O vexame da seleção do Brasil na Copa afeta a eleição presidencial?
Sim
ROBERTO DAMATTA
ESPECIALISTA EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
Roberto DaMatta - antropólogo |
Como
sociólogo, sei que tudo está relacionado com tudo - tudo o que ocorre na vida
social, mental, na paisagem simbólica, está interligado - e não aceito o dogma
estabelecido por alguns marqueteiros e políticos segundo o qual essas coisas
não se misturam. Um ganhou, outro perdeu, há sempre muitas combinações
possíveis. E o que aconteceu ontem [terça-feira, 8 de julho] foi um suicídio do
time brasileiro, que simplesmente não jogou, e o impacto disso existirá.
O que
acho que vai ser discutido na sociedade é, em suma, tirar o futebol da ilha da fantasia. Esse processo começou antes da
Copa: vai se gastar dinheiro em estádio
ou em hospital? Faremos na educação, na segurança, o mesmo esforço que fazemos
na seleção? Cobraremos esses 7 a 1 que nos impôs a Alemanha na vida
política, cobraremos dos políticos com a mesma veemência? Parece-me inevitável
que as perguntas serão mais incisivas - mas é claro que temos de colocar isso
nas nossas pautas. Com a pior derrota da história, o futebol coloca em foco,
novamente, os outros temas. O País tem tudo
pra fazer esse deslizamento - das exigências do futebol para o jogo real.
Isso é crucial pro Brasil poder crescer.
A copa verdadeira, no mundo, é a copa da
democracia, a da igualdade, da eficiência dos serviços, que nós não temos. Então
esses 7 a 1, nesse sentido, são superbenéficos. Claro que essas cobranças têm
de ser feitas na direção certa, e há um grande peso, nessa missão, para a
mídia.
Um
exemplo é quando o David Luiz
afirma, no final, que queria muito dar essa alegria aos brasileiros. Ora, eu não quero alegria nenhuma dada por
ele! Não quero o populismo do David Luiz, quero a alegria que eu mesmo posso me dar! Que existe uma
predisposição como nunca existiu antes, pra terminar esse ciclo de futebol que
aliena, não tenha dúvida. O momento é esse.
Não
FÁTIMA PACHECO JORDÃO
SOCIÓLOGA, ESPECIALISTA EM OPINIÃO PÚBLICA E DIRETORA DA FATO, PESQUISA E JORNALISMO
Fátima Pacheco Jordão - socióloga |
Acredito
que haverá um impacto imediato e
provavelmente as pesquisas voltarão ao status de junho - pois as que vieram
depois mostravam Dilma Rousseff melhor. Como a população está hoje mais
pessimista, negativista, talvez o mau resultado da terça-feira aponte uma piora
agora. Mas a médio prazo, e às vésperas
da eleição, isso estará totalmente superado.
Já faz alguns meses que a perspectiva dos
brasileiros anda muito negativa - só que ela não se construiu agora, em
decorrência dos dramas do futebol. Percebe-se, desde o ano
passado, um desgaste muito grande porque o
eleitor mudou. Está mais exigente, não é mais o cidadão despido de uma
avaliação, seja de consumidor ou de contribuinte. Ele quer fazer valer a ideia de que paga impostos e que pode cobrar por
isso.
Esse
fenômeno não tem relação específica com resultados de futebol, vem de mais
longe e quando o eleitor usa uma
metáfora futebolística, o "Padrão Fifa", ele se refere a hospitais
que funcionem, a serviços de qualidade. Esse mal-estar pode ter qualquer
metáfora, mas tem a ver com prestação de serviço. O patamar de demanda de
mudanças na sociedade já está dado.
E mesmo que a seleção estivesse bem, e
ganhasse a Copa, isso não muda o fato de que a campanha eleitoral será
complicada - mas, por razões de outra ordem. Nada a ver com
anti-Dilma ou anti-Aécio, mas com a realidade que o brasileiro está vendo, e que
mostra tendência a piorar.
No
curto prazo, partidos de oposição vão, sim, tirar algumas casquinhas. Mas isso
não é estratégico, é tático. Estratégias para valer terão de ser mais
profundas. E o esforço que a oposição terá de fazer para articular o desejo de
mudança é o mesmo que a situação terá de fazer para justificar a continuidade.
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