«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 26 de abril de 2021

A religião em meio à polarização

 Igrejas devem ficar de fora de guerras culturais, diz téologo de Yale

 Anna Virginia Balloussier 

Entrevista com Miroslav Volf

Professor de teologia da Faculdade de Divindade da Universidade Yale (Estados Unidos), fundou e dirige o Centro de Fé e Cultura na mesma instituição. Escreveu mais de 20 livros, entre eles “Exclusão e Abraço” (1996, revisado em 2019) e “Allah: A Christian Response” (Alá: Uma Resposta Cristã, em tradução livre; 2011) 

Para Miroslav Volf, não há nada de cristão em pensar, sobretudo, em si mesmo, tipo “America first” (América primeiro)

MIROSLAV VOLF - teólogo croata radicado nos Estados Unidos

As guerras culturais espalharam bárbaros por toda parte, e as igrejas cometem um grande erro ao se envolverem nessas batalhas, diz o teólogo croata Miroslav Volf, fundador do Centro de Fé e Cultura da Universidade Yale. Volf atualiza um clássico seu, “Exclusão e Abraço”, lançado primeiro em 1996 e reeditado para caber no espírito do nosso tempo. No Brasil, está publicado pela editora Mundo Cristão. 

À Folha de S. Paulo o teólogo fala sobre o bom samaritanismo que, hoje, significa abrir mão de reuniões religiosas presenciais para deter a Covid. “Insistir em adorar pessoalmente é insistir em prejudicar nossos vizinhos.” 

O sr. lançou “Exclusão e Abraço” há 25 anos. De lá para cá, que metade desse binômio prevaleceu?

Miroslav Volf: Quando escrevi o livro, o mundo se globalizava rapidamente após a queda do mundo bipolar [da Guerra Fria]. Conflitos identitários não eram raros, mas aconteciam nas bordas. Quando descambaram para confrontos abertos, o Ocidente muitas vezes os vivenciou como barbárie subcivilizacional. Hoje a política identitária é uma realidade global. “Bárbaros” estão por toda parte, para usar o vocabulário que geralmente desaprovo. 

Por quê?

Volf: Não quero cravar que a maior parte da política identitária de direita seja expressão de uma luta anticivilizacional. Exceto pelo extremo disso, é um ponto de vista moral. Discordo profundamente, mas não quero desumanizar quem acredita nisso. 

Publicado em março de 2021 pela editora Mundo Cristão

O sr. levantou em 1996 meios para evitar o extremismo. O mundo teve sucesso nesse ponto?

Volf: O extremismo abunda. Os Estados Unidos, que desde a sua fundação foram um farol de democracia, tiveram até recentemente um presidente profundamente antidemocrático, o sr. [Donald] Trump, que perseguia não apenas políticas do tipo “América primeiro”, mas “América branca primeiro”. O país continua dividido. 

O que o slogan trumpista “Make America Great Again” (= Torne a América grande novamente), que o sr. cita no prefácio, diz sobre nossos tempos?

Volf: Que nos preocupamos apenas conosco. Não é tão supremacista quanto “Deutschland über alles” [Alemanha acima de tudo, adotado pelo nazismo], mas não está muito atrás. Não há nada de cristão nisso, embora muitos devotos o tenham abraçado. A fé cristã é um credo universalista, o que significa que Deus cuida de cada humano igualmente. Um cidadão não é como um operador de Wall Street que exige o melhor negócio para si e para seus acionistas, não importa o que aconteça com as outras pessoas. 

E quanto ao Brasil?

Volf: Visitei o país apenas uma vez, em 2018. Você pode imaginar que minha percepção do que está acontecendo política, econômica e culturalmente por aí é limitada. Mas, vendo de fora, parece estranhamente semelhante à situação nos Estados Unidos [sob Trump]. 

Neste contexto polarizado, a religião pode semear discórdia?

