ônibus e a descongestionar as ruas.

Apenas nos EUA, ao menos 35 cidades, todas com mais de 200 mil habitantes, adotaram o transporte totalmente subsidiado. Da mesma forma, Hasselt, na Bélgica, e Tallinn, na Estônia. Mas, em vez de discussão concreta sobre o tema, a população de São Paulo só ouviu, até agora, ironias contra os manifestantes.

Ao menos, parece que ninguém defende mais uma concepção bisonha de democracia, que valia na semana passada e compreendia manifestações públicas como atentados contra o "direito de ir e vir". Segundo essa concepção, manifestações só no pico do Jaraguá. Contra ela, lembremos: democracia é barulho.

Quem gosta de silêncio prefere ditaduras.

Fonte: Folha de S. Paulo - Opinião - Terça-feira, 18 de junho de 2013 - Pg. A2 - Internet: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/114525-proposta-concreta.shtml
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VIRTUDES E LIMITES

HÉLIO SCHWARTSMAN
Manifestação no Rio de Janeiro: 17 de junho de 2013

Hoje eu vou divergir do amigo e mestre Clóvis Rossi que, em sua coluna dominical, disse que as democracias estão fracassando, já que não conseguem processar as demandas das diversas manifestações de massa a que vêm sendo submetidas nas últimas décadas.

Precisamos, antes de mais nada, desfazer alguns equívocos sobre a democracia. Ela até que funciona, mas não pelas virtudes que normalmente lhe atribuímos. Para começar, é preciso esquecer o mito do eleitor racional que compara propostas, as analisa e toma a melhor decisão. Se há um momento em que o cidadão tende a ser especialmente emocional, é o instante do voto. A coisa só dá certo porque, em condições ordinárias, as posições mais extremadas tendem a anular-se, empurrando a escolha para grupos menos radicais.

A democracia também não tem o dom de eliminar os conflitos presentes na sociedade. O que ela procura fazer é institucionalizá-los e discipliná-los, para que se resolvam da forma menos violenta possível. Daí que é impossível e indesejável eliminar completamente o caráter meio baderneiro de protestos e atos públicos.

Voltando às considerações de Rossi, eu não diria que o fato de as ações de movimentos como "Occupy" e "Indignados" não terem se materializado em propostas concretas signifique uma derrota. Ao contrário, mesmo com sua pauta imprecisa e vagamente metafísica, eles contribuíram para modificar as percepções de governantes e da própria sociedade. Pela primeira vez, norte-americanos estão discutindo seriamente o problema da desigualdade social. Esses jovens, com seus acampamentos, cartazes bem-humorados e doses até que moderadas de violência conseguiram afetar o "Zeitgeist" (espírito da época), o que não é pouca coisa.

É evidente, porém, que a democracia não opera milagres. Ela não vai resolver a crise econômica nem diminuir os efeitos sociais perversos da perda de confiança no futuro.

Fonte: Folha de S. Paulo - Opinião - Terça-feira, 18 de junho de 2013 - Pg. A2 - Internet: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/114522-virtudes-e-limites.shtml
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O MOVIMENTO DA HORA PRESENTE

LUIZ WERNECK VIANNA *
Manifestação no Congresso Nacional em Brasília (DF) - 17 de junho
Foto: Pedro Ladeira (Folhapress)
Eppur si muove, mas ao contrário do movimento da Terra, que não sentimos, na frase famosa de Joaquim Nabuco, este movimento que aí está não dá para não perceber. Em cima, em baixo, nas grandes capitais, nas periferias, no coração do Brasil, lá em Belo Monte, entre os índios, os sem-teto, os sem-terra, nas corporações profissionais e entre os estudantes, de dentro dessa crosta encardida que, há anos, a tudo abafava há sinais de vida nova.

Os interesses e as ideias de cada qual são díspares, desencontrados uns dos outros, como seria de esperar numa sociedade que não mais reflete sobre si, que destituiu a política da sua dignidade e converteu os partidos políticos em instrumentos sem vida, máquinas eleitorais especializadas na reprodução política dos seus quadros.

Os acontecimentos recentes em São Paulo, no Rio de Janeiro e em outras grandes cidades - especialmente no caso paulista - somente na aparência podem ser tomados como um raio em dia de céu azul. Igualmente enganoso seria compreendê-los como um mero, embora significativo, episódio de políticas públicas de transporte urbano.

