LEGADO DA COPA: VAI SER BOM, NÃO FOI?
Marcelo
Sakate e Bianca Alvarenga
Os
gastos dos turistas e da festa dos torcedores favorecem o comércio, mas o
legado para a economia não passará de um bem-estar efêmero e com data para
terminar
Edição brasileira publicada pela editora: Tinta Negra (2010, 312 p.) |
Na
defesa da realização da Copa do Mundo no Brasil em cadeia nacional de
televisão, há duas semanas, a presidente
Dilma enfatizou o ganho econômico: “A
Copa gera negócios, injeta bilhões de reais na economia, cria empregos”. A
experiência de outros países demonstra que sediar grandes eventos esportivos,
como a Copa e a Olimpíada, não é, em si, garantia de ganhos econômicos
duradouros. Diz o polonês Stefan
Szymanski, professor de gestão do esporte da Universidade de Michigan, nos
Estados Unidos, e coautor do livro cujo título é uma combinação em inglês de
futebol (soccer) e economia (economics), Soccernomics: “Os
brasileiros não devem esperar um legado significativo. Em geral, projetos
relacionados à Copa não produzem impactos relevantes e duradouros”.
Szymanski
dá como exemplo o aumento de turistas estrangeiros no Brasil, cujos gastos não
vão chegar a se equiparar às despesas para atraí-los. Com a construção e a reforma
de estádios, o governo brasileiro gastou cerca de 8 bilhões de reais. Os brasileiros e os 600 000 estrangeiros
devem desembolsar aqui nas quatro semanas da Copa perto de 6,7 bilhões de reais.
Nada muito expressivo em relação ao PIB [Produto Interno Bruto = a soma de tudo
aquilo que o país produz] anual brasileiro, de 5 trihões de reais. Empurrado
pelas compras dos estrangeiros em visita ao Brasil, o consumo em bares e
restaurantes neste mês e em julho deve aumentar em 3 bilhões de reais, o
equivalente a 25% em relação ao mesmo período do ano passado. Adicionalmente,
mais de 3 milhões de brasileiros vão viajar entre as cidades-sede, movimentação
que também favorece o aumento do consumo.
No
entanto, como alerta Szymanski, esses números vão acabar confirmando que existe
uma tendência de superestimar as projeções. Diz o estudioso polonês: “O que mais vi em eventos anteriores em
outros países foram pesquisas com exageros, bancadas por governos e setores
interessados, como a indústria da construção civil ou do turismo”.
Os
efeitos da Copa 2014 sobre a aviação comercial brasileira dão razão a
Szymanski. A oferta de assentos
realmente aumentou 10% nas rotas aéreas entre as doze cidades-sede do Mundial,
mas diminuiu nos demais destinos. A explicação vem do fato de que a Copa
esfriou a demanda proveniente das viagens a negócios e de participação em
grades feiras, a maioria antecipada ou adiada para depois do apito final na
decisão de domingo, dia 13 de julho, no Maracanã.
O
impacto da Copa sobre a indústria brasileira é francamente negativo. A
combinação das pardas nas fábricas durante os jogos da seleção brasileira com a
queda nos pedidos explica a decisão de muitos empresários industriais de
conceder férias coletivas. Mas não sejamos tão duros, avaliando a Copa apenas
por seus efeitos contábeis. Szymanski concorda: “As pessoas amam ver a Copa do
Mundo em seu próprio país, e essa sensação de bem-estar compensa”.
O EFEITO COPA –
RESUMINDO
TURISMO
O
turismo deverá atrair 6,7 bilhões de reais para a economia – um incentivo
bem-vindo, mas modesto para um PIB total superior a 5 trilhões de reais.
Mais de
3 milhões de brasileiros e 600 000 estrangeiros circularão pelas
cidades-sede. Cada turista do exterior deve gastar, em média, 4 150 reais, e o brasileiro, 1 355 reais. Nos primeiros quatro dias
de Copa, os estrangeiros gastaram 27
milhões de dólares em compras com cartão de crédito.
EMPREGOS
Estima-se
que se criarão 175 000 vagas formais
temporárias. No setor de hospedagem e alimentação serão 37 000 postos, dos quais até 15%
podem ser efetivados, especialmente no Nordeste.
BARES E
RESTAURANTES
O
faturamento em junho e julho deve aumentar 25%
em relação ao mesmo período de 2013, totalizando 12 bilhões de reais. Nos dias de jogo do Brasil, a expectativa é
que haja um crescimento de 70% da
receita com as vendas.
INDÚSTRIA
Um terço
das fabricantes de equipamentos eletrônicos e eletrodomésticos vai parar
durante a Copa. Algumas montadoras de carros também programaram férias
coletivas. A produção industrial deverá cair nesse período.
MICROS E PEQUENAS
EMPRESAS
Segundo
o Sebrae [Serviço Brasileiro de
Apoio às Pequenas e Médias Empresas], desde 2011, já se acertaram contratos no
valor de 380 milhões de reais, com a
prestação de serviços e o fornecimento de produtos a empresas maiores nas áreas
de turismo, varejo, construção civil e vestuário, entre outras. A estimativa é
que o montante alcance 500 milhões de
reais até o fim da Copa.
AVIAÇÃO
As
companhias ampliaram em 10% (645 000
assentos) a capacidade entre as doze cidades-sede. Mas a expectativa é que
não haja um aumento expressivo no faturamento, por causa da queda no turismo de
negócios.
Stefan Szymanski - economista polonês radicado nos Estados Unidos |
ENTREVISTA – Stefan
Szymanski
O polonês Stefan Szymanski é coautor do
livro Soccernomics e avaliou
o impacto econômico em países que organizaram Copa do Mundo e Olimpíada. A
conclusão: a economia pouco ganha.
Que legado os brasileiros devem
esperar da Copa do Mundo?
Stefan Szymanski: Não
muito grande. A Copa e a Olimpíada falham em criar efeitos econômicos
relevantes. Os investimentos na construção de estádios, por exemplo, são
modestos em relação ao total do orçamento de um país como o Brasil.
Mas não existem estudos que estimam o retorno
financeiro de bilhões de dólares?
Stefan Szymanski: São
estudos preparados por consultorias pagas pelo governo dos países-sede ou pela
indústria da construção ou do turismo. Ou seja, por organizações que terão
ganhos com o evento. A maior parte dos estudos independentes mostra que o
retorno é pequeno.
O que pode ser feito para ampliar esse
retorno?
Stefan Szymanski: Não há
muito mais a fazer. Há um ganho para os clubes brasileiros. O público nos
campeonatos nacionais sobre de 15% a 20% nos cinco anos seguintes à disputa da
Copa. Ela pode aumentar o apelo do campeonato brasileiro no resto do mundo. Mas
não muito além disso.
Existe alguma outra forma de benefício?
Stefan Szymanski: O
futebol é o esporte mais popular do mundo. As pessoas amam a ideia de ver a
Copa em seu país. Elas desviam a atenção dos problemas do dia a dia. Mas, tão
logo os jogos acabem, os brasileiros voltarão a demonstrar a sua insatisfação
com tanto desperdício na organização [da Copa].
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