Carta Aberta – leia!
Governadores
e prefeitos do país,
ouçam
a ciência e mobilizem
os
cidadãos de bem
Miguel Srougi*
Construam um movimento piedoso que agora
salvará as pessoas,
depois resgataremos a vida da nação
DR. MIGUEL SROUGI |
Peço
desculpas por me dirigir diretamente a vocês, mas a outra opção, que se destaca
pelas estultices e pelo desprezo humano inabaláveis, não conseguiria
compreender o texto, elaborado para discutir a pandemia que está arruinando o
Brasil.
De maneira
previsível, países como a China, Coreia do Sul, Taiwan, Austrália, Japão e
Alemanha, dirigidos por líderes competentes, habitados por povos
disciplinados e dotados de infraestrutura decente de proteção à vida,
conseguiram atenuar ou evitar os efeitos nefastos do novo coronavírus sobre
seus habitantes. Analisando as estratégias implementadas por essas nações,
compreendi os motivos do sucesso obtido.
Motivos
para o isolamento social não dar certo
Sabe-se que
o isolamento social, recomendado universalmente no combate às pandemias,
retarda a disseminação do vírus pela população, permitindo melhorar a
assistência médica aos casos graves.
Contudo,
essa ação se acompanha de uma explosão da doença quando:
* a adesão da
população é parcial,
* quando o
isolamento é interrompido precocemente ou
* quando o
vírus é reintroduzido na comunidade pelo trânsito de indivíduos contaminados.
Ademais,
dados epidemiológicos indicam que em cerca de 40% dos casos, a transmissão
do novo coronavírus ocorre alguns dias antes de surgirem os sintomas clínicos
no doador, o que amplia a sua disseminação na comunidade pelos pacientes
ainda assintomáticos.
População não respeita a quarentena, o isolamento voluntário |
O
que deu certo no enfrentamento da Covid-19
Apoiadas
nessas observações, as nações que obtiveram êxito no controle da Covid-19
desenvolveram:
* programas
bem elaborados de comunicação para apoiar a população,
* decretaram
precocemente o isolamento social radical (“lockdown”),
* impediram
o abandono do confinamento com a ajuda de aplicativos de localização e
* decretaram
o bloqueio das fronteiras das cidades ou país, para evitar a reentrada
do vírus.
* Paralelamente,
promoveram ações conjuntas entre instituições governamentais e a comunidade
para ofertar grande quantidade de insumos de suporte à vida aos mais
necessitados.
A eles eram
fornecidos ajuda financeira, alimentos, produtos de higiene pessoal e
instrumentos de lazer, minimizando o forte agravo físico, psicossocial e
econômico, imposto pelo confinamento compulsório.
Para obter
um controle mais efetivo da pandemia, as autoridades recorreram a programas
de aplicativos que permitiam o rastreamento, a rápida comunicação e o
isolamento de todos os contatos estabelecidos pelos pacientes infectados, nos
dias que precederam as manifestações clínicas.
Além disso,
testes diagnósticos foram realizados seguidamente em um grande número de
pessoas, de modo a monitorar a evolução da pandemia e programar a saída
planejada do isolamento.
Homem é submetido a exame da Covid-19 em laboratório na França Foto: AFP |
Os
motivos da catástrofe brasileira
Revendo
essas estratégias, confesso que fui tomado por um certo incômodo. Seria
possível mitigar a catástrofe emergente no Brasil, país esfrangalhado pela
desigualdade, com uma rede sanitária arruinada e, pior, dirigido
por um presidente mais preocupado em salvar a família do que proteger os filhos
da nação?
Nem tentei
responder, logo me lembrei das imagens impiedosas que hoje desfilam nas nossas
telinhas, expondo o sofrimento do povo brasileiro na sua forma mais cruel, a
mistura do pavor pelo ataque temido, a dor pelas perdas extemporâneas e a
impossibilidade de poder expressar indignação.
O incômodo
piorou quando também me lembrei de dados oficiais recentes: o número de
mortos pela Covid-19 é até 50 vezes maior em alguns bairros pobres de São Paulo,
onde pacientes amontoados, despencam nas portas impenetráveis dos hospitais
públicos.
Por isso, estimados
governadores e prefeitos do Brasil, ouçam a ciência e os especialistas, adotem
as medidas racionais, impopulares ou não, e mobilizem os cidadãos de bem
para oferecer um manto de proteção aos mais desfavorecidos.
Construam
um movimento piedoso que agora salvará as pessoas, depois resgataremos a vida
da nação.
Mais ainda,
ignorem e denunciem as indecências desse presidente e seu entorno
destrambelhado, que não compreendem seu compromisso com os brasileiros, não
reconhecem a dignidade da existência humana e, de maneira tenebrosa, estão
corrompendo os valores maiores da nação brasileira.
Lembrando-se
da advertência feita por Albert Einstein:
“O mundo é um lugar perigoso para se viver
não por causa daqueles que fazem o mal,
mas por causa daqueles que observam e deixam o mal
acontecer”.
* Miguel
Srougi é professor titular de Urologia da Faculdade de Medicina da
USP, pós-graduado em urologia pela Universidade Harvard e presidente do
conselho do Instituto “Criança é Vida”.
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