Quinta-feira Santa da Páscoa – Homilia
Evangelho: João 13,1-15
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à representação do Evangelho:
José María Castillo
Teólogo
espanhol
Como se governa a Igreja e a
Sociedade
O relato do lava-pés não é
somente um exemplo de humildade e serviço que nos deixou Jesus. Além disso, e
muito mais que isso, é a lição mais eloquente e mais clara, que há nos
evangelhos, enquanto se refere a como se deve governar a Igreja, a
comunidade cristã e, inclusive, a convivência na sociedade.
Para compreender o que isso
representa, deve-se levar em conta que este evangelho [João] foi o último que
se redigiu. E isso foi pelo final do primeiro século. Nessa época, as «igrejas»
que havia organizado Paulo estavam a cerca de cinquenta anos funcionando. Eram
«igrejas» nas quais haviam escravos (Cl 3,22–4,1; Fm; cf. 1Pd
2,18-20; 3,9.14-17; 4,16).
E já se sabe que um dos deveres
mais frequentes dos escravos era lavar os pés de seus amos e senhores.
Consciente de que o escravo era alguém «sem capacidade de dizer “não”» (Sêneca,
De Beneficiis 3,19 [«Sobre os Benefícios»]).
Portanto, é importante notar que todo
o relato de hoje começa com a grandeza da missão que Jesus recebeu de
Deus. E o mesmo relato termina dizendo que o ser humano mais grandioso que Deus
enviou a este mundo, esse ser humano veio para dar exemplo aos humanos, não de
poder, mas de escravidão. Isto é, veio dar exemplo «de alguém que pertence a
outro, não a si mesmo» (Aristóteles, Política I,125a).
Precisamente, por isso, o que fez
Jesus naquela noite não era fácil de compreender. E, também, por isso, Pedro
resistiu com firmeza ao fato de Jesus fazer com ele o ofício de escravo.
Na primeira carta de Pedro, se diz
aos responsáveis (ou dirigentes) da Igreja que «cuidem do rebanho», «não
para arrancar dinheiro», em qualquer caso, nunca «tiranizando» aqueles que
lhes foram confiados (5,1-3). Sem dúvida, havia comunidades nas quais, já
não se cumpria a severa advertência de Jesus aos Doze de não querer jamais os
primeiros lugares, nem governar como os chefes das nações e os tiranos deste
mundo (Mc 10,42-45; Mt 20,25-28; Lc 22,24-27).
A Quinta-feira Santa, «Dia do
amor fraterno», é, acima de tudo, o dia no qual a Igreja recorda que este
mundo e esta Igreja têm de ser governados a partir da posição do que
se situa na vida como servidor e escravo dos demais.
PAPA FRANCISCO Durante celebração eucarística da Ceia do Senhor, na qual o Papa lavou os pés de doze detentos do presídio italiano de Velletri, perto de Roma. Quinta-feira Santa, 18 de abril de 2019 |
Jaldemir Vitório
Biblista
e teólogo jesuíta brasileiro
Dei-vos o exemplo
O ensinamento de Jesus não
consistia em belas teorias, racionalmente formuladas, mas sem enraizamento na
realidade. O caminho da teorização é, de certo modo, fácil. Basta alguém saber
servir-se das palavras, com inteligência e habilidade, para arrastar multidões
atrás de si. A sabedoria popular denuncia esta postura, com um dito lapidar: «Falar
é fácil. O difícil é fazer». Fazer-se mestre dos outros, sem a disposição
de pôr em prática o que se ensina, não tem valor algum. Só o exemplo instrui
e convence.
Jesus estava longe de ser um
teórico. Ele ensinava o que praticava. Suas palavras encontravam
respaldo no seu testemunho de vida. Donde a veracidade de seus
ensinamentos.
O ensinamento veiculado mediante o
gesto de lavar os pés dos discípulos não seria convenientemente verbalizável. Na
cultura da época, era impossível imaginar um rabino ajoelhado diante de seus
discípulos, para lavar-lhes os pés! O Mestre Jesus, entretanto, fez isto:
ajoelhou-se diante de cada um dos discípulos, e não titubeou em lavar-lhes os
pés poeirentos. Sem perder a dignidade, soube mostrar-lhes até onde o amor
pode chegar.
A morte de cruz, que se
consumaria em breve, foi o exemplo dos exemplos de Jesus. Do alto do
madeiro, bem que poderia ter-nos repetido: «Eu lhes dei o exemplo. Façam como
eu!»
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