«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

A patética pesquisa do PT

Editorial

Depois do segundo triunfo do presidente Lula nas urnas, apesar do fardo do mensalão que ele carregava, líderes tucanos começaram a se perguntar por que o partido [o PSDB] não havia conseguido capitalizar contra o seu principal beneficiário o que até então constituía o maior escândalo político da democracia brasileira. A esse fracasso se somou outro: o definhamento do PSDB no Congresso Nacional. Em 1998, na esteira da consagradora reeleição do presidente Fernando Henrique, a legenda viu a sua bancada na Câmara dos Deputados ampliar-se de 62 para 99 cadeiras. Com o advento da era Lula, porém, começou o longo declínio tucano: os 99 caíram a 70 em 2002 e a 66 daí a quatro anos.

Na esperança, afinal frustrada, de pelo menos estancar a hemorragia em 2010, um perplexo dirigente paulista da agremiação propôs numa reunião o que poderia se revelar um primeiro passo em busca da luz no fim do túnel. Por que, perguntou ele aos interlocutores, não encomendamos uma pesquisa para saber o que o eleitorado gostaria que fosse o nosso programa? O tucano decerto não se deu conta de que isso representaria uma abdicação: embora pesquisas periódicas sobre políticas que mexem com o sentimento popular tenham se incorporado em toda parte às práticas partidárias, o que se espera de uma sigla [partidária] é que seja capaz de persuadir o público de que as suas propostas são as que mais bem atendem o interesse geral. A isso se chama liderança.
A ideia, logicamente, não foi adiante. Serve, em todo caso, como lembrete de que não há partidos imunes a iniciativas cujos autores podem achar o máximo da modernidade, mas que são apenas patéticas. Agora, quem diria, o inimigo mortal dos tucanos, o PT [Partido dos Trabalhadores], resolveu perguntar aos brasileiros por que se tornou tão mal-amado. O fato, em si, é inconteste. Não só a presidente Dilma Rousseff escapou por muito pouco de ser desalojada do Planalto - obtendo uma vitória eleitoral que não a poupou de sair politicamente derrotada da campanha -, como o partido retrocedeu em todas as disputas. No primeiro turno do pleito presidencial, a sigla teve 4,3 milhões de votos a menos do que em 2010. Na segunda rodada, a perda foi de 1,2 milhão, embora nesses quatro anos tenham surgido 7 milhões de novos eleitores.

No ABCD paulista, onde nasceram o PT e a CUT, Dilma só derrotou Aécio Neves em Diadema - e por uma diferença aquém de 8%. A bancada federal petista encolheu de 88 para 70 membros. As bancadas estaduais, de 149 para 108. A agremiação não conseguiu reeleger nem o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, que não chegou ao segundo turno, nem o do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, que chegou, mas acabou goleado.
  • O estigma de promotor da corrupção que o partido fez por merecer,
  • a fadiga de amplos setores do eleitorado com 12 anos de poder petista,
  • a virtual estagnação econômica e, não menos importante,
  • a percepção da incompetência da presidente explicam a rejeição ao petismo, que chega a ser avassaladora em São Paulo.
Pois bem. Como se isso não fosse evidente, a legenda mandou fazer uma sondagem em âmbito nacional, acompanhada de pesquisas qualitativas, para ouvir da sociedade o que os seus grãos-companheiros saberiam por conta própria, não fosse a cegueira de que foram acometidos, há muito, pela fantasia de serem os exclusivos portadores do progresso nacional e da redenção do povo injustiçado. Eis por que, antes até de receber das urnas as más notícias que os desconcertaram, ficaram aturdidos com o desgosto, também por eles, dos manifestantes de junho de 2013, não raro acompanhado de agressivo antipetismo. A memória do mensalão, o colapso dos serviços públicos - debitado em primeiro lugar à administração federal - e a ojeriza ao sistema político, sem distinguir o PT do conjunto dos partidos execrados, estilhaçaram a profana ignorância do apparat petista sobre o que germinava em surdina no País.

