«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

NÃO HÁ SEGURANÇA PARA A NOVA "CLASSE MÉDIA" BRASILEIRA

Pesquisa mostra que a renda da nova classe média muda todos os meses


Alexa Salomão

Fontes de rendimento sofrem enormes variações mês a mês, fazendo com que uma mesma família oscile em questão de dias
Luciana Aguiar - Plano CDE

Um estudo detalhado sobre os ganhos e os gastos das classes C, D e E trouxe um dado novo sobre a classe C, considerada a nova classe média do País: a renda dessa parcela da população não é tão estável quanto se pensa. Na verdade, tanto o valor quanto as fontes de rendimento tendem a mudar, às vezes drasticamente, mês a mês. "Podemos dizer que a classe C é classe média quando dá", diz Luciana Aguiar, sócia diretora da Plano CDE, consultoria especializada em baixa renda, responsável pelo estudo.

A pesquisa foi feita com 120 famílias, de 64 comunidades de centro urbanos em quatro capitais – Salvador, na Bahia, Recife, em Pernambuco, São Paulo e Rio Janeiro. O estudo foi encomendado e pago pelo CGAP (sigla em inglês de Consultative Group to Assist the Poor), um organismo internacional, baseado no Banco Mundial. Como a Plano CDE realizou todo o levantamento, pode divulgar parte dos dados financeiros, aos quais o Estado teve acesso.
Diários financeiros. Por causa do número reduzido de entrevistados, a pesquisa não tem valor estatístico. O seu grande diferencial é a profundidade. Os pesquisadores tiveram acesso irrestrito à contabilidade das famílias por seis meses, o que faz com que os resultados tracem uma radiografia fidedigna dos padrões de comportamento dessa parcela da população.
"A pesquisa é baseada no que se chama de Diários Financeiros, que acompanham as fontes de receita e os gastos", diz Luciana. "É um tipo raro de acompanhamento, que permite uma investigação do orçamento familiar e de como as pessoas lidam com o dinheiro e as dívidas."
O orçamento de todas as famílias pesquisadas variou ao longo dos seis meses. Uma delas atravessou quase todas as classes. Foi pobre, vulnerável, passou três vezes pela classe C e, por fim, entrou na B.
Segundo Luciana, isso ocorre porque apenas uma parte da renda é certa – e nem sempre por causa de um emprego com carteira assinada. Aposentadoria, pensão, bolsa família, bolsa carioca e outros benefícios sociais, muitas vezes, são a única parcela fixa da renda. O restante – que não raro responde pela maior parcela do ganho – é coberto por bicos e atividades paralelas, como venda de cosméticos ou fazer salgados para fora.
Mobilidade mensal. Cristiano Ipaves Lacrose, 36 anos, de Itaquera, na zona leste da capital paulista, convive com essa flexibilidade desde que começou a ajudar o pai, aos dez anos. Microempreendedor, ganha por mês, como ele mesmo diz, "algo entre nada e R$ 5 mil".
Para garantir nem que seja um mínimo, aprendeu a fazer de tudo – serviços hidráulicos, elétricos, marcenaria, pintura. Sua mais recente atividade é ser chaveiro em domicílio. "Não dá para adivinhar quando e quanto vai entrar", diz Lacrose. "Há um ano, ganhava bem sempre, mas, desde o fim do ano passado, os clientes ficaram mais inseguros e as coisas, imprevisíveis."
Em casa, quem tem renda certa é a esposa. São R$ 900 como auxiliar de serviços. É dela a conta bancária, que garantiu o empréstimo para os documentos da moto e os dois cartões de crédito, que ele utiliza como fonte de capital de giro.
Quando Lacrose tem um bom mês, a renda familiar passa de R$ 6 mil. Pelos padrões de ganho no País, a família, com uma filha, vai ao topo da pirâmide. Encosta na classe A, alta renda. Em um mês ruim, porém, os R$ 900 da esposa os colocam no piso da classe C. Por pouco não escorrega para a D. Como a renda muda, a família Lacrose transita entre as classes C, B e A.
"Essa camada da população é mais vulnerável do que parece e precisa de apoio para se consolidar", diz Luciana. "Apenas a renda não é capaz de lhe garantir estabilidade." No longo prazo, a nova classe média precisa acumular ativos – educação, qualificação profissional, acesso ao sistema financeiro, um espaço para empreender, já que a maioria não tem trabalho formal. "A questão que se coloca é como ajudá-la nessa transição."
Fonte: O Estado de S. Paulo - Economia & Negócios - Domingo, 18 de maio de 2014 - Pg. B1 - Internet: clique aqui.

