«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

APRESENTADA A PRIMEIRA ENCÍCLICA DE PAPA FRANCISCO

Lumen Fidei - A Luz da fé, 
primeira Encíclica do Papa Francisco


RÁDIO VATICANO
05.06.2013
PAPA FRANCISCO

Lumen Fidei - A luz da fé, assim se intitula a primeira Encíclica do Papa Francisco que hoje foi apresentada em conferência de imprensa, no Vaticano. Dirigida aos bispos, sacerdotes, diáconos, religiosos e religiosas e a todos os fiéis leigos, a Encíclica – explica o Papa Francisco - já estava "quase completada" por Bento XVI. Àquela "primeira versão" o atual Pontífice acrescentou "ulteriores contribuições". A finalidade do documento é recuperar o caráter de luz que é específico da fé, capaz de iluminar toda a existência humana. Quem acredita nunca está sozinho, porque a fé é um bem comum que ajuda a edificar as nossas sociedades, dando esperança. E este é o coração da Lumen fidei. Numa época como a nossa, a moderna - escreve o Papa - em que o acreditar se opõe ao pesquisar e a fé é vista como um salto no vazio que impede a liberdade do homem, é importante ter fé e confiar, com humildade e coragem, ao amor misericordioso de Deus, que endireita as distorções da nossa história.

Testemunha fiável da fé é Jesus, através do qual Deus atua realmente na história. Como na vida de cada dia confiamos no arquiteto, o farmacêutico, o advogado, que conhecem as coisas melhor que nós, assim também para a fé confiamos em Jesus, um especialista nas coisas de Deus. A fé sem a verdade não salva, diz em seguida o Papa – fica a ser apenas um bonito conto de fadas, sobretudo hoje em que se vive uma crise de verdade, porque se acredita apenas na tecnologia ou nas verdades do indivíduo, porque se teme o fanatismo e se prefere o relativismo. Pelo contrário, a fé não é intransigente, o crente não é arrogante: a verdade que vem do amor de Deus não se impõe pela violência, não esmaga o indivíduo e torna possível o diálogo entre fé e razão.
Edição italiana da encíclica LUMEN FIDEI

Se torna, portanto, essencial a evangelização: a luz de Jesus brilha no rosto dos cristãos e se transmite de geração em geração, através das testemunhas da fé. Mas de uma maneira especial, a fé se transmite através dos Sacramentos, como o Batismo e a Eucaristia, e através da confissão de fé do Credo e a Oração do Pai Nosso, que envolvem o crente nas verdades que confessa e o fazem ver com os olhos de Cristo. A fé é uma, sublinha o Papa, e a unidade da fé é a unidade da Igreja. Também é forte a ligação entre acreditar e construir o bem comum: a fé torna fortes os laços entre os homens e se coloca ao serviço da justiça, do direito e da paz. Essa não nos afasta do mundo, muito pelo contrário: se a tirarmos das nossas cidades, ficamos unidos apenas por medo ou por interesse. A fé, pelo contrário, ilumina a família fundada no matrimônio entre um homem e uma mulher; ilumina o mundo dos jovens que desejam “uma vida grande", dá luz à natureza e nos ajuda a respeitá-la, para "encontrar modelos de desenvolvimento que não se baseiam apenas na "utilidade ou lucro, mas que consideram a criação como um dom”. Mesmo o sofrimento e a morte recebem um sentido do fato de confiarmos em Deus, escreve ainda o Pontífice: ao homem que sofre o Senhor não dá um raciocínio que explica tudo, mas a sua presença que o acompanha. Finalmente, o Papa lança um apelo: "Não deixemos que nos roubem a esperança, não deixemos que ela seja frustrada com soluções e propostas imediatas que nos bloqueiam o caminho para Deus”.

Fonte: Portal da CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - Sexta-feira, 05 DE JULHO DE 2013 - 09h27 - ATUALIZADO em 05/06/2013 - 09h34 - Internet: http://www.cnbb.org.br/site/imprensa/noticias/12333-lumen-fidei-e-a-primeira-enciclica-do-papa-francisco
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As chaves da encíclica escrita por Bento e assinada por Francisco


José Manuel Vidal
Religión Digital
05-07-2013

Uma encíclica, a Lumen Fidei, que se converte no sinal máximo de humildade de um Papa. E um marco histórico, por ser uma encíclica escrita a “quatro mãos”. Ou melhor dito, obra majoritariamente de Bento, com uma introdução e um epílogo de Francisco. Mas assinada por este. Do contrário, o escrito do Papa emérito nunca teria adquirido essa categoria. Um status ao qual galga a inusitada humildade de seu sucessor. É a continuidade descontínua. É o magistério conjunto de dois Papas.

