Um crime contra a humanidade

Bolsonaro aproveita a quarentena para destruir o meio ambiente

Nabil Bonduki*

Fazem parte do programa bolsonarista a flexibilização das restrições
e o desmonte da legislação ambiental
Amazônia e desmatamento 2020: quase o dobro de 2019 - Mar Sem Fim
A destruição da porção brasileira da Amazônia aumentou 64% em abril,
em comparação com o mesmo mês do ano anterior,
segundo dados preliminares de satélite do Inpe

Fiscais do Ibama iniciaram, em 4 de abril, ações no sul do Pará para prevenir o avanço da pandemia em terras indígenas, onde estava se registrando as primeiras mortes por Covid-19, e a destruição da floresta provocados por garimpeiros e madeireiros ilegais.

À frente das operações de combate aos crimes ambientais estavam Renê Luiz de Oliveira e Hugo Ferreira Netto Loss, da coordenação geral de fiscalização ambiental. Eles expulsaram os garimpeiros e madeireiros e destruíram o maquinário utilizado pelos invasores nas Terras Indígenas Araweté (do povo Araweté e indígenas isolados do Igarapé Bom Jardim), Apyterewa (dos Parakanã) e Trincheira Bacajá (dos Kayapós e dos Xikrin), onde vivem 1.700 indígenas.
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IBAMA destrói equipamentos ilegais na Amazônia
Isso é considerado "errado" pelo Ministério (da Destruição) do Meio Ambiente!

Ser eficiente e cumprir a lei – risco de demissão!

A eficiência desses servidores públicos no combate ao garimpo ilegal, desmatamento criminoso, tráfico de animais e outros crimes ambientais teve seu preço: no dia 30 de abril, o ministro (da destruição) do Meio Ambiente, Ricardo Salles exonerou esses servidores, que estavam apenas cumprindo sua obrigação.

Em seguida, em 6 de maio, o presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto 10.341/2020, determinando que “os órgãos e as entidades públicas federais de proteção ambiental serão coordenados pelos Comandos, alocados pelo Ministro de Estado da Defesa, responsável pela operação. Na prática, a fiscalização ambiental em toda a Amazônia Legal passou para o comando do exército. Outro decreto presidencial proíbe a destruição do maquinário utilizado por garimpeiros e por madeireiros ilegais.

Desmonte da proteção ao meio ambiente

O caso é apenas um, mais um exemplo do processo sistemático de desmonte da estrutura legal e institucional construída durante 40 anos para proteger o meio ambiente no Brasil, o que reúne a maior biodiversidade do mundo. Após 500 dias de governo Bolsonaro, o antigo Ministério do Meio Ambiente é uma estrutura em ruínas e pode se dizer que apenas existe para propor a flexibilização da legislação ambiental e afrouxamento da fiscalização para permitir a exploração econômica selvagem das áreas protegidas.

[1] Técnicos com larga experiência em gestão ambiental foram afastados e, quando concursados, são colocados na “geladeira”.

[2] O Conselho Nacional do Meio Ambiente teve sua composição alterada, com uma drástica redução da representação da sociedade civil, mas, ainda assim, nunca mais foi convocado pelo ministro.

[3] O Sistema Nacional do Meio Ambiente, que tem a função de articular os três níveis de governo para ação articulada de proteção ambiental, foi desmontado.

[4] Foram extintos os programas de apoio à estados e municípios.

[5] O governo recusou recursos da Noruega e da Alemanha destinados ao Fundo Amazônia, voltado à proteção da floresta.

No ano passado, quando os recordes de queimadas ganharam repercussão internacional e ameaçaram o comercio exterior brasileiro, a questão da devastação das florestas estava na ordem do dia. Mas agora, quando as atenções do país estão voltadas a pandemia e para as crises políticas em série criadas pelo governo Bolsonaro, as agressões ambientais tem passado desapercebidas.
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Crescimento criminoso do desmatamento

Em março de 2020, o desmatamento na Amazônia Legal cresceu 279%, em comparação com o mesmo mês do ano passado, segundo o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon, que detectou 254 quilômetros quadrados de desmatamento contra 67 quilômetros quadrados em março de 2019.