Volf: Ao longo dos séculos, as religiões desempenharam papéis contraditórios. O cristianismo, por exemplo, deu origem ao humanitarismo como o conhecemos, mas também legitimou a colonização de povos, abençoou guerras e agiu de formas que entram em contradição com a missão de Jesus Cristo. O argumento do meu livro é que no cerne dessa fé estão os recursos para uma “política de abraço”. 

Qual seria ela?

Volf: Uso abraçar como metáfora para a parábola do filho pródigo, que ilustra tanto o caráter de Deus que cristãos devem emular quanto a maneira como Ele se relaciona com os rebeldes e os “cidadãos de bem”.

Existe um senso de que os inimigos também devem ser amados, mesmo se, e especialmente quando, devemos resistir a eles.

O sr. acha que templos devem continuar abertos em fases mais críticas da pandemia?

Volf: Quem frequenta serviços presenciais não se coloca apenas em risco. Infectados nos cultos carregam a Covid para fora. Insistir em adorar pessoalmente é insistir em prejudicar nossos vizinhos. Sei que alguns líderes afirmam que não se reunir causa dano espiritual, o que seria pior do que a morte. Mas persistir nas reuniões quando o vírus está aumentando é moralmente errado. É análogo à justificativa que o sacerdote, na história bíblica do bom samaritano, poderia ter dado para não ajudar o homem ferido à beira do caminho: suas necessidades espirituais urgentes eram mais importantes do que a vida do outro.

Jesus, porém, elogiou o samaritano, aquele que deixou de lado suas prioridades por causa do necessitado.

Se a pandemia se agravar, vamos ficar em casa e fazer o mesmo. 

Quando o Supremo Tribunal Federal determinou que as igrejas permanecessem fechadas se assim governadores e prefeitos decretassem, pastores disseram que a decisão feria a liberdade religiosa. Concorda?

Volf: Não acredito. É, ou ao menos deveria ser, uma questão de segurança pública. Para virar discriminação religiosa, um estado ou uma cidade teriam que impor restrições mais rigorosas a missas e cultos do que a outras atividades públicas ou comerciais comparáveis em relevância. Mas, mesmo sem decretos, as igrejas devem fazer suas próprias deliberações morais guiadas pelo amor ao próximo. 

A crise causou muitos cismas na sociedade, em temas como vacina, lockdown e até o uso de máscara. Que lição tiraremos disso?

Volf: Espero que seja a de que somos os guardiões de nossos irmãos e irmãs. A atual pandemia é um caso claro em que, trabalhando para o bem dos outros, eu trabalho para o meu. 

Publicado em dezembro de 2017 pela editora Mundo Cristão

Qual é a participação dos grupos religiosos na polarização?

Volf: Nos Estados Unidos, e em parte da Europa, as igrejas têm se envolvido fortemente em guerras culturais. Acho um grande erro. A liderança religiosa pensa que vencer essas batalhas impedirá a secularização e manterá a nação inteira ligada à herança cristã.

Estou convicto de que isso não leva ao ressurgimento da religião, mas à secularização.

O engajamento político dos cristãos só faz sentido quando temos uma VISÃO SOCIAL DE INSPIRAÇÃO CRISTÃ, e não quando selecionamos algumas questões [morais] e batalhamos por elas.

O senhor está otimista com o mundo pós-pandemia?

Volf: Prefiro não pensar em otimismo e pessimismo, e sim na compreensão judaica e cristã de “esperança” e “desespero”. O otimismo legítimo é baseado na crença de que o presente está grávido de futuro e o dá à luz. Se assim for, temos motivos para nos preocupar. Já a esperança pode existir mesmo nas circunstâncias mais sombrias, mesmo se estamos no marco zero. Quando Jesus estava pendurado na cruz em agonia e vergonha, não havia razão para otimismo. Mas então veio o milagre da ressurreição, e os seguidores de Jesus aprenderam a ter esperança de que coisas impossíveis são possíveis. Bem entendida, a esperança é “uma xícara de café” no momento. 

Fonte: Folha de S. Paulo – Mundo – Domingo, 25 de abril de 2021 – Pág. A15 – Internet: clique aqui (acesso em: 25/04/2021).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.