E o reconhece aberta e claramente: “(Bento XVI) já havia completado praticamente uma primeira redação desta carta encíclica sobre a fé. Agradeço-lhe de coração por isto e, na fraternidade de Cristo, assumo seu precioso trabalho, acrescentando ao texto algumas contribuições”. Concretamente, as primeiras nove páginas da introdução e, talvez, a oração conclusiva a Maria.

Além disso, está clara a autoria do Papa Ratzinger. Em seu estilo, em suas profundas ancoragens teológicas e até nos autores citados. De Santo Agostinho até Santo Tomás, passando por Dostoievski, Martin Buber, o rabino Di Kock ou Wittgenstein.

Na introdução, Francisco delimita e apresenta o objetivo da encíclica: responder à velha objeção de que “a fé já não serve para os tempos atuais, para o homem adulto, que se jacta de sua razão, ávido por explorar o futuro de uma nova forma”. É a clássica e temida objeção de Nietzsche, que considera a fé uma miragem contrária à verdade. Algo obscuro e de outra época.

“A grande luz”

Por isso, a encíclica está pensada para demonstrar que a fé é e continua sendo “uma grande luz, de uma grande verdade” e “com capacidade para iluminar toda a existência humana”. Ou, com as palavras de Dante: “Faísca, / que se converte em chama cada vez mais ardente / e cintila em mim, qual estrela no céu”.

Uma vez delimitado o objetivo, o Papa pároco e pastor passa a batuta e a pena ao Papa teólogo e brilhante intelectual, que traça uma de suas lições teológicas magistrais de costume. Talvez, desta vez, inclusive fazendo um esforço maior de divulgação e adocicando suas propostas em chave de amor. A fé à luz do amor ou a partir do amor, a chave na qual coincidem ambos os Papas. “Deus é amor”, disse Bento em sua primeira encíclica. “Deus nos ama e nos perdoa”, repete constantemente Francisco. Amor que leva à fé e fé que se alimenta do amor.

“Acreditamos no amor”

Este é o título do primeiro capítulo, no qual o Papa emérito faz um percurso pela fé ao longo da história. Desde Abraão, Moisés, e a fé de Israel, até chegar à “plenitude da fé cristã” e da fé vivida na Igreja, que, como disse Romano Guardini, é “a portadora histórica da visão integral de Cristo sobre o mundo”. Porque a fé “não é um fato privado nem uma opinião subjetiva”.

Uma fé que, evidentemente, não é incompatível com a verdade. Ao contrário, “a fé sem verdade não salva”, é “uma bela fábula, a projeção dos nossos sonhos”. A verdade é que a cultura atual, “que perdeu a percepção da presença concreta de Deus”, trata de demonstrar todo o contrário.

Para a cultura moderna só existe “a verdade da tecnologia” e olha com suspeita “a grande verdade, que explica o conjunto da vida pessoal e social”. E, com essa verdade, a sociedade caiu nos totalitarismos do século passado e está caindo no relativismo hoje.

Igreja, sujeito único da memória

Para sair desta espiral, a encíclica propõe uma fé baseada no amor, “que transforma a pessoa por completo”. Uma fé fundamentada na razão e, portanto, “nada arrogante nem intransigente, mas humilde” e sempre em busca. Como os Reis Magos. Ou como os teólogos que a atualizam permanentemente, sem perder de vista seus limites.

Uma fé que é transmitida na memória eclesial, através do “sujeito único da memória que é a Igreja”. De geração em geração. “O rosto de Jesus chega até nós através de uma cadeia ininterrupta de testemunhas”.

Para nos ensinar a falar a linguagem da fé, a Igreja, como uma mãe, utiliza quatro elementos: a confissão da fé, os sacramentos, a oração e os mandamentos. Um decálogo que não pode ser visto como um semáforo sempre no vermelho, mas como “indicações concretas para sair do deserto do eu autorreferencial e entrar em diálogo com Deus, deixando-nos abrir por sua misericórdia para levar sua misericórdia”. Uma passagem na qual ressoam com força os ecos de Francisco e sua aposta na misericórdia e na ternura de Deus que nos precede.

