«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sábado, 7 de janeiro de 2017

Do esquecimento à tragédia!

O Estado é o responsável

Editorial

O Estado perdeu o controle sobre o sistema penitenciário e
o crime organizado aproveita-se do caos para recrutar
mais “soldados” para o mundo da criminalidade
Local da chacina de detentos em Manaus - AM

A segunda tragédia em apenas cinco dias – desta vez em Boa Vista, Roraima – coloca o País, de novo chocado com a barbárie, diante da dura realidade do descontrole do sistema penitenciário e da repetição, sabe lá até quando, de episódios como esses. E também da inescapável conclusão de que se chegou a essa situação calamitosa por culpa do Estado – em todos os seus níveis –, que nas últimas décadas simplesmente abandonou esse setor da maior importância da segurança pública. É a hora de acertar a conta desse erro colossal e ela, já se viu, será pesada.

Durante rebelião que começou na madrugada de sexta-feira, na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc), 33 presos foram barbaramente assassinados – a maioria decapitada, esquartejada ou teve o coração arrancado – ao que tudo indica num ato de vingança do Primeiro Comando da Capital (PCC) contra a Família do Norte (FDN) por tratamento idêntico contra ele dado por essa organização criminosa dias atrás no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus.

Tal como já fizera no caso do Compaj, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, insiste em minimizar, não se sabe por que motivo, a importância da disputa entre essas facções criminosas nesses episódios. E na mesma direção foi o secretário de Justiça de Roraima, Uziel Castro, para quem os mortos não tinham relação com o crime organizado. “Todos (os que estavam naquela prisão) eram da mesma facção, todos eram do PCC”, disse o ministro, como se o PCC agora estivesse matando, e com tais requintes macabros, seus próprios membros. Acredite quem quiser.
Penitenciária Agrícola de Monte Cristo - Boa Vista (RR)

A essa altura, as opiniões do ministro a respeito desse aspecto da questão parecem já não contar muito. O importante é entender as causas do que se passa. Entre as causas imediatas, merece destaque a pouca ou nenhuma atenção dada pelas autoridades locais a um relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), divulgado em 2014, alertando para o perigo representado pelo que classificou de “péssimas” condições da Pamc, que tem capacidade para 750 detentos, mas abrigava 1.308.

Mas a raiz do problema – em Manaus, em Boa Vista e nos presídios de todo o País –, do qual decorre todo o resto, é o descaso com que o poder público há muito vem tratando as prisões. Superlotadas, porque não se investe – ou se investe muito pouco – na construção de novas unidades, a situação nas prisões se deteriora a cada dia. Na base do surgimento do PCC, em São Paulo, do Comando Vermelho (CV), no Rio, que se espalharam pelo País, e de grupos locais como a FDN – que hoje dominam a maioria dos presídios e controlam boa parte do tráfico de droga – estão as condições degradantes em que vivem os presos.

O poder público abandonou o sistema penitenciário, porque os governantes acham que nele investir não dá votos. Foi o que fizeram tanto os Estados, aos quais cabe cuidar das prisões, como a União, à qual cabe um papel complementar. E os prefeitos também deram sua contribuição, porque sempre reagiram com hostilidade às poucas e tímidas tentativas feitas para a construção de penitenciárias em seus municípios. Ao mesmo tempo – porque isso dá votos – todos eles buscaram aumentar o número de detenções, para dar satisfação à opinião pública, alarmada com o crescimento da criminalidade. O que seria positivo, se ao mesmo tempo construíssem novas prisões. Como não o fizeram, agravou-se tanto o problema das prisões como o da criminalidade.

Reparar esse erro acumulado em décadas não será fácil. Mas, como não se pode aceitar a continuação da barbárie e a explosão do sistema penitenciário – com os riscos previsíveis –, não há mais como fugir à necessidade de restabelecer imediatamente a ordem nas prisões, com a intervenção da polícia, e começar a investir pesadamente nelas.

O Judiciário tem também sua contribuição a dar, pois é sabido que boa parte da população carcerária é formada por presos há muito tempo sem julgamento ou com penas já cumpridas, em ambos os casos de forma irregular. A solução desse problema representaria um alívio imediato da maior importância.

