A realidade vai se impondo
Número de casos de Covid-19 é sete vezes maior, estima primeiro
grande estudo no Brasil
Vinicius Torres Freire
Cerca de 5.650 pessoas teriam anticorpo da
doença,
indica amostra do Rio Grande do Sul
PEDRO CURI HALLAL Infectologista, reitor da Universidade Federal de Pelotas (RS) ecoordenador da pesquisa |
O primeiro estudo brasileiro do alcance da infecção pelo coronavírus indicou que o número de infectados é pelo menos sete vezes maior do que aquele registrado oficialmente.
Cerca de
0,05% da população gaúcha deve ter sido contaminada, segundo testes realizados
com uma amostra de 4.189 pessoas do Rio Grande do Sul, que tem cerca de
11,3 milhões de habitantes.
Assim, o
número de pessoas que já teria sido infectada e desenvolvido anticorpos seria
de 5.650. Nas contas do governo, que costuma testar apenas os casos mais
sintomáticos ou graves da doença, o Rio Grande do Sul teria 747 casos.
O primeiro
caso “oficial” gaúcho foi registrado no dia 9 de março, 12 dias depois do
primeiro caso brasileiro, paulista. É possível que a taxa de subnotificação
seja maior.
O projeto
de pesquisa, o Epicovid19, é coordenado pela
Universidade Federal de Pelotas (Ufpel) e pelo governo gaúcho. Pesquisadores
foram às casas sorteadas e coletaram uma amostra de sangue de um dos moradores,
entre 11 e 13 de abril.
Serão
feitas outras três rodadas de pesquisa, uma por quinzena, a fim de
registrar a evolução da doença. Na semana que vem, começa um teste nacional,
também coordenado pela Ufpel. Cerca de 33 mil pessoas serão testadas a cada
duas semanas.
“Em
resumo, para cada 1 milhão de habitantes no Rio Grande do Sul, estima-se
que existam 500 casos reais de Covid-19, apenas 66 casos notificados e
1,2 mortes”,
diz o
relatório do estudo.
Nas “nove
cidades utilizadas na pesquisa, para cada caso notificado, existem ao redor
de quatro casos não notificados”.
Mais
pessoas podem estar infectadas, além das estimadas 5.650 estimadas pelo estudo — leva
dias até o que os contaminados pelo coronavírus desenvolvam anticorpos (em
geral, 14 dias depois da contaminação).
Com esses
dados, é possível também estimar quantas infecções são assintomáticas ou
“subclínicas” e ter dados para cálculos mais precisos de letalidade
(porcentagem de mortos entre os infectados), conta o epidemiologista e reitor
da Ufpel, Pedro Hallal, coordenador do trabalho.
O estudo
foi financiado pelo Instituto Serrapilheira, pela Unimed Porto Alegre e pelo
Instituto Cultural Floresta. Os testes foram fornecidos pelo governo federal.
As cidades
estudadas foram Porto Alegre, Canoas, Pelotas, Caxias do Sul, Santa Cruz do
Sul, Santa Maria, Passo Fundo, Ijuí e Uruguaiana, onde vive cerca de 31% da
população estadual.
A pesquisa
verificou também que 20,6% dos entrevistados disseram sair de casa
diariamente; 58,3% relataram sair apenas para atividades essenciais (ir ao
supermercado, farmácia etc.) e 21,1% relataram ficar em casa o tempo todo. Entre
os idosos de 60 anos ou mais, 35,9% relataram ficar em casa o tempo todo.
Conclusão
preliminar?
“A tendência é que os números aumentem nas próximas fases,
mas a velocidade desse aumento depende das medidas de distanciamento social a
serem implementadas. Com base nas melhores evidências científicas disponíveis,
é recomendado que as medidas de distanciamento social vigentes no estado devem
ser mantidas”, diz o relatório dos pesquisadores.
Os
coordenadores do estudo lembram ainda que, “embora a margem de erro geral da
pesquisa seja baixa (0,5 ponto percentual), prevalências pequenas, como a
observada nessa primeira fase do estudo, devem ser interpretadas com cautela”.
Com dados
mais precisos a respeito do avanço da doença, é possível fazer projeções do
avanço da epidemia, descobrir quais são as regiões mais atingidas do país e
planejar as medidas de contenção da epidemia.
Com os
números do levantamento e estudos dos epidemiologistas, será possível decidir
com base em dados científicos a necessidade de isolamentos: de que tipo, onde e
até quando devem ser implementados. No fim das contas, com tais informações
será possível decidir quando os brasileiros aos poucos poderiam voltar a suas
atividades rotineiras.
Com a
estimativa do número real de infectados, de doentes evidentes e de assintomáticos,
será possível projetar ainda quantas UTIs, ventiladores e outros equipamentos
serão necessários para tratar os doentes em cada região.
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