Declínio do Hamas é motor do conflito
ALESSANDRO
GIANNINI
Para
especialistas, união do grupo com Autoridade Palestina foi estopim da crise
A
invasão da Faixa de Gaza pelo Exército de Israel é o ápice de uma escalada
violenta entre o governo do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu e o grupo
islâmico Hamas. As origens desse conflito, indicam analistas, estão no
distanciamento do grupo militante com o Egito após a saída da Irmandade
Muçulmana do poder e no afastamento de antigos aliados, como a Síria, o
Hezbollah e o Irã.
Enquanto
Morsi e sua Irmandade Muçulmana estavam no poder, o Hamas beneficiou-se
política e financeiramente de uma aliança quase informal com ambos. Após o
golpe de Estado que levou o ex-chefe militar Abdel-Fattah al-Sissi à
presidência, o grupo militante palestino viu secar sua principal fonte de
apoio, além de testemunhar a interrupção do fluxo de armas e outros bens pelos
túneis que ligam o Deserto do Sinai à Faixa de Gaza.
Sem
dinheiro e afastado de antigos aliados, como Bashar Assad e o Hezbollah -
envolvidos na guerra civil síria -, o Hamas foi levado a desistir do controle
exclusivo de Gaza ao se unir ao Fatah, de Mahmoud Abbas, para formar um governo
de união a fim de conduzir a Autoridade Palestina (AP).
Elliott
Abrams, ex-conselheiro de Segurança Nacional do governo George W. Bush e
especialista em Oriente Médio do Council on Foreign Relations (CFR), disse em
entrevista por telefone ao Estado, que a aliança entre o Hamas e a AP está
fadada ao fracasso.
"O
Hamas não está disposto a pagar o preço de submeter suas milícias ao controle
das forças de segurança da AP", ponderou Abrams. "E Abbas está em uma
encruzilhada, pois não tem como arcar com a folha de pagamento dos funcionários
do Hamas - cerca de 45 mil pessoas - e ainda corre o risco de perder a ajuda
que recebe dos americanos, que como os europeus consideram o grupo uma
organização terrorista.
Para
Carly Beckerman-Boys, pesquisadora visitante do Centro do Oriente Médio da
London School of Economics, a operação Limite Protetor e a invasão por terra da
Faixa de Gaza deram ao Hamas uma oportunidade de lutar, o que trouxe um
renovado sopro de vida ao grupo e levou a uma maior cobertura da mídia e apoio
popular no mundo árabe.
"Para
parar agora, o Hamas tem de garantir concessões tangíveis do governo israelense
e do Egito. Esta seria uma vitória política, se não militar, mas tão boa
quanto", escreveu ela, por e-mail.
Para saber mais sobre o que é o Hamas, sua história e seus objetivos,
acesse esta página aqui.
Fonte: O Estado de S. Paulo – Internacional –
Domingo, 20 de julho de 2014 – Pg. A16 – Internet: clique aqui.
“Consequências são perdas de vidas”
Entrevista:
Carly
Beckerman-Boys
(Pesquisadora
da London School of Economics)
Alessandro
Giannini
Carly Beckerman-Boys |
Carly Beckerman-Boys, da London School of Economics, acredita que
a escalada do conflito entre Israel e o Hamas pode trazer graves consequências
às chances de negociações e um futuro incerto para a liderança política
palestina.
Como avalia a situação do conflito
entre Israel e o Hamas, na Faixa de Gaza?
Resposta: Essa situação é uma
previsível escalada do violento conflito entre Israel e Hamas, pois os
israelenses não podem se dar ao luxo de permitir o sequestro e o assassinato de
seus cidadãos, nem o lançamento indiscriminado de foguetes sobre suas cidades,
e o Hamas não pode tolerar a prisão em massa de seus membros, nem os mortíferos
bombardeios sobre Gaza.
Alguns analistas dizem que a origem
dessa escalada está na dificuldade de o Hamas se manter financeiramente. O que
acha?
Resposta: Os problemas
financeiros do Hamas são parte da questão, mas dinheiro está longe de ser a
solução. O Hamas sofreu sérios problemas financeiros recentemente. Assim como o
recente bloqueio israelense de Gaza, o Hamas de alguma forma azedou sua relação
com o Irã por se recusar a apoiar o regime de (Bashar) Assad na Síria, o que
levou à perda de financiamento. Além disso, o governo de Al-Sissi no Egito vem
destruindo os túneis que o Hamas usa no contrabando e fechou a passagem entre o
Egito e Gaza, novamente apertando o Hamas financeiramente.
Quais as consequências desse ataque
para todos os envolvidos?
Resposta: As consequências são
perdas catastróficas de vidas, reputações internacionais arranhadas e poucas
chances de renovar tão cedo as negociações de paz entre israelenses e
palestinos. O desfecho será definitivamente um presidente Mahmoud Abbas marginalizado e, como resultado, um futuro
incerto para a liderança política palestina. (O premiê Binyamin) Netanyahu será
impulsionado temporariamente pelos ataques, mas no longo prazo, se eles se
estenderem, a guerra pode se voltar contra ele.
Em Gaza não tem uma guerra,
mas um "massacre inútil"
O
patriarca emérito de Jerusalém dos Latinos critica duramente a operação militar
israelense na Faixa de Gaza
Michel Sabbah - Patriarca Latino emérito de Jerusalém (para os católicos de rito latino) |
Começa
uma nova onda de bombardeios, destruição e morte, em Gaza, no décimo quinto dia
do início da operação militar israelense "Margem
de proteção". De acordo com o porta-voz dos serviços de salvamento
palestino, Ashraf al-Qodra, já na madrugada foram mortas sete pessoas, entre
elas, cinco membros de uma mesma família. O
número de mortos sobe para 583 palestinos e mais de 3.640 feridos.
"O
que está acontecendo em Gaza - disse à Agência
Fides Sua Beatitude Michel Sabbah,
o patriarca latino emérito de Jerusalém dos Latinos - não é uma guerra, mas sim
um massacre. Um massacre inútil, que não fará Israel avançar sequer um passo em
direção à paz e segurança". O Patriarca afirma que, em vez disso,
"com todo este sacrifício humano, os corações dos israelenses e palestinos
se encheram novamente de ódio".
As
palavras de Sabbah ecoaram, em seguida, a mensagem do Papa Francisco que disse
que “os meios para alcançar a paz só podem ser meios de paz”. "Por 60 anos - explica -, vemos que as
guerras, as armas, os massacres são incapazes de garantir qualquer tipo de
paz". Na opinião de S.B. Sabbah, "a
única maneira de sair da espiral de violência e destruição é enfrentar a
questão de fundo, ou seja, a ocupação israelense dos territórios
palestinos".
O
Patriarca não vê nenhuma possibilidade de que haja "paz e segurança",
enquanto Israel não "reconhecer a
liberdade e a soberania do Estado palestino". "Mas, talvez, para
isso - suspira S.B. Sabbah – tenhamos que esperar uma nova geração de líderes
israelenses. Os atuais líderes só acreditam na força militar. Eles têm armas
sofisticadas para matar, e não tem poder para fazer a paz".
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