Tragédia e barbárie

João Domingos

O Estado não tem um plano estratégico para o sistema prisional
ALEXANDRE DE MORAES
Ministro da Justiça mais do que falar, deveria reconhecer a inércia e irresponsabilidade dos governos estaduais
e Federal diante da crise do sistema penitenciário brasileiro e urgir um plano estratégico para o setor

A tragédia que marca o sistema prisional brasileiro define-se por si mesma: o sistema prisional brasileiro é uma tragédia.

Poderia ficar por aí como um acontecimento triste, grave, perigoso. Mas não fica. A tragédia que se abate sobre as prisões brasileiras carrega a ausência do Estado, o abandono das políticas públicas, a insensibilidade à barbárie.

A reação das autoridades brasileiras a esse tipo comum de tragédia é praticamente igual, em qualquer ocasião: anuncia-se sempre a intenção de se construir novos presídios para acabar com a superpopulação das celas. Passa-se um tempo, as celas são de novo entupidas de gente, as gentes se matam de novo e as autoridades anunciam a intenção de construir novos presídios.

O sociólogo Sérgio Adorno, do Núcleo de Estudos de Segurança Pública da Universidade de São Paulo (USP), é um estudioso do que acontece nos presídios brasileiros. Para ele, o Estado deveria ter um plano estratégico de curto, médio e longo prazos, com avaliação de cenários para a segurança pública, o sistema penal e a questão carcerária.

Nesse plano, a ser elaborado a partir do diálogo e da construção de pontes entre os mais variados setores do Estado e da sociedade, se pensaria sobre o que vai acontecer daqui a dez anos caso não seja feito nada; o que vai acontecer se forem construídas mais penitenciárias, e se de novo forem abarrotadas de condenados; o que acontecerá se houver uma política de desencarceramento pelos próximos 30 anos.

Hoje, diz Adorno, as autoridades estão sempre correndo atrás: a superpopulação dos presídios causa crises permanentes, depois vêm as mortes, a expansão da oferta de vagas e de novo a superpopulação carcerária, num círculo vicioso que não vai a lugar nenhum. Aliás, vai. Ajuda a solidificar as organizações criminosas que passaram a dominar os presídios.
SÉRGIO FRANÇA ADORNO DE ABREU
Professor e sociólogo da Universidade de São Paulo

Lembro a Sérgio Adorno que para ganhar nome, se tornar respeitadas no mundo do crime e temidas pela sociedade, as organizações que brigam pelo controle dos presídios têm de estar conscientemente envolvidas no crime. E que os líderes delas, para se tornarem lendas por onde circulam, têm de passar pelo menos uma parte da vida na cadeia.

Ele concorda. Afirma que, nos estudos que tem feito ao longo dos anos, a conclusão é de que a expansão do sistema carcerário alimenta as redes criminosas dentro dos presídios e permite o recrutamento fácil de novos membros.

Hoje, por exemplo, há uma conexão entre o que se passa nas prisões e o que se passa lá fora. Quando sai, um indivíduo controlado por uma dessas organizações será o elo entre a sociedade e a cadeia, porque ele leva e traz informações. No mundo lá fora ele é um propagador das ideias geradas dentro da cadeia para o fortalecimento das organizações e do crime.

Adorno afirma que hoje existe toda uma economia subsidiária em volta do sistema carcerário. Trata-se, segundo ele, de uma cadeia produtiva no verdadeiro sentido da palavra.

Como romper tudo isso, restabelecer a presença do Estado no interior dos presídios, evitar que o crime organizado infiltre seus integrantes no Legislativo, Executivo e Judiciário?
Para o sociólogo, se os governantes quiserem evitar que o Estado seja comprometido e se quiserem romper com a máquina viciada que tomou conta dos presídios, têm de mudar a política para o setor de segurança. Não só a relativa às drogas, mas também outras ligadas às leis penais.

Há anos, por exemplo, se fala nas penas alternativas. E hoje há uma tendência forte no Judiciário para o uso dessas penas. Mas os juízes dizem que não podem aplicá-las porque o Executivo, que deveria garantir a sua execução, não garante nada. Se forem aplicadas, o risco é o de desmoralização do próprio Judiciário.

Fonte: O Estado de S. Paulo – Notas e Informações – Sábado, 7 de janeiro de 2017 – Pág. A3 – Internet: clique aqui; Política / Colunista – Sábado, 7 de janeiro de 2017 – Pág. A5 – Internet: clique aqui.

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