A religião a serviço da VIDA

 Os horrores da necroespiritualidade

 Adilson de Souza Filho

Pastor da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, é doutor em Ciências da Religião e professor na Fatipi (Faculdade de Teologia de São Paulo) 

Liturgia da morte inclui políticos e falsos pastores

ASSUSTADOR ! ! ! - Foto publicada nas redes sociais da Igreja Apostólica Plenitude do Trono de Deus, em São Paulo, 14 de julho de 2020, em plena pandemia.

A pandemia de Covid-19 está escancarando o que há de pior numa sociedade, que é o lado vil e animalesco do ser humano. Ouvimos relatos de pessoas que roubam vacinas, fraudam filas e que insistem na produção de mensagens capazes de convencer os mais simples de que usar máscaras e álcool em gel e praticar o distanciamento social são mecanismos de “ideologia política”. E, ainda, vemos pastores fabricando uma diabólica necroespiritualidade como claro sinal de automanutenção de suas benesses auferidas junto aos dízimos e ofertas dos fiéis, incentivando-os a se fazerem presentes nos templos, sob a desculpa de que precisam do alimento espiritual. 

A necroespiritualidade é um tipo de louvor à morte, como se ela fosse promoção para uma vida superior, celestial. A palavra “necro” vem do grego (“nekros”), que significa cadáver. Já “espiritualidade”, também do grego (“pneuma”), significa espírito, sopro divino que gera e mantém a vida com a qual nos relacionamos espiritualmente com Deus.

Assim, necroespiritualidade dá o sentido de espiritualidade que tem como finalidade a própria morte.

Os protagonistas são os falsos pastores de nosso tempo, que têm incentivado os fiéis a não seguirem os protocolos sanitários, com a finalidade de auferirem apoio irrestrito aos adeptos da necropolítica que projetam a instalação do caos social para, posteriormente, agirem por meio de métodos fascistas e intervencionistas sobre a nação. 

No Brasil, em nome da necropolítica, temos assistido aos horrores de uma liturgia da morte conduzida por personagens públicos, incluindo políticos e religiosos, em nome do “salvamento” da economia. Como disse o apóstolo São Paulo sobre tais líderes:

«É preciso fazê-los calar, porque andam pervertendo casas inteiras, ensinando o que não devem, por torpe ganância» (Tito 1,11).

Todo pastor que reproduz essa nefasta necroespiritualidade está a serviço de SATANÁS, que veio somente para matar, roubar e destruir.

No extremo oposto, Jesus Cristo promoveu um Evangelho pautado na abundância da vida, na espiritualidade ecológica, com raízes profundas nas relações de alteridade e solidariedade. Se teu pastor o desafia a negligenciar os protocolos sanitários, se ele te desafia a provar sua fé fazendo aglomeração nas ruas, no comércio, nas festas familiares e até mesmo na igreja, tenha toda certeza de que ele está a serviço de satanás, que é o anjo da morte. 

BOM EXEMPLO ! ! ! - Desta comunidade batista de Brasília (DF)

Teologicamente, o início do pecado na Bíblia começou com o desejo de matar, conforme Gênesis 4,7; nesta passagem, registra-se o primeiro assassinato de uma vida humana. O sinal bíblico de que Deus é o Deus da vida,  e não da morte, está estampado em toda a criação. Aliás, o sinal escatológico da redenção completa contra o pecado aponta para a promessa da restauração de novos céus e nova terra, como podemos verificar nas profecias de Isaías 65,17 e em Apocalipse 21. 

Outra riqueza profética que encontramos na Bíblia está registrada em Ezequiel 18,23. Nesta passagem Deus diz enfaticamente:

«Acaso, tenho eu prazer na morte do perverso? — diz o Senhor Deus; não desejo eu, antes, que ele se converta dos seus caminhos e viva?».

Portanto, pior do que não seguir os protocolos sanitários é incentivar o teu próximo — que desde o Antigo Testamento Deus nos ordenou amar — a desrespeitar e desdenhar da dádiva da vida. Se teu pastor desrespeita as ordens civis e sanitárias, dizendo que isso é sinal de fé, por não temer a doença nem a morte, na verdade ele é psicopata, característica de alguém que é incapaz de sentir empatia, incapaz de sentir a dor do outro. 

Não temer a morte não é sinal de fé, mas sim uma PATOLOGIA DEPRESSIVA que tem como característica o desejo de morrer.

Aos pastores que desafiam as ovelhas de Jesus a irem aos seus templos, resta-lhes cumprir a profecia proferida por Jesus:

«Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais o mal [a necroespiritualidade]», Mateus 7,23.

Fonte: Folha de S. Paulo – TENDÊNCIAS / DEBATES – Domingo, 4 de abril de 2021 – Pág. A3 – Internet: clique aqui (acesso em: 05/04/2021).

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