As reportagens dos meios de comunicação, em particular as da imprensa escrita, têm trazido à luz a identidade social de algumas lideranças desse movimento de ocupação popular das ruas, não poucas cursando universidades de elite, para as quais o aumento irrisório nas tarifas dos transportes não teria como explicar a reação, à primeira vista desproporcional, aos poucos centavos acrescidos a seu preço.

A memória política talvez ajude a pensar o caso em tela: no segundo ano do governo de Juscelino Kubitschek, em 1956, um movimento de estudantes durante vários dias tomou as ruas na chamada greve dos bondes, no Rio de Janeiro, então capital federal, e seu alcance foi de tal natureza que se temeu a iminência de uma crise institucional. A crise foi contornada politicamente, com o próprio presidente Kubitschek intercedendo junto ao presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), a quem recebeu em seu gabinete presidencial.

Nesse registro, o que vale notar é que aquela movimentação estudantil transcendia a sua motivação declarada, o aumento do preço das passagens, encobrindo um malaise - sintoma que não escapou das sensíveis antenas políticas do presidente - que se arrastava desde o suicídio do presidente Getúlio Vargas e a subsequente turbulenta sucessão presidencial, em meio a golpes e contragolpes de Estado.

Não há exagero em sustentar que a feliz solução daquela crise - exemplar em termos de sua orientação democrática - vai estar na raiz da afirmação dos movimentos sociais nos anos subsequentes, os chamados "anos dourados", que viram nascer formas expressivas do moderno na cultura brasileira, como no Teatro de Arena, no Cinema Novo e na Bossa Nova, manifestações para as quais a UNE e o seu Centro Popular de Cultura desempenharam um não pequeno papel.

Foi assim que, de modo imprevisto e paradoxal, a modernização das estruturas econômicas do Brasil, desencadeada por decisões discricionárias do Poder Executivo - os "cinquenta anos em cinco" -, pôde se tornar compatível, numa sociedade dominada pelo tradicionalismo, com a emergência do moderno com as postulações que lhes são intrínsecas de autonomia da vida social.

O paralelo com a situação atual não é arbitrário: hoje, tal como nos anos 1950, vive-se um tempo de acelerada modernização promovida por indução da ação estatal, que vem revolvendo as suas estruturas sociais e ocupacionais e provocando o realinhamento, em curto espaço de tempo, da posição de classes e de estratos sociais.

Entre tantos processos dessa natureza, deve ser notada a nova configuração das chamadas classes médias, na esteira do processo de desenvolvimento capitalista do Brasil e da mobilidade social que a acompanha, inteiramente distintas, em termos de mentalidade e de inscrição no mercado, das que as antecederam.

Como inevitável, tais transformações vêm repercutindo no sentido de enriquecer as agendas de demandas sociais, como se verifica com o tema da mobilidade urbana que somente agora chega à ribalta. Contudo, esse ângulo tópico é apenas a ponta mais sensível das atuais manifestações - muitas delas mal escondendo a carga de fúria de que são portadoras - que irrompem por toda parte em diferentes cenários, não apenas urbanos.

Porém, sem dúvida, estamos longe das Praças Tahir, do Egito, e Taksim, da Turquia. Os movimentos sociais que emergem diante de nós não estão confrontados com um regime autoritário - vive-se na plenitude das liberdades civis e públicas.

Há, no entanto, um componente novo nessa movimentação social a requerer precisa identificação, a que o repertório de interpretação corrente nos últimos anos não concede acesso. A chave somente se fará disponível quando se compreender que se está diante de uma insurgência democrática em favor do reconhecimento de novas identidades sociais e de direitos de participação na vida pública, especialmente das novas gerações.

A hora da política está chegando e, com ela, a da remoção das instituições e práticas nefastas que a têm degradado, tal como nesta forma bastarda de presidencialismo de coalizão sob a qual se vive, engessando a moderna sociedade brasileira no passado e no anacronismo destes novos coronéis da vida republicana.

Há riscos na hora presente, e um dos maiores deles é o de não agir no sentido de evitar que a juventude se distancie dos valores da democracia, o que pode vir a ocorrer por intervenções desastradas dos atuais governantes. O desfecho de 2013 não pode repetir o de 1968.

* LUIZ WERNECK VIANNA É PROFESSOR PESQUISADOR DA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO (PUC-RIO).

Fonte: O Estado de S. Paulo - Espaço aberto - Terça-feira, 18 de junho de 2013 - Pg. A2 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-movimento-da--hora-presente-,1043763,0.htm

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