A fé como “luz para a vida social”

No último capítulo, a encíclica trata de demonstrar que a fé pode beneficiar “a cidade dos homens”. Ao contrário do que se costuma dizer, “a fé não afasta do mundo”, mas “se coloca a serviço da concretização da justiça, do direito e da paz”. E, portanto, converte-se “em um bem para todos, em um bem comum”.

E o Papa, ou os Papas, enumera alguns dos frutos sociais da fé. Por exemplo, a família entendida como “união estável entre um homem e de uma mulher”, a dignidade da pessoa, o respeito à natureza (“gramática escrita por Deus”) e a aposta no perdão. Ou a força consoladora que oferece diante do sofrimento e da morte. Em definitiva, a fé como “um serviço de esperança”.

O epílogo franciscano

A encíclica termina como começou: pela mão de Francisco. Com palavras e imagens com as quais já estamos acostumados. Com uma bela oração a Maria, “mãe da nossa fé”, para lhe pedir que “nos deixemos tocar pelo amor de Deus”, para “confiarmos plenamente n’Ele”, sobretudo nos momentos de tribulação. Para que nos recorde sempre que “quem acredita nunca está sozinho” e para que nos ensine a “olhar com os olhos de Jesus”.

“Dado em Roma, junto de São Pedro, no dia 29 de junho, solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, do ano de 2013, primeiro do meu Pontificado”. Francisco (E assina à mão o Papa que reconhece não ter escrito a encíclica).

A tradução é do Cepat.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos - Notícias - Sábado, 06 de julho de 2013 - Internet: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/521703-as-chaves-da-enciclica-escrita-por-bento-e-assinada-por-francisco
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Primeiras impressões sobre a encíclica Lumen Fidei


Leonardo Boff
Teólogo e Filósofo


"A Encíclica Lumen Fidei não traz nenhuma novidade espetacular que chamasse a atenção da comunidade teológica, do conjunto dos fiéis e do grande publico. É um texto de alta teologia, rebuscado no estilo e carregado de citações bíblicas e dos Santos Padres"
Papa Bento XVI

A  Carta Encíclica Lumen Fidei vem como autoria do Papa Francisco. Mas notoriamente foi escrita  pelo Papa anterior, agora emérito, Bento XVI. Confessa-o claramente  o Papa Francisco: “assumo o seu precioso trabalho, limitando-me a acrescentar ao texto alguma nova contribuição”(n.7). E assim deveria ser, pois caso contrário não teria a nota do magistério papal. Seria apenas um texto teológico de alguém que, um dia, foi Papa.

Bento XVI queria escrever uma trilogia sobre as virtudes cardeais. Escreveu sobre a esperança e o amor. Mas faltava sobre a fé, o que fez agora com pequenos complementos do Papa Francisco.

A Encíclica não traz nenhuma novidade espetacular que chamasse a atenção da comunidade teológica, do conjunto  dos fiéis e do grande publico. É um texto de alta teologia, rebuscado no estilo e carregado de citações bíblicas e dos Santos Padres. Curiosamente cita autores da cultura ocidental como Dante, Buber, Dostoiewsky, Nietzsche, Wittgensstein, Romano Guardini e o poeta Thomas Eliot. Vê-se claramente a mão de Bento XVI, especialmente, em discussões refinadas de difícil compreensão até para os teólogos, manejando expressões gregas e hebraicas, com soe fazer um doutor e mestre.

É um texto dirigido para dentro da Igreja. Fala da luz da fé  para quem já se encontra dentro no mundo iluminado pela fé. Nesse sentido é uma reflexão intrasistêmica.        

Ademais possui uma dicção tipicamente ocidental e europeia. No texto só falam autoridades europeias. Não se toma em consideração o magistério das igrejas continentais com suas tradições, teologias, santos e testemunhos da fé. Cabe apontar esse solipsismo pois na Europa vivem apenas 24% dos católicos; o resto se encontra fora, 62% dos quais no assim chamado Terceiro e Quarto Mundo. Posso me imaginar um católico sulcoreano, ou indiano, ou angolano ou moçambicano ou mesmo um andino lendo esta Encíclica. Possivelmente todos estes entenderão muito pouco do que lá se escreve, nem se encontram espelhados naquele tipo de argumentação.

