«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 30 de maio de 2014

“Uma Europa acabou”

Boaventura de Sousa Santos*
Outras Palavras
28-05-2014

“No domingo passado pudemos visitar as ruínas. Tiramos delas três lições enquanto as contemplamos, talvez menos calmos do que parecemos.
Comentando o resultado das eleições na Europa no último domingo. 
Boaventura de Sousa Santos - sociólogo português
A Europa que conhecíamos até ontem era a Europa virtuosa, construída politicamente com o objetivo de evitar uma terceira guerra europeia, integrando a Alemanha, sempre imprevisível, num espaço politico mais amplo. Assim se esperava consolidar as democracias europeias por via de formas intensas de cooperação e transformar a Europa num continente de promoção da paz num mundo ameaçado pela guerra fria (e por vezes quente) promovida pelos dois imperialismos, o norte- americano e soviético. Já sabíamos, por experiência dolorosa própria, que este projeto tinha colapsado. No domingo passado pudemos visitar as ruínas. Tiramos delas três lições enquanto as contemplamos, talvez menos calmos do que parecemos.

[1ª] O que vivemos foi em grande medida desolador, como é próprio das ruínas, sobretudo enquanto fumegam. O brilho dos vernizes ainda é visível nas mobílias destroçadas onde o fogo ainda não chegou. A história europeia sabe que um partido de extrema-direita pode ser eleito democraticamente para destruir a democracia. Começou assim a ascensão do nazismo. Nas eleições europeias, a extrema-direita e os ultraconservadores ganharam em França, Reino Unido, Dinamarca e ficaram em segundo na Hungria, Letônia e, em terceiro, na Áustria e na Grécia. Obviamente que estes partidos não teriam os mesmos resultados se as eleições fossem para os parlamentos dos diferentes países. E, por isso, não há, por agora, o perigo da nazificação dos países europeus. Mas há certamente o perigo da nazificação da ideia de Europa. E não pode deixar de ser salientado que o nazismo é uma herança cruel da Alemanha do século XX e que, se é verdade que a Alemanha federal soube ao longo dos anos controlar a pulsão nazi no seu país, deixou-a à solta no resto da Europa. Imagine-se o que se diria hoje de Portugal se os fascistas europeus pintassem a cruz de Cristo pelos cemitérios judaicos de toda a Europa. Em face da sua história, o modo com a Alemanha lidou com a crise europeia foi criminosa, já que ninguém como ela podia ter travado a pulsão nazi na Europa. Não o fez, e até parece lidar bem com os nazis, desde que não sejam alemães.

[2ª] A segunda lição das eleições europeias é mais animadora e está nos antípodas da primeira. A contestação desta Europa não vem apenas da direita, vem também da esquerda e tem vários matizes. Syriza na Grécia, Movimento 5 Stelle na Itália, Podemos em Espanha e Coligação Democrática Unitária (CDU) em Portugal. Nestas vitórias vibram as ideias de solidariedade, de coesão social, de democraticidade, de respeito pela soberania dos países que presidiram ao nascimento da Europa e que os diferentes países europeus adotaram como sua no pós-guerra (Portugal, Grécia e Espanha, logo que conquistaram a democracia). Ora, estas ideias começaram a ser contestadas no interior das instituições europeias antes de o serem no interior de cada país (com a exceção de Thatcher em Inglaterra) e foram exercendo uma pressão dessolidária, autoritária, hostil ao modelo social europeu sobre cada um dos países, em especial os mais vulneráveis. Primeiro, usaram o caminho da institucionalidade (euro, tratados de Maastricht, de Lisboa e de livre comércio com a China); depois, o da extra-institucionalidade (causada diretamente pela institucionalidade anterior): a crise. Esta mistificação perversa de salvar a Europa (rica) à custa dos países europeus (pobres) acaba de ser denunciada por estes partidos e é neles que reside a esperança. Por que é que o BE [Bloco de Esquerda]1, que pertence à família geral dos partidos da esperança, está fora dela? Pessoas notáveis num partido medíocre.

[3ª] A terceira lição é que os grandes derrotados desta eleição são os partidos que mais contribuíram para a construção da Europa como a conhecemos, os partidos de centro esquerda e de centro direita, que continuam a pensar que, com mais ou menos remendos, esta Europa sobreviverá. Como se compreende que o partido que proclamou ser a alternativa à coligação partidária que presidiu ao maior desastre social em Portugal nos últimos 90 anos fique apenas a uns míseros quatro pontos acima dessa coligação? A ilação é simples: para o PS [Partido Socialista]2 ser a alternativa tem de se reconstruir em alternativa a si mesmo.

Boaventura de Sousa Santos, doutor em sociologia do direito pela Universidade de Yale (Estados Unidos), é Professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal) e Distinguished Legal Scholar da Faculdade de Direito da Universidade de Wisconsin-Madison (Estados Unidos) e Global Legal Scholar da Universidade de Warwick (Reino Unido). É igualmente Director do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra; Coordenador Científico do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa.
Dirige actualmente o projecto de investigação ALICE - Espelhos estranhos, lições imprevistas: definindo para a Europa um novo modo de partilhar as experiências o mundo, um projeto financiado pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC), um dos mais prestigiados e competitivos financiamentos internacionais para a investigação científica de excelência em espaço europeu. 

NOTAS:

1. Bloco de Esquerda: Fundado em 1998 depois da fusão entre o Partido Socialista Revolucionário (PSR) (trotskista), União Democrática Popular (UDP) (marxista-leninista), o Política XXI (PXXI) (marxista-leