«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

China se apega à riqueza

Mario Vargas Llosa

Volto à China depois de cerca de 15 anos e constato que parece outro país. Embora tenha ouvido e lido todos os ditirambos [ a respeito do seu formidável desenvolvimento econômico, a realidade vai muito além. Em Xangai, o distrito de Pudong, há 20 anos uma planície coberta por arrozais, é uma Wall Street quatro vezes maior e com o dobro ou o triplo de arranha-céus. Tanto lá como em Pequim, a transformação urbana é portentosa: pontes, avenidas, túneis, edifícios, lojas, galerias, parques exibem modernidade e prosperidade, um efervescente dinamismo 24 horas ao dia.

Uma riqueza ostensiva, sem complexos, pavoneia-se nos shopping centers e nos hotéis luxuosíssimos, nas gigantescas vitrines que exibem roupas femininas, masculinas, bolsas, joias, relógios, calçados, automóveis, fantasias e loucuras das marcas mais afamadas do mundo.

Há restaurantes por toda parte e todos estão lotados de gente em geral bem vestida e amável, que conversa e come sem largar o celular, espiando de vez em quando ao seu redor, por cima de óculos marca Ray Ban, Ferragamo, Gucci ou Lanvin.

Parece que, desde que Deng Xiaoping lançou o lema "Enriquecer é glorioso!", 1,4 bilhão de chineses começaram a produzir e a ganhar dinheiro de maneira frenética. Será que esse é mesmo um país marxista-leninista?

Seguramente é, mais do que nunca, segundo o Partido Comunista, que comemora seu 90.º aniversário de maneira colossal, com homenagens incessantes a Mao Tsé-tung. E, embora com suas delirantes políticas o líder tenha mergulhado a China em miséria atroz e sacrificado milhões de pobres, o país vive agora uma etapa de abundância graças às reformas e à política "socialista" de mercado que a transformaram na segunda potência depois dos EUA.

Num futuro próximo, a China desembocará na sociedade perfeita, onde reinará a justiça distributiva e todos receberão o que pedem, segundo as próprias necessidades, e então a utopia coletivista igualitária se tornará realidade.

Por enquanto, a sociedade chinesa é a mais desigual do mundo, porque as diferenças entre os que têm mais e os que têm menos superam as de qualquer outro país, embora, provavelmente, a China seja o único em que, por decisão do próprio Comitê Central, o Partido Comunista aceita agora entre sua militância até bilionários.

Se vocês detectarem contradições e mistérios ideológicos, leiam o interessante livro de Eugenio Bregolat, La segunda revolución china, no qual o experiente diplomata espanhol e profundo conhecedor do país, onde viveu muitos anos, explica com fartura de detalhes e divertidos episódios, a extraordinária conversão econômica da China realizada em meio a tropeços, intrigas, retrocessos e tanto derrotas quanto vitórias, por Deng Xiaoping.

Esse antigo companheiro e adversário de Mao, sintetizando seu objetivo com outra de suas famosas frases - "Tanto faz o gato ser branco ou preto, o que importa é que pegue os ratos" - foi quem transformou a paupérrima ditadura totalitária, coletivista e estatista erigida por Mao na sociedade capitalista autoritária que tirou da miséria 800 milhões de camponeses e desencadeou crescimento e desenvolvimento vertiginosos, sem precedentes na história.

Bregolat explica que essa insólita variante do socialismo concebida por Deng e seus seguidores, agora no poder, seria incompreensível se não estivesse relacionada à tradição cultural e filosófica chinesa do confucionismo e aos 4 mil anos de história de um país invadido, ocupado e humilhado pelo Ocidente e, finalmente, resgatado pela prosperidade e pela modernização atuais, recuperando o orgulho de si mesmo.

A ideologia socialista é agora uma retórica usada para justificar o monopólio do poder político pelo Partido Comunista. A ideologia real que lançou profundas raízes no país é o nacionalismo. Bregolat está otimista e acredita que o notável progresso econômico levará, mais cedo ou mais tarde, à abertura política, porque as novas classes médias e profissionais, que crescem a cada dia, educam seus filhos no exterior e mantêm um intenso intercâmbio com o mundo mediante as novas tecnologias, exigem cada vez mais a democratização, que se completará de maneira pacífica.

Espero que ele tenha razão e quem não compartilhe totalmente de seu otimismo, como eu, esteja equivocado. Meu pessimismo deve-se ao fato de que, além do nacionalismo, o que aparentemente se tornou uma segunda natureza para boa parte da sociedade chinesa é um materialismo consumista, em que a concentração obsessiva da ação humana na criação de riquezas embota a vida espiritual e intelectual e empobrece o idealismo, a solidariedade e a generosidade.

Embora, por razões óbvias, nas minhas conversas com intelectuais, acadêmicos e escritores chineses, eu tenha sido prudente, me abstendo de perguntas impertinentes, ouvi de muitos deles queixas sobre pouco ou nenhum interesse que os jovens demonstram - principalmente os de melhor formação - pela vida cívica, a cultura e, em geral, por tudo o que seja desinteressado e espiritual, como filosofia, arte ou religião. Todos parecem obcecados por uma boa formação técnica e profissional que lhes abra as portas das grandes transnacionais e seus salários fabulosos ou para postos administrativos no país, agora magnificamente remunerados.

Outra das célebres frases de Deng foi: "Se abrirmos a janela junto ao ar fresco, entrarão as moscas." Imagino que ele a tenha pronunciado na primavera de 1989, pouco antes de dar a ordem para o Exército pôr fim às manifestações dos estudantes na Praça da Paz Celestial, provocando a morte de algumas centenas de jovens. A frase resume a filosofia adotada pelo regime. Sim à abertura econômica e social, mas desde que não se questione o controle absoluto exercido sobre a vida política pelo Partido Comunista.

Os que o aceitam podem ter uma margem bastante ampla de liberdade pessoal, viajar para o exterior, usar a internet. E, se forem escritores ou professores, podem conseguir publicações "capitalistas", desde que elas não critiquem a política chinesa. No entanto, não há tolerância pela dissidência. Liu Xiaobo, Ai Weiwei e outros são assediados, vigiados e, quando suas ações têm repercussão no exterior, presos, julgados e sentenciados a penas variáveis.

Ao contrário do que já ocorreu, há poucos fuzilamentos e, geralmente, eles ocorrem por crimes econômicos. Agora, a dissidência leva à prisão, não ao paredão, e, às vezes, somente ao cárcere domiciliar.

A censura moral existe sempre, porém, é mais branda, e, em bancas de jornal, ruas e livrarias, às vezes, é possível descobrir publicações eróticas. Perguntei ao meu editor e a meus tradutores se meus livros foram censurados. Enfaticamente, me asseguraram que não.

O desenvolvimento chinês seria possível com liberdade? Bregolat duvida. Eu quero crer que sim. Por que motivo na China não poderia ocorrer o que já ocorreu nos EUA, na Grã-Bretanha, na França, e agora na Índia, no Brasil e em tantas outras democracias?

TRADUÇÃO ANNA CAPOVILLA.

Fonte: O Estado de S. Paulo - Internacional - Domingo, 3 de julho de 2011 - Pg. A17 - Internet: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110703/not_imp740032,0.php

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