PREÇOS: Bomba-relógio

Celso Ming
Bombas sempre podem ser desarmadas. Mas ninguém sabe ainda como o próximo governo, seja ele qual for, desarmará a bomba dos preços administrados.

Nada menos que um quarto dos preços da economia está represado por decisão do governo. Entre eles, os da energia elétrica, dos combustíveis e dos transportes urbanos. O objetivo foi segurar a inflação para evitar problemas políticos, especialmente em tempos de eleição. Há entre os analistas certo consenso de que esse represamento pesa entre 1,5 e 2,0 pontos porcentuais sobre a inflação. Ou seja, não fosse essa artificialidade, a inflação medida em 12 meses estaria acima dos 7%.

É uma situação que cria insegurança e, como o Banco Central (BC) tem avisado, também cria inflação, já que os formadores de preços estão levando em conta que, cedo ou tarde, as comportas serão levantadas e produzirão vagalhões. O problema é que a expectativa do represamento também cria inflação e insegurança, porque não deixa noção antecipada sobre que tamanho de tranco enfrentará a economia a partir de quando os ajustes forem providenciados. Em termos mais técnicos, a administração das expectativas fica prejudicada pela falta de clareza no horizonte.

A presidente Dilma já sugeriu que esses preços serão realinhados por um processo prolongado, a começar, provavelmente, logo depois das eleições. Questionado sobre os atrasos no reajuste dos combustíveis, o principal candidato da oposição à Presidência da República, Aécio Neves, respondeu um tanto vagamente que mais importante do que o tamanho do ajuste é a definição de regras do jogo. Mas não adiantou quais seriam.

Maquiavel ensinou que, em política, as maldades devem ser feitas de uma vez e as bondades, aos poucos. Isso sugere que melhor seria se as correções fossem feitas numa paulada só. Doeria mais, mas ficaria a certeza de que o problema estaria resolvido. Pior é ficar esperando mais pauladas de intensidades variáveis.

Interlocutor da presidente Dilma, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo tem recomendado que, iniciado o novo mandato, ou mesmo antes, os reajustes venham de uma só vez, para não deixar serviço por fazer.

Esse raciocínio vem levando observadores a prever para 2015 uma inflação de 7% a 8%. É um cálculo difícil porque implica variáveis fora de controle, como o realinhamento das cotações do dólar, também em fase de represamento (âncora cambial), e o nível de aperto da política de juros a ser adotada.

Por ora, o BC [Banco Central] parece ter enveredado para a heterodoxia. Diz que ainda espera pelos efeitos do aperto dos juros, mas, na prática, parece ter desistido de contra-atacar a inflação, mesmo sabendo que, nos próximos meses, estará estourando o teto da meta (os tais 6,5% em 12 meses). Está mais impressionado com a desaceleração (para não dizer eventual retração) da atividade econômica.

A falta de direção clara deverá deixar o mercado financeiro descalço sobre brasas de fogueira de São João. Como está difícil prever as trajetórias da inflação, do nível dos juros e do próprio câmbio, também a formação dos preços financeiros futuros está sujeita a turbulências.


Fonte: O Estado de S. Paulo – Economia – Sábado, 14 de junho de 2014 – Pg. B2 – Internet: clique aqui.

O Brasil pior na foto entre países ricos e emergentes

Editorial Econômico


A desaceleração da economia brasileira está evidente também no exterior. O Banco Mundial prevê que o crescimento do País será de apenas 1,5%, neste ano, muito inferior à média dos países emergentes (4,8%). E, o que é pior, também inferior à média dos países desenvolvidos (1,9%) e à média global (2,8%). Afinal, a recuperação esperada para 2015/2016 será modesta, segundo a publicação Global Economic Prospects, distribuída pelo Banco Mundial.

O Banco Mundial também reduziu as projeções do PIB para o mundo, de 3,2%, em janeiro, para 2,8%, no relatório deste mês, mas a de 2015 foi mantida em 3,4%. A América Latina deverá ter uma desaceleração leve neste ano e uma melhoria gradual, em 2015 e 2016.

Mais do que uma desaceleração cíclica, analisam os especialistas do Banco Mundial, há a preocupação de que o crescimento reduzido a longo prazo "se transforme numa nova normalidade", pois a demanda de produtos básicos pela China crescerá menos e o desafio será aumentar a produtividade.

A indústria brasileira sabe perfeitamente do que se trata, pois a produtividade cresceu, entre janeiro e abril, menos do que a queda do emprego.

Neste ano, o Brasil só deverá crescer mais, na América Latina, do que Argentina, Venezuela, Jamaica e Santa Lucia - ilha do Caribe dependente da banana e do turismo. E não será muito diferente em 2015, prevê o Banco Mundial: além dos quatro que ficarão atrás do Brasil, em 2014, apenas dois serão adicionados - República Dominicana e El Salvador.

A queda de 2013 deveu-se à estabilização ou perda de valor das cotações das commodities, à desaceleração da China, ao crescimento volátil dos Estados Unidos - resultando, em conjunto, na fragilidade das exportações - e em problemas internos. No Brasil, as reformas estruturais foram interrompidas. Gargalos na energia e na infraestrutura foram agravados pelo ambiente de negócios desfavorável e a consequência foi uma perda de crescimento econômico e de produtividade.

O crescimento inexpressivo deste ano se deve "à confiança enfraquecida dos empresários, ao aperto do crédito e a outros impedimentos macroeconômicos". A inflação em alta afeta o País e outros emergentes, como a Turquia e a África do Sul.

Em resumo, não fazem sentido as repetidas declarações das autoridades brasileiras de que os problemas vêm do exterior. O Banco Mundial sugere que boa parte deles é daqui.

Fonte: O Estado de S. Paulo – Economia – Sábado, 14 de junho de 2014 – Pg. B2 – Internet: clique aqui.

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