Cinco formas de salvar a Faixa de Gaza
WILLIAM SALETAN
Slate
Cidade de GAZA sob ataque israelense |
Após
duas semanas de protestos e denúncias, já é hora de reconhecer que A indignação
não dará um fim à guerra em Gaza. A
maneira mais plausível de interromper esse ciclo de violência é com uma
desmilitarização internacionalmente supervisionada. Em meio a tanta morte e
destruição, isto pode parecer uma proposta absolutamente desesperada. No
entanto, a verdade é que muitas das ferramentas necessárias para isso já
existem. Eis uma análise do problema e como resolvê-lo.
1. Os habitantes de Gaza não têm um governo
para protegê-los.
Todo
dia, mais civis morrem em Gaza. Israel, o país que os está matando, concordou
com as propostas de cessar-fogo. Contudo, o Hamas, que controla Gaza (embora
muitos de seus líderes políticos nem sequer vivam ali), rejeita essas propostas
e continua a disparar foguetes sobre Israel. Pode-se argumentar que os foguetes
justificam os ataques de Israel ou que eles servem meramente de pretexto. Seja
como for, eles resultam em novas mortes de habitantes de Gaza.
A única
maneira de compreender o comportamento do Hamas
é reconhecer que seu objetivo não é
parar a matança, mas explorá-la. Isso explica por que o Hamas encorajou os
moradores locais a se postarem no alto de prédios visados e ordenou que
permanecessem em áreas onde Israel havia emitido advertências antes da invasão.
Explica também por que o Hamas insiste que Israel faça concessões em troca de
um cessar-fogo. O Hamas acha que o
cessar-fogo é um favor para Israel. Dado o desequilíbrio flagrante das
baixas, essa é uma declaração muito clara de que, para o Hamas, as mortes dos moradores de Gaza devem incomodar mais
Israel do que ao Hamas.
Essa é
apenas a mais recente exposição das prioridades deturpadas do Hamas. Outra
ilustração é seus túneis. O grupo
desviou centenas de milhares de toneladas de materiais de construção de
projetos civis para a construção de túneis. Os túneis para o Egito, cuja
finalidade principal é comercial, são rudimentares. Os túneis para Israel,
construídos para ataques militares, são elaborados. O Hamas se preocupa mais em ferir israelenses do quem em ajudar os
habitantes de Gaza.
2. A falta de um protetor em Gaza agravou o
comportamento de Israel.
Os
israelenses sabem, por experiência própria, que invadir e ocupar Gaza é
contraproducente. Durante o atual conflito, Israel sinalizou sua disposição de
parar, primeiro ao honrar unilateralmente a proposta de cessar-fogo do Egito,
depois ao adiar uma invasão terrestre. O
Hamas, porém, persistiu na ação, desafiando Israel a prosseguir.
Israel insensatamente aceitou o desafio. Sua
missão se ampliou do bombardeio de lançadores de foguetes à destruição dos
túneis. Previsivelmente, o número de túneis cresceu. A quantidade descoberta
até agora varia de 23 a 45. Um relatório, com base em imagens infravermelhas de
satélites, diz que deve haver 60 ou mais. Agora, as lutas se estenderam a fornecedores do Hamas - na sexta-feira,
houve um ataque misterioso no Sudão - e "falcões" israelenses estão
falando em recapturar a fronteira Gaza-Egito. Há sempre uma nova missão que se
pode acrescentar para tornar Gaza "mais segura".
Solução. Pior,
Israel adotou o uso de escudos humanos pelo Hamas como desculpa para as mortes
de civis. É verdade que o Hamas usou civis com esse fim, colocando foguetes em
escolas, mesquitas e hospitais, por exemplo. No entanto, Israel distorceu esses abusos pontuais numa afirmação categórica de que
o Hamas é culpado por cada morte de civil. Esse tipo de pensamento corrompe
um Exército invasor.
Agora,
alguns ministros do governo israelense estão pedindo medidas radicais contra
Gaza, como cortar sua eletricidade. A
linha divisória entre combater o Hamas e combater Gaza está borrada.
3. Os israelenses perderam a fé numa
solução militar.
Desde a
retirada dos seus soldados da Faixa de Gaza, em 2005, mas mantendo o controle
sobre as fronteiras, a costa e o espaço aéreo de Gaza, Israel travou três
guerras na região. Por enquanto, quase
ninguém em Israel, exceto a extrema direita, acredita que a força acabará com o
Hamas ou lhe ensinará uma lição duradoura.
Os
mísseis são repostos, os túneis reconstruídos e cada combatente morto do Hamas
é substituído por pelo menos um outro. A
expressão dura de Israel para suas operações periódicas em Gaza - "aparar
a grama" - é uma confissão de que a força não funciona. Os israelenses
esperam que, depois desta guerra, voltarão a ela de novo daqui a dois anos.