O fio teológico que perpassa a argumentação é típico do pensamento de Joseph Ratzinger como teólogo: a preponderância do tema da verdade, diria, de forma quase obsessiva. Em nome desta verdade, se contrapõe frontalmente com a modernidade. Tem dificuldade em aceitar um dos temas mais caros do pensamento moderno: a autonomia do sujeito e o uso que faz da luz da razão. Joseph Ratzinger a vê como uma forma de substituir a luz da fé.

Não demonstra aquela atitude tão aconselhada pelo Concílio Vaticano II que seria: nos confrontos com as tendências culturais, filosóficas e ideológicas contemporâneas, cabe primeiramente identificar a pepitas de verdade que nelas existem e a partir dai organizar o diálogo, a crítica e a complementariedade. Seria blasfemar contra o Espírito Santo imaginar que os modernos somente pensaram falsidades e inverdades.

Para Ratzinger o próprio amor vem submetido à verdade, sem a qual não superaria o isolamento do “eu” (n.27). Contudo sabemos que o amor tem a suas próprias razões e obedece a outra lógica, diversa sem ser contrária, àquela da verdade. O amor pode não ver claramente, mas vê com mais profundidade a realidade. Já Agostinho na esteira de Platão dizia que só compreendemos verdadeiramente o que amamos. Para Ratzinger, o “amor é a experiência da verdade” (n.27) e “sem a verdade a fé não salva”(n.24).

Esta afirmação é problemática em termos teológicos pois toda a Tradição, especialmente, os Concílios tem afirmado que somente salva “aquela verdade, informada pela caridade” (fides caritate informata). Sem o amor a verdade é insuficiente para alcançar a salvação. Numa linguagem pedestre diria: o que salva não são prédicas verdadeiras mas práticas efetivas.

Todo documento do Magistério é feito por muitas mãos, tentando contemplar as várias tendências teológicas aceitáveis. No final o Papa confere o seu jeito e lhe dá o aval. Isso vale também para este documento. Na sua parte final, provavelmente, pela mão do Papa Francisco, nota-se uma notável abertura que se compagina mal com as partes anteriores, fortemente doutrinárias. Nelas se afirma  enfaticamente que a luz da fé ilumina todas as dimensões da vida humana. Na parte final a atitude é mais modesta: "A fé não é luz que dissipa todas as nossas trevas, mas é uma lâmpada que guia nossos passos na noite e isto basta para o caminho" (n.57). Com exatidão teológica se sustenta que “a profissão de fé não é prestar assentimento a um conjunto de verdades abstratas mas fazer a vida entrar em comunhão plena com o Deus vivo” (45).

A parte mais rica, no meu entender, se encontra no n. 45 quando se explana o Credo. Ai se faz uma afirmação que desborda a teologia e tangencia a filosofia: "o fiel afirma que o centro do ser, o coração mais profundo de todas as coisas é a comunhão divina" (n.45). E completa: "o Deus-comunhão é capaz de abraçar a história do homem e introduzi-lo no seu dinamismo de comunhão" (n. 45).

Mas se constata na Encíclia uma dolorosa lacuna que lhe subtrai grande parte da relevância: não aborda as crises da fé do homem de hoje, suas dúvidas, suas perguntas que nem a fé pode responder: 
  • Onde estava Deus no tsunami que dizimou milhares de vidas ou em Fukushima? 
  • Como crer depois dos massacres de milhares de indígenas feitos por cristãos ao longo de nossa história, dos milhares de torturados e assassinados pelas ditaduras militares dos anos 70-80? 
  • Como ainda ter fé depois dos milhões de mortos nos campos nazistas de extermínio? 
A encíclica não oferece nenhum elemento para respondermos a estas angústias. Crer é sempre crer apesar de… A fé não elimina as dúvidas e as angústias de um Jesus que grita na cruz: "Pai, por que me abandonaste?" A fé tem que passar por este inferno e transformar-se em esperança de que para tudo existe um sentido, mas escondido em Deus. Quando se revelará?

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos - Notícias - Sábado, 06 de julho de 2013 - Internet: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/521721-primeiras-impressoes-sobre-a-enciclica-lumen-fidei

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