«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Há algo mais profundo em risco!

As civilizações também morrem:
poucos aceitam que a próxima cultura a sumir
pode ser a ocidental

Hilário Franco Junior*

Egito faraônico, Mesopotâmia, Grécia e Roma antigas, astecas, incas e maias.
Todos lembram das culturas que sumiram, mas poucos aceitam que o
Ocidente pode estar caminhando a passos largos para isso
O Reino Unido decide deixar a União Europeia, cortando o próprio "galho" que a sustenta!

Para os contemporâneos de qualquer época é sempre difícil fazer balanços, falta a indispensável perspectiva histórica que só o tempo fornecerá. Mas a insatisfação e a inquietude do mundo ocidental são hoje bem palpáveis. Em quase todos os países a maioria da população está descontente, deseja mudanças, por isso:
* opta pelo Brexit [saída do Reino Unido da Comunidade Europeia],
* elege Trump [nos Estados Unidos],
* flerta com os extremismos [como em vários países da Europa onde partidos radicais de direita e xenófobos vem conquistando mais espaço e poder].

Ao mesmo tempo, o medo de reformas é inegável: no recente referendo italiano, dos 58% que votaram “não” à reforma constitucional, metade sequer sabia claramente o que rejeitava. Na Europa e nos Estados Unidos da América (EUA) os povos buscam um passado idealizado, na América Latina um futuro que nunca chega.

Em todo o Ocidente um grupo soi-disant [que se autoproclama] bem-pensante critica os populismos, sem reconhecer sua participação na emergência deles. Nas últimas décadas ele quis acreditar que poderia obter a inclusão social dos desfavorecidos, nacionais ou estrangeiros, por meio de decretos, patrulhamentos comportamentais e discursos agressivos e censórios, justificados por uma suposta superioridade moral. Essa doutrina do politicamente correto, autoritarismo de boas intenções, não poderia deixar, mais cedo ou mais tarde, de gerar reações na maioria silenciosa, que tem dificuldade em aceitar um multiculturalismo cujos benefícios ainda estão por provar, e que lhe é impingido com ardor por uma minoria engajada. Por não perceber isso, é que houve estupefação diante dos 59 milhões de votos de personagem tão inculto, truculento, misógino, homofóbico e racista como Trump.

A divisão ocidental é profunda, a democracia tal como a conhecemos, advertiu Obama recentemente, pode estar em vias de extinção. E de fato, a cada nova eleição ou referendo com estreita vantagem do vencedor o resultado tem sido o aprofundamento das cisões. Foi assim com a escolha de Dilma, Trump, Rajoy, os referendos do Brexit e de Renzi. No dia seguinte a este último, o editorial do La Repubblica diagnosticou um país em “clima de guerra civil sem armas”. A necessidade de rever as regras da democracia é óbvia, porém trata-se de vaca sagrada que ninguém quer tocar mesmo morrendo de fome diante dela.

A França é bom exemplo: nenhum governo consegue fazer as reformas estruturais necessárias, pois a cada decisão importante “a rua se manifesta”, alguma fração da sociedade questiona fortemente, ocorrem manifestações e contramanifestações que comprometem a harmonia social. A democracia representativa é posta em causa, porém a democracia direta defendida por alguns e que foi viável nas pequenas cidades-Estado da Grécia antiga, não o é nos Estados modernos de dezenas ou centenas de milhões de cidadãos.

Na Europa do sul, alguns partidos advogam o não pagamento da dívida externa, “imoralidade” que sufoca suas economias e o padrão de vida de seus povos, sem reconhecer a imoralidade de tomar algo e não devolver, sem admitir que os gastos eleitoreiros dos governos (isso também não é populismo?) geram a dívida. Contudo os governantes são reflexo de seus cidadãos. E estes querem mais direitos que obrigações, todos vivem mais tempo e não pretendem trabalhar mais, todos exigem serviços públicos gratuitos de qualidade e impostos baixos: que paguem hoje os credores estrangeiros e amanhã as próximas gerações nacionais.

Em toda parte o discurso predominante acusa as elites de todos os males, sem perceber que o problema é exatamente o inverso – FALTAM VERDADEIRAS ELITES, literalmente entendidas como “os melhores, os mais qualificados” de uma comunidade, de uma nação. Como carecem verdadeiros homens de Estado, cultos e corajosos, seus pobres substitutos limitam-se a aprofundar a velha política romana do “pão e circo”:

a) O PÃO, mais do que conquistado pelo bíblico “suor do rosto”, é fornecido pelo Estado sob a forma de inúmeras alocações sociais e, no futuro, se a ideia em estudo em vários países vingar, um “rendimento universal” pago desde o nascimento a todo cidadão sem necessidade de contrapartida!
b) O CIRCO é estimulado por programas de auditório, reality shows, imprensa cor-de-rosa, competições esportivas, redes sociais.

Os avanços do tempo presente não são sociais, políticos, éticos, culturais, são TECNOLÓGICOS, e várias vezes estes comprometem aqueles: qualquer indivíduo se sente em condições de opinar sobre tudo, de divulgar meias mentiras e mentiras inteiras, de recrutar terroristas, e pode fazê-lo em escala global.

Egito faraônico, Mesopotâmia, Grécia e Roma antigas, astecas, incas e maias. Todos lembram destas civilizações brilhantes que desapareceram, poucos talvez aceitem que a civilização ocidental pode estar caminhando a passos largos para isso. A trajetória é semelhante à daquelas:
* interesses de pequenos grupos sobrepostos aos do todo;
* apatia que redunda em retração cultural, demográfica e econômica;
* penetração, admitida numa fase, sujeitada noutra, de povos com outros comportamentos, valores, idiomas, religiões.

A necessidade de o Ocidente se autorreformar em profundidade é urgente, embora não se deva colocar nisso muita ilusão, como advertiu Tomás More exatos 500 anos atrás, na sua Utopia: “reconheço de boa vontade que existem na república utopiana muitas coisas que eu desejaria ver nas nossas terras, coisas que desejo, mais do que espero”.

* HILÁRIO FRANCO JÚNIOR é professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP) e autor de A Idade Média, Nascimento do Ocidente (Brasiliense).

Fonte: O Estado de S. Paulo – Suplemento ALIÁS – Domingo, 1 de janeiro de 2017 – Pág. E4 – Internet: clique aqui.

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