O cenário marca o início da temporada da devastação anual da floresta: após a derrubada e retirada da madeira de lei para o comércio ilegal, começam as queimadas. “Quando a estação seca chegar à Amazônia, essas árvores derrubadas vão virar combustível para queimadas. Esse foi o ingrediente principal da temporada de fogo de 2019, uma história que pode se repetir em 2020 se nada for feito para impedir”, explica a pesquisadora Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa da Amazônia.

Até mesmo lideranças do agronegócio, como o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Marcello Britto, estão denunciando avanço do desmatamento e da grilagem neste ano.

Um programa de morte é colocado em prática

Nada disso surpreende. Fazia parte do programa bolsonarista:
* a flexibilização das restrições ambientais,
* o desmonte da legislação,
* a exploração econômica das terras indígenas e quilombolas,
* o apoio a atividades econômicas ligadas a crimes ambientais e
* a saída do Acordo de Paris, implicando no abandono dos compromissos do país na mitigações das mudanças climáticas, em especial a redução do desmatamento.

Sob uma certa apatia da sociedade, com exceção dos movimentos ambientalistas e de alguma resistência no Congresso, esse programa de morte está sendo colocado em prática.

Para enfraquecer a fiscalização das unidades de preservação, a cargo do ICMbio, o ministro Salles determinou, em 12 de maio, a centralização da chefia de 35 unidades dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Com a medida, a sede da fiscalização ambiental, por exemplo, da Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, passará para a Alameda Tietê, no bairro paulistano dos Jardins. Nesse processo, 18 chefes de unidades de preservação foram exonerados.

O desmonte da Funai e da Fundação Palmares, responsáveis pela desmarcação das terras indígenas e dos povos tradicionais, como os quilombolas, e a subordinação do Serviço Florestal Brasileiro ao Ministério da Agricultura, com destruição do Cadastro Ambiental Rural (CAR), um dos instrumentos mais importantes para combater a grilagem de terras e promover a recuperação de áreas devastadas, são outras iniciativas em andamento.
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A Medida Provisória (MP) que favorece a grilagem

Já a medida provisória 910, a MP da grilagem, enviada ao Congresso pelo governo, autoriza a titularidade de terras públicas para invasores que devastaram a Amazônia e o cerrado. Sob a justificativa de facilitar a necessária regularização fundiária para pequenos proprietários, a MP abre as portas para uma ampla anistia à grilagem de terras públicas, em especial na Amazônia, como denunciou Ministério Público Federal.

Além da depredação do patrimônio público, o controle do desmatamento ficará seriamente prejudicado caso a MP seja aprovada, o que precisaria correr até esta terça-feira (19), quando perde a validade. [Felizmente essa MP não foi votada, há outra sendo analisada em seu lugar... Mas toda atenção é pouca!]

Para completar a lista, mais por falta de espaço do que de assunto, despacho de Salles, assinado em abril, anistiou e reconheceu como consolidadas as áreas de preservação permanentes (APPs) desmatadas e ocupadas até julho de 2008, em propriedades rurais no bioma Mata Atlântica. Margens de rios e topos de morros devastados para a agricultura e pecuária, por exemplo, não precisariam mais ser recuperados com vegetação nativa. Dessa forma, se consolidaria uma devastação que já eliminou 88% da Mata Atlântica.
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RICARDO SALLES
Ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro

O Ministro (Destruidor) do Meio Ambiente

As atividades econômicas relacionadas com crimes ambientais sempre foram defendidas por Bolsonaro. Aproveitando a grave crise sanitária que afeta e distrai do país, o ministro da (destruição) do Meio Ambiente, recém expulso do Partido Novo, vem na moita fazendo o serviço sujo de seu chefe. As consequências serão gravíssimas, para meio ambiente, para o futuro da humanidade e para a própria recuperação econômica do país, que poderá sofrer graves sanções econômicas por essa irresponsabilidade ambiental.

* Nabil Bonduki é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, foi relator do Plano Diretor e Secretário de Cultura de São Paulo.

Fonte: Folha de S. Paulo – Colunas e Blogs – Segunda-feira, 18 de maio de 2020 – Publicado às 09h54 (Horário de Brasília – DF) – Internet: clique aqui.

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