Metade das famílias de classe média vive "enforcada"


Alexa Salomão

Entre os entrevistados, 28% ganham para pagar dívidas e 22% são desorganizados; 
os mais pobres são os que se programam melhor

As classes C, D e E podem dividir a base da pirâmide, mas não lidam com questões financeiras da mesma maneira. Essa é outra constatação da pesquisa realizada pela consultoria Plano CDE. Apesar de ter mais renda, a classe média – aquela que puxou o consumo nos últimos anos – demonstra menos habilidade do que os mais pobres para lidar com as contas.

A Plano criou três perfis de relacionamento de orçamento familiar. O organizado (faz a gestão de ganhos e gastos, se priva e, quando consegue, poupa). O desorganizado (não sabe quanto ganha ou gasta e entra no vermelho regularmente). O orientado pela dívida (que destina tudo que ganha ao pagamento das contas e vive com a corda no pescoço).
Apesar de serem considerados mais arriscados pelo sistema financeiro, porque têm renda inferior, os mais pobres se mostram bem mais organizados – 71% têm controle rigoroso das finanças.
As famílias de classe média que participaram da pesquisa tiveram um comportamento bem diferente – 22% se mostraram desorganizados e 28%, orientados pelas dívidas. Ou seja: metade deste grupo teve problemas para pagar as contas.
"Não podemos expandir o dado para o Brasil e dizer que metade da classe média, que reúne 98 milhões de pessoas – incluindo os 64 milhões de classe C – estão nessa condição", diz Luciana Aguiar, sócia diretora da Plano CDE. "Mas é possível dizer que há uma forte propensão a esse comportamento."
Na avaliação de Luciana, vários fatores contribuem para colocar a classe média nessa situação, além do fato de a renda oscilar. A falta de instrumentos financeiros adequados é uma delas. A classe média hoje recorre muito, por exemplo, ao cartão de crédito. Integrantes da pesquisa tinham cinco, alguns até dez cartões, que funcionavam como cheque especial.
Essa ineficiência também foi percebida em outras pesquisas. O SPC Brasil, empresa de cadastro de crédito, identificou no final do ano passado que 47% dos inadimplentes eram da classe C e estranhou o dado. "Na nossa avaliação, esse dado mostrou que a classe C não consegue se blindar com alternativas de crédito e rolagem de dívidas, como as classes A e B", diz Luiza Rodrigues, economista do SPC.
Dívidas. Há também questões comportamentais. As famílias que participaram da pesquisa responderam a 1.107 entrevistas. Nesses momentos, muitas diziam não ter dívidas. Mas, ao olhar em detalhe o orçamento nos diários financeiros, a Plano encontrava as dívidas.
"Definitivamente a noção de dívida entre os mais pobres não é a mesma dos economistas", diz Luciana. "Para eles, dívida é o que não conseguiram pagar – se renegociou ou parcelou um bem, não é dívida. O pagamento pode estar até atrasado, mas a pessoa só considera dívida quando decide que não vai pagar mesmo."
Essa classe também ampliou sua cesta de compras. Agora paga internet, TV por assinatura, plano de saúde, colocou o filho na escola privada, comprou uma moto, mas o supermercado ainda é o item que mais pesa no orçamento – 27% dos gastos. Essa composição faz com que essas pessoas fiquem mais fragilizadas diante de oscilações da economia. "À medida que avança, a camada mais baixa permanece sentindo a alta de preços dos produtos básicos, como alimentos, mas também passa a sentir parte da inflação de serviços. E sofre com as duas", diz o economista André Braz, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas.
Nailda Santos do Nascimento, 49 anos, está com dificuldades para lidar com os novos tempos. Ela tem carteira assinada e recebe por hora para cuidar da limpeza de um condomínio. Com os descontos, são pouco mais de R$ 500 por mês. Mas a sua principal fonte de renda é a pensão como viúva – R$ 1,6 mil. Com a renda de R$ 2,1 mil sustenta três filhas, numa casa própria em Carapicuíba, região metropolitana de São Paulo.
Em meados do ano passado, quando os gastos foram ficando maiores que os ganhos, começou a usar os cinco cartões de crédito que recebeu de lojas e bancos sem pedir, mas guardara para emergências. A dívida nos cartões passa de R$ 6 mil – o triplo de sua renda. Primeiro usou para pagar prestações atrasadas da faculdade da filha, depois para despesas pessoais e, por fim, os cartões bancaram a reforma da casa, que teve a estrutura abalada por uma infiltração do imóvel vizinho.
"Nunca tive o nome sujo porque, quando vejo que não vou conseguir pagar, renegocio, mas desta vez eu acho que não vou conseguir. Estou vivendo dos cartões e não saio mais do vermelho."
Fonte: O Estado de S. Paulo - Economia & Negócios - Domingo, 18 de maio de 2014 - Pg. B4 - Internet: clique aqui.