Embora sustentado também pelo contribuinte, via Fundo Partidário, o PT que faça o que quiser com o seu dinheiro. Por exemplo, torrá-lo numa pesquisa que, de um lado, deverá apenas confirmar o óbvio - e, de outro, dificilmente induzirá a elite estrelada a deixar as práticas afrontosas que já são a sua segunda natureza.

Fonte: O Estado de S. Paulo –  Notas e Informações – Quarta-feira, 26 de novembro de 2014 – Pg. A3 – Internet: clique aqui.

Mapeamento do antipetismo: o PT entre o cínico e o obsoleto

Priscila Pedrosa Prisco*
Uninomade
25-11-2014
Manifestantes ocupam a parte externa do Congresso Nacional em Brasília (DF)
Dia 17 de junho de 2013
 
O Partido dos Trabalhadores [PT], preocupado com os altos índices de rejeição, contratou a empresa Marissol para fazer um mapeamento do antipetismo.

A matéria, publicada pela [revista] Exame, destaca que “a cúpula do PT já tem um diagnóstico primário das causas do antipetismo. Segundo dirigentes, a onda começou nos protestos de junho de 2013, quando militantes petistas foram agredidos em manifestações em São Paulo, tomou corpo durante o processo eleitoral deste ano e continuou depois das eleições, com as manifestações contra a presidente Dilma.”

Os intelectuais do PT ainda insistem na tese de que as jornadas de junho foram protagonizadas por fascistas de direita. Por que é tão difícil reconhecer que houve mudança nos modos de produção capitalistas e na dinâmica das lutas? Talvez a dificuldade em reconhecer as mudanças na base estrutural do capitalismo do século XX se deva ao fato que isto significa romper com estruturas de poder autoritárias, que usam a força e a violência como garantia de êxito dos projetos empresariais e políticas privatistas.

As jornadas de junho estão inseridas em um processo de conflito social que se exprime na violência encarnada no ódio racial, na opressão de gênero e em privilégios socioeconômicos. No entanto, o cinismo do governo não se permite compreender as jornadas fora de uma disputa de hegemonia polarizada entre petismo e antipetismo, colocando-se assim como fiel da balança do panorama político brasileiro. Enquanto isso, os novos sujeitos do trabalho são reduzidos a inimigos fascistas que precisam ser esmagados por um biopoder totalizante. Já que a presente estrutura de poder, sobre o que se constrói a governabilidade (e o governismo), é incapaz de reconhecer e valorizar as diversidades e subjetividades resistentes à precarização do trabalho, à violência impregnada na rotina, à militarização e/ou milicialização dos territórios dos pobres, à falta de efetivação dos direitos sociais.

O governismo padece de uma obsolescência ideológica cuja saída só poderia estar num novo olhar sobre as relações do trabalho metropolitano, a fim de compreender a eclosão das resistências de junho não somente como lutas de classe operárias nos termos ortodoxos das conquistas salariais e de melhores condições de emprego, como também uma luta global por uma nova forma de democracia social participativa.

Entender os porquês da crescente rejeição ao governo e ao PT só será possível começando pelo fim da arrogância em considerar-se o centro irradiador de sentido do sistema político (ou da esquerda). É preciso perceber essa arrogância, bem como a responsabilidade pelos equívocos das políticas neodesenvolvimentistas, que acabaram por incrementar a estrutura securitária de controle social, que historicamente submete os mais pobres e vulnerabilizados a um cotidiano brutalizante de medo, intimidação, silenciamento, execuções sumárias e torturas.

Por isso, ignorar as mudanças estruturais do capitalismo no século 20 e seguir querendo impor as velhas formas de organização das lutas do trabalho consiste numa tentativa de desqualificar politicamente a recomposição dos trabalhadores da metrópole, que se articulam e organizam sua cooperação de outros modos. Este, definitivamente, não é um caminho para entender porque a multidão insurgente de junho rejeita o atual governo e o PT.

