Um crime contra a humanidade
Bolsonaro
aproveita a quarentena para destruir o meio ambiente
Nabil Bonduki*
Fazem parte do programa bolsonarista a
flexibilização das restrições
e o desmonte da legislação ambiental
A destruição da porção brasileira da Amazônia aumentou 64% em abril, em comparação com o mesmo mês do ano anterior, segundo dados preliminares de satélite do Inpe |
Fiscais do
Ibama iniciaram, em 4 de abril, ações no sul do Pará para prevenir o avanço da pandemia
em terras indígenas, onde estava se registrando as primeiras mortes por
Covid-19, e a destruição da floresta provocados por garimpeiros e
madeireiros ilegais.
À frente
das operações de combate aos crimes ambientais estavam Renê
Luiz de Oliveira e Hugo Ferreira Netto Loss,
da coordenação geral de fiscalização ambiental. Eles expulsaram os garimpeiros
e madeireiros e destruíram o maquinário utilizado pelos invasores nas Terras
Indígenas Araweté (do povo Araweté e indígenas isolados do Igarapé Bom Jardim),
Apyterewa (dos Parakanã) e Trincheira Bacajá (dos Kayapós e dos Xikrin), onde
vivem 1.700 indígenas.
IBAMA destrói equipamentos ilegais na Amazônia Isso é considerado "errado" pelo Ministério (da Destruição) do Meio Ambiente! |
Ser
eficiente e cumprir a lei – risco de demissão!
A
eficiência desses servidores públicos no combate ao garimpo ilegal,
desmatamento criminoso, tráfico de animais e outros crimes ambientais teve seu
preço: no dia 30 de abril, o ministro (da destruição) do Meio Ambiente,
Ricardo Salles exonerou esses servidores, que estavam apenas cumprindo sua
obrigação.
Em seguida,
em 6 de maio, o presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto 10.341/2020,
determinando que “os órgãos e as entidades públicas federais de proteção
ambiental serão coordenados pelos Comandos, alocados pelo Ministro de Estado da
Defesa, responsável pela operação. Na prática, a fiscalização ambiental em toda
a Amazônia Legal passou para o comando do exército. Outro decreto
presidencial proíbe a destruição do maquinário utilizado por garimpeiros e por
madeireiros ilegais.
Desmonte
da proteção ao meio ambiente
O caso é
apenas um, mais um exemplo do processo sistemático de desmonte da estrutura legal
e institucional construída durante 40 anos para proteger o meio ambiente no
Brasil, o que reúne a maior biodiversidade do mundo. Após 500 dias de
governo Bolsonaro, o antigo Ministério do Meio Ambiente é uma estrutura em ruínas
e pode se dizer que apenas existe para propor a flexibilização da legislação
ambiental e afrouxamento da fiscalização para permitir a exploração
econômica selvagem das áreas protegidas.
[1] Técnicos
com larga experiência em gestão ambiental foram afastados e, quando
concursados, são colocados na “geladeira”.
[2]
O Conselho Nacional do Meio Ambiente teve
sua composição alterada, com uma drástica redução da representação da sociedade
civil, mas, ainda assim, nunca mais foi convocado pelo ministro.
[3]
O Sistema Nacional do Meio Ambiente, que tem a função de articular
os três níveis de governo para ação articulada de proteção ambiental, foi
desmontado.
[4] Foram extintos
os programas de apoio à estados e municípios.
[5] O governo
recusou recursos da Noruega e da Alemanha destinados ao Fundo Amazônia,
voltado à proteção da floresta.
No ano
passado, quando os recordes de queimadas ganharam repercussão internacional e
ameaçaram o comercio exterior brasileiro, a questão da devastação das florestas
estava na ordem do dia. Mas agora, quando as atenções do país estão voltadas a
pandemia e para as crises políticas em série criadas pelo governo Bolsonaro, as
agressões ambientais tem passado desapercebidas.
Para visualizar melhor a arte, acima, clique sobre a imagem |
Crescimento
criminoso do desmatamento
Em março
de 2020, o desmatamento na Amazônia Legal cresceu 279%, em
comparação com o mesmo mês do ano passado, segundo o Sistema
de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon, que detectou 254 quilômetros
quadrados de desmatamento contra 67 quilômetros quadrados em março de 2019.
