«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quarta-feira, 3 de março de 2021

África

 Uma região começa a ser reconhecida

 Rodrigo Petronio

Escritor e Filósofo, professor titular da FAAP 

“A Razão Africana”, do historiador Muryatan S. Barbosa, supre lacuna relevante sobre a produção intelectual do continente no mercado editorial brasileiro

MURYATAN SANTANA BARBOSA

Desde as obras pioneiras de Manoel Querino, Pierre Verger, Alberto da Costa e Silva e Kabengele Munanga às pesquisas fundamentais de Lilia Moritz Schwarcz, Ordep Serra, Sueli Carneiro, Reginaldo Prandi, Silvio Almeida e Nei Lopes, o pensamento africano tem recebido cada vez mais destaque no Brasil. Nesse movimento, Na Casa de Meu Pai: A África na Filosofia da Cultura, referência mundial do filósofo ganês Kwame Anthony Appiah, publicada pela Contraponto em 1997, pode ser considerada um marco. Por sua vez, O Pensamento Africano no Século XX (Expressão Popular, 2016), conjunto de artigos de pesquisadores brasileiros e africanos organizado por José Rivair Macedo, com prefácio de Severino Ngoenha, trouxe um novo fôlego ao debate. 

Em 2017, surgiu a coleção A África e os Africanos, da editora Vozes, coordenada pelos professores José D’Assunção Barros, Álvaro Nascimento e José Jorge Siqueira. Ela tem publicado autores brasileiros e estrangeiros seminais para a compreensão desse continente: Jean-Loup Amselle, Elikia M’Bokolo, Gwendolyn Midlo Hall, Marcel Dorigny, Bernard Gainot e Muniz Sodré. 

No mesmo ano, o clássico Arte Africana de Frank Willett, talvez a melhor referência sobre o assunto, saiu em parceria entre a Imprensa Oficinal do Estado de São Paulo e as Edições Sesc. Some-se a isso o interesse crescente dos leitores brasileiros pela obra do filósofo camaronês Achille Mbembe, publicada pela editora n-1. Temos um painel muito positivo. E a esperança de que cresça ainda mais. Entretanto, ainda havia um elemento ausente: um panorama abrangente da produção intelectual africana atual. 

Para suprir esta lacuna, a editora Todavia acaba de colocar no mercado A Razão Africana: Breve História do Pensamento Africano Contemporâneo, do historiador Muryatan Santana Barbosa, com orelha assinada por Rivair Macedo. Nascido em 1977 em Lund (Suécia), Muryatan é autor de Guerreiro Ramos e o Personalismo Negro (Paco, 2015), síntese da trajetória intelectual do sociólogo negro Alberto Guerreiro Ramos (1915-1982). 

Professor adjunto do Bacharelado em Ciências e Humanidades, do Bacharelado em Relações Internacionais e do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Mundial, todos da Universidade Federal do ABC (UFABC), há anos Muryatan tem se dedicado ao pensamento africano e afrodiaspórico. 

Inspirado em Marx e no filósofo da ciência Gaston Bachelard (1884-1962), Muryatan segue dois preceitos: 1. Investigar as matérias em seus detalhes, de modo a “analisar suas diferentes formas de desenvolvimento e rastrear seu nexo interno”. 2. Recorrer ao descritivismo, à medida que a “descrição é a finalidade da ciência”. Devido a isso, o contorno metodológico é impecável, pois consegue mapear uma variedade enorme de autores, obras e ideias, em dimensões continentais e em uma perspectiva transdisciplinar. 

Livro publicado em agosto de 2020, com 216 páginas, pela editora Todavia

A divisão interna da obra

1ª Parte: A primeira parte analisa o protagonismo das ideias de Edward Blyden e as origens do nacionalismo africano (1870-1917), o Entreguerras (1917-1939) e o papel da diáspora. Os primórdios desse pensamento mostra-se atrelado aos impasses da colonização e dos paradigmas europeus.

A unificação dos intelectuais passa por projetos de descolonização, e por teorias alternativas ao racismo e ao colonialismo.

Para tanto, era preciso formular uma personalidade africana. 

Tomam forma então os conceitos de negritude e de pan-africanismo, hipóteses de uma possível unificação étnica, política e cultural do continente. Trata-se de uma defesa de valores civilizacionais e (a seu modo) modernos específicos da África. Essa primeira etapa realoca os papéis e as funções tanto da política quanto da cultura, que se tornam indissociáveis. 

2ª Parte: A segunda parte se chama O Reino Político. E o subtítulo explica o teor desse segundo grande momento. Baseia-se na tese de que apenas por meio de forças políticas poderia haver a emancipação africana proposta pelos pensadores anteriores. Tomando como divisa as ideias de Kwame Nkrumah (1909-1972), presidente de Gana de 1960 a 1966, os intelectuais passam a colocar a política no centro de todas as demais ações, orientação que dominou a produção africana ao longo das décadas de 1950 e 1960. Fortalece-se nesse momento o socialismo e o marxismo africanos. 

Contudo, essas teorias críticas ressaltaram os limites das utopias pan-africanistas. E os intelectuais se deparam então com alguns problemas.

Como organizar uma sociedade pós-colonial?

A partir da hegemonia do neoliberalismo, nas décadas de 1980 e 1990, como evitar que os nacionalismos se convertam em uma rebalcanização neocolonial, como advertira Mbembe? 

3ª Parte: Para sanar esses impasses, Muryatan concentra sua argumentação final no conceito que nomeia a terceira parte da obra: o autodesenvolvimento. O autodesenvolvimento passa a ser uma tônica dos intelectuais das últimas décadas, representados em grande parte por economistas. Esse movimento se assenta em uma tomada de consciência paulatina das especificidades e das contradições do desenvolvimento e da modernidade africanos. A questão central?

Como seria possível passar da economia política clássica africana a novas estratégias de desenvolvimento, conciliando as democracias e o capitalismo contemporâneos.

Esse projeto se alicerça em alguns desafios: diversidade econômica, industrialização autônoma, integrações regional e continental, aumento da qualidade de vida. E também contempla novas propostas: superação das “disparidades de gênero, raciais e étnicas”, sustentabilidade, e um tipo de desenvolvimento cada vez mais endógeno e democrático. 

A capacidade de síntese de Muryatan torna sua obra obrigatória para qualquer um que pretenda se aprofundar em temas africanos. E também para aqueles que pretendam compreender as ideais contemporâneas de um ponto de vista complexo e policêntrico. Afinal, esse talvez seja o maior imperativo e o maior desafio para a construção de um novo pensamento para o século 21. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – Aliás – Domingo, 28 de fevereiro de 2021 – Pág. H11 – Internet: clique aqui (acesso em: 03/03/2021).

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