Lamentavelmente, o PT e sua militância estão obsoletos, afogaram-se num mar de prepotência e intolerância diante da alteridade. Toda crítica vem sendo tratada como discurso de ódio e a seguir achatada num bloco unitário e amorfo de “antipetismo”. O extremismo petista parte, então, para a solução mais simples: denunciar como fascista tudo o que lhe desagrada, enfatizando o discurso de polarização partidária, que é forma não só de destruir o inimigo, como também de dobrar as críticas vindas à esquerda, segundo a tentativa de construir um discurso unificado hegemônico das “esquerdas”, quer dizer, a unificação que atende à vontade do governismo.

A velha guarda da militância operária não consegue (e não quer) enxergar a falência dos grandes agregados coletivos-identitários baseados noutra composição do trabalho (do operariado-massa dos grandes distritos industrializados do  passado), atendo-se ainda a um cinturão de sindicatos pelegos, engrenados acriticamente na transmissão de pautas e diretivas do governo, cooptados por uma institucionalidade em crise.

Em primeiro lugar, é preciso assumir os males da “governabilidade” empreendida pelas políticas neodesenvolvimentistas dos últimos 12 anos, para começar a enxergar com lucidez o porquê de as lutas não suporem mais a centralidade das instituições representativas (partidos políticos e sindicatos). Essa centralidade se deslocou para incorporar o potencial dos trabalhadores metropolitanos em toda a amplitude da cooperação social, dos fluxos transversais da cidade, da rede de singularidades que não deixam de ser singularidades quando se unem na luta e criação de alternativas. Isto significa entender que não há líderes neste processo.

No entanto, enquanto vigorar a demagogia em pretender construir a realidade de maneira tão simplória, etiquetando as lutas em “de direita” ou “de esquerda” em função das conveniências partidárias e eleitorais, qualquer pesquisa não servirá senão para negar os fatos. As contingências irredutíveis dos fatos são assim ignoradas, do que só poderá resultar a manipulação da pesquisa, a partir de pressupostos enviesados voltados a reeditar a mesma polarização falsa: petistas (amigos) x antipetistas (inimigos).

O fracasso de um modelo de organização partidária de esquerda que parou no tempo está novamente evidenciado no momento em que pretende reimpor os mesmos binarismos, a mesma máquina de consensos forjados a partir da mera necessidade de manter-se no poder, mesmo que isto signifique negar as lutas, destruir a organização política do trabalho e criminalizar quem luta por uma democracia melhor.

Querem identificar líderes? querem sondar o tecido social atrás do que já acreditam conhecer, a fim de reencontrar redimidas as velhas estruturas, e assim propagar um discurso de polarização que, no calor do conflito social, não lhe corresponde?

Que tal, então, estudarem a crise da representatividade? Que tal tentarem olhar para junho de 2013 dentro de um contexto global e local de lutas interconectadas, por novas formas, métodos e instituições?

Mas não, querem mesmo é associar black blocs a Bolsonaros!

Toda resistência a uma violência ilegítima do Estado seletivo protagonizada pelas jornadas de junho passa a ser associada, convenientemente, às manifestações golpistas e a todo tipo de violência fascista e preconceituosa.

A neurose petista prefere ignorar as mazelas da sua gestão e despolitizar as lutas por direitos articuladas em moldes apartidários, assim articuladas em meio a uma crise representativa, tudo para reduzi-las, dentro da lógica da polarização, aos atos despolitizados e golpistas, evidentemente, apoiados por partidos políticos conservadores.

Portanto, a cúpula do partido já começa a pesquisa com um diagnóstico primário totalmente equivocado, que contamina quaisquer conclusões. Senão para reforçar o consenso repressivo, militarista e criminalizante de que a cúpula do PT e governo participam conscientemente.

Nunca entenderão nada enquanto olharem o presente pelo passado. O que basta é saber se a intenção é mesmo entender alguma coisa ou se é mais uma tentativa de cercear garantias constitucionais pela intimidação dos que resolverem não ser chantageados pelo discurso da polarização.
 
* Priscila Pedrosa Prisco é advogada ativista, membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Quarta-feira, 26 de novembro de 2014 – Internet: clique aqui.

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