O cenário
marca o início da temporada da devastação anual da floresta: após a
derrubada e retirada da madeira de lei para o comércio ilegal, começam as
queimadas. “Quando a estação seca chegar à Amazônia, essas árvores
derrubadas vão virar combustível para queimadas. Esse foi o ingrediente
principal da temporada de fogo de 2019, uma história que pode se repetir em
2020 se nada for feito para impedir”, explica a pesquisadora Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de
Pesquisa da Amazônia.
Até mesmo lideranças
do agronegócio, como o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio
(Abag), Marcello Britto, estão denunciando
avanço do desmatamento e da grilagem neste ano.
Um
programa de morte é colocado em prática
Nada disso
surpreende. Fazia parte do programa bolsonarista:
* a
flexibilização das restrições ambientais,
* o desmonte
da legislação,
* a
exploração econômica das terras indígenas e quilombolas,
* o apoio a
atividades econômicas ligadas a crimes ambientais e
* a saída do
Acordo de Paris, implicando no abandono dos compromissos do país na mitigações
das mudanças climáticas, em especial a redução do desmatamento.
Sob uma
certa apatia da sociedade, com exceção dos movimentos ambientalistas e de
alguma resistência no Congresso, esse programa de morte está sendo colocado
em prática.
Para enfraquecer
a fiscalização das unidades de preservação, a cargo do ICMbio, o ministro Salles determinou, em 12 de maio,
a centralização da chefia de 35 unidades dos estados de Minas Gerais, Rio de
Janeiro e São Paulo. Com a medida, a sede da fiscalização ambiental, por
exemplo, da Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, passará para a Alameda
Tietê, no bairro paulistano dos Jardins. Nesse processo, 18 chefes de
unidades de preservação foram exonerados.
O desmonte
da Funai e da Fundação Palmares, responsáveis pela desmarcação das
terras indígenas e dos povos tradicionais, como os quilombolas, e a subordinação
do Serviço Florestal Brasileiro ao Ministério da Agricultura, com destruição
do Cadastro Ambiental Rural (CAR), um dos instrumentos mais importantes
para combater a grilagem de terras e promover a recuperação de áreas
devastadas, são outras iniciativas em andamento.
Charge irônica sobre declarações do Ministro do Meio Ambiente - Ricardo Salles |
A Medida
Provisória (MP) que favorece a grilagem
Já a medida provisória 910, a MP da grilagem, enviada ao
Congresso pelo governo, autoriza a titularidade de terras públicas para
invasores que devastaram a Amazônia e o cerrado. Sob a justificativa de
facilitar a necessária regularização fundiária para pequenos proprietários, a
MP abre as portas para uma ampla anistia à grilagem de terras públicas, em
especial na Amazônia, como denunciou Ministério Público Federal.
Além da
depredação do patrimônio público, o controle do desmatamento ficará seriamente
prejudicado caso a MP seja aprovada, o que precisaria correr até esta
terça-feira (19), quando perde a validade. [Felizmente
essa MP não foi votada, há outra sendo analisada em seu lugar... Mas toda
atenção é pouca!]
Para
completar a lista, mais por falta de espaço do que de assunto, despacho de
Salles, assinado em abril, anistiou e reconheceu como consolidadas as áreas de
preservação permanentes (APPs) desmatadas e ocupadas até julho de 2008, em
propriedades rurais no bioma Mata Atlântica. Margens de rios e topos de
morros devastados para a agricultura e pecuária, por exemplo, não precisariam
mais ser recuperados com vegetação nativa. Dessa forma, se consolidaria uma
devastação que já eliminou 88% da Mata Atlântica.
RICARDO SALLES Ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro |
O Ministro
(Destruidor) do Meio Ambiente
As
atividades econômicas relacionadas com crimes ambientais sempre foram
defendidas por Bolsonaro. Aproveitando a grave crise sanitária que afeta e
distrai do país, o ministro da (destruição) do Meio Ambiente, recém expulso
do Partido Novo, vem na moita fazendo o serviço sujo de seu chefe. As
consequências serão gravíssimas, para meio ambiente, para o futuro da
humanidade e para a própria recuperação econômica do país, que poderá sofrer
graves sanções econômicas por essa irresponsabilidade ambiental.
* Nabil
Bonduki é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP,
foi relator do Plano Diretor e Secretário de Cultura de São Paulo.
Comentários
Postar um comentário