"Sem educação financeira, armaram uma bomba relógio"


                                      Alexa Salomão

Para especialista no comportamento da base da pirâmide, 
houve expansão de crédito sem orientação ao consumidor
Celso Amâncio

Celso Amâncio entrou nas Casas Bahia em 1976 para trabalhar na finalização do crédito. A rede tinha 13 lojas em São Paulo e ele visitava a casa dos clientes que, mesmo sem comprovante de renda, recebiam crédito. Quando saiu, em 2005, era diretor da área e a rede tinha 500 lojas no País.
Graças a essa experiência, tornou-se um dos maiores especialistas em financiamento para a base da pirâmide no Brasil. Presta consultoria para lojas, bancos e financeiras. Seu nome aparece com destaque nas três páginas do livro A Riqueza na Base da Pirâmide, do indiano C.K. Prahalad, um dos primeiros especialistas em estratégia empresarial a identificar o poder de consumo das classes emergentes. "Houve uma avalanche de crédito, mas sem educação financeira. armaram uma bomba relógio", diz na entrevista que segue.
A inadimplência subiu muito, depois baixou e parece sob controle mesmo com a última alta em abril. Está tudo bem?
Celso Amâncio: Não, não está. Essa classe emergente tem hoje pelo menos cinco cartões de crédito no bolso. Se não consegue pagar um, ela passa a dívida para outro cartão e para outro, e outro. A inadimplência não aparece e ninguém tem coragem de falar isso.
Por quê?
Celso Amâncio: Formou-se uma bolha. Tanto é que várias acordos são feitos. Fizeram até feirões de negociação de dívidas, muitas vezes com perdão da dívida, com o pagamento do principal ou 50% do principal. Para chegar a essa situação, é porque o mercado ficou complicado.
As dívidas não foram quitadas. Foram sendo renegociadas e deixaram de constar como dívidas?
Celso Amâncio: Exatamente. Centenas de milhares de pessoas entraram nesses programas e estão aí para comprar novamente. Mas é preciso entender uma coisa: houve uma mudança no perfil desses tomadores de crédito. A renda das classes C e também da D e da E está comprometida com coisas com as quais eles não tinham no tempo do carnê. Estes têm despesas com celular, com TV por assinatura, com internet. E eles têm os cartões de crédito. Não estou dizendo que o cartão é um vilão. Não. O crédito é muito importante. Mas precisa vir acompanhado de educação financeira. O problema é que houve indiscriminação na oferta de crédito sem a educação. Primeiro, as lojas e financeiras disputaram cadastros - e não clientes - para criar uma massa de tomadores de empréstimo. De 2000 para cá, deram crédito por telefone. Na rua, puxavam as pessoas pelo braço na calçada. Mais recentemente, o governo incentivou o consumo. Mas crédito é uma coisa e poder de compra é outro. O banco pode me dar um crédito de R$ 150 mil. Manda uma carta para você. Eu rasgo a carta. Mas essas pessoas não tiveram educação financeira. Aprendem na prática. Errando. Devendo. Sujando o nome. Pagando taxas de juros altíssimas.
A forma de conceder o crédito não é adequado, então?
Celso Amâncio: Não. Nessas classes é preciso trabalhar com crédito familiar. Hoje, estão trabalhando com a inadimplência familiar. Porque os cartões, os nomes, as contas são compartilhados dentro das famílias. Depois que você paga um cartão com outro cartão, usando os seus cartões, você vai lá e roda com os cartões da sua esposa. A inadimplência é familiar.
Qual mecanismo identifica esse tipo de endividamento que o senhor está falando?
Celso Amâncio: Não existe. O sistema pode identificar um devedor, mas não sabe que, de arrasto, ele comprometeu a renda da família inteira atrás dele. Sem educação financeira, armaram uma bomba relógio.
Fonte: O Estado de S. Paulo - Economia - Domingo, 18 de maio de 2014 - Pg. B4 - Internet: clique aqui.

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