A cada
nova guerra, a futilidade fica mais clara. Gaza
é tão densamente povoada que não se pode bombardeá-la sem matar civis e não se
pode enviar forças terrestres sem se atolar num tipo de guerra urbana que
significa morte para as tropas invasoras. Mais de três dezenas de soldados
israelenses já morreram na presente operação e um está desaparecido. Se o Hamas
capturar outro Gilad Shalit, ele poderá facilmente arrancar concessões que
farão a invasão parecer uma perda líquida para Israel.
4. Há um candidato óbvio para assumir o
controle de Gaza.
Sete
anos atrás, após vencer uma eleição parlamentar, o Hamas tomou o controle
militar de Gaza de Mahmoud Abbas, o presidente da Autoridade Palestina. Mas os
tempos mudaram. O regime do Hamas está
falido e é Abbas, um defensor da não violência, que tem acesso a agências e
doadores internacionais. É por isso que, em abril, o Hamas concordou em
formar um governo de unidade controlado por Abbas.
Erro. Foi aí
que o primeiro-ministro israelense, Binyamin
Netanyahu, deu um mau passo. Ele interrompeu as conversações de paz com
Abbas, denunciou a união e fez todo o possível para sabotá-la. Isso foi
estúpido, porque se alguém pode convencer o Hamas a adotar um estilo de governo
mais racional, é Abbas. Os israelenses
reclamam de Abbas, mas ele fez bastante para merecer sua confiança. Suas
forças de segurança na Cisjordânia cooperaram com Israel mesmo quando isto
enfurece os palestinos.
Abbas restauraria em Gaza um governo capaz
de proteger as pessoas. Ele já está instruindo o Hamas sobre como
responder de maneira mais inteligente ao bombardeio de Israel. O primeiro passo
seria aceitar um cessar-fogo. Ele está se reunindo com autoridades do Egito e
de outros países - que poderiam ajudar Gaza, mas que têm sido desprezadas pelo
Hamas. Aliás, Abbas está sendo tratado
internacionalmente como o supervisor adulto do Hamas. E o Hamas está
começando a escutá-lo.
5. As
peças de uma solução existem.
Netanyahu
e outros políticos israelenses estão convergindo para uma proposta de Shaul
Mofaz, o ministro israelense da Defesa, de desmilitarizar
Gaza em troca de uma ajuda de US$ 50 bilhões. Isto representa quase 30
vezes o PIB de Gaza, mas não é muito a pedir de doadores internacionais, que
poderiam encontrar um uso melhor para seu dinheiro do que pagar pela
reconstrução após outra guerra em Gaza - os danos só das duas últimas semanas
custarão US$ 3 bilhões.
Uma coalizão internacional crível teria de
supervisionar a desmilitarização. Essa é uma missão útil a se
propor aos muitos países que expressaram indignação com a carnificina em Gaza:
colocar seus soldados e seu dinheiro onde está a sua boca.
A União
Europeia reafirmou seu compromisso na terça-feira: "Todos os grupos terroristas em Gaza devem se desarmar".
O Irã, por sua vez, o principal fornecedor de armas para o
Hamas, teria de ser pressionado a recuar. Felizmente, Teerã vem tentando
reconstruir a boa vontade e está envolvido em conversações produtivas com os
Estados Unidos, às quais essa questão poderia ser acrescentada.
Israel
resistiria em ceder o controle de Gaza, mas as condições vigentes tornam mais
provável uma flexibilidade israelense. O sucesso do sistema antimísseis Domo de Ferro deu confiança ao país de
que, se foguetes começarem a sair novamente de Gaza, eles poderão suportar a
barragem sem baixas por algum tempo.
William Saletan - autor deste artigo |
Acordo. A
eleição de um governo egípcio hostil ao Hamas fortalece a confiança de Israel
em que a fronteira egípcia de Gaza não
se tornará um canal fácil para a importação de armas. Os israelenses também
se queixam de que afrouxar as restrições em Gaza, após uma guerra com o Hamas,
premiaria a violência. No entanto, Israel aceitou essa troca há 20 anos, quando
concordou com o princípio de terra por paz.
O Hamas
também aceitou basicamente esse princípio. Netanyahu afirma que o Hamas, como a
Al-Qaeda, "não tem nenhuma queixa passível de solução". Isso é uma
bobagem. Na semana passada, o Hamas
emitiu uma longa lista de reivindicações, em troca das quais ofereceu a Israel
uma trégua de 10 anos. Muitas dessas demandas, como um aeroporto e o livre
fluxo de comércio pelas fronteiras e pelo mar, são perfeitamente negociáveis.
Dez
anos é um longo tempo. Se Gaza puder passar 10 anos sem uma nova guerra e
construir uma economia que se pareça mais com a da Cisjordânia, poderemos não
precisar de mais um acordo para manter a paz.
TRADUÇÃO
DE CELSO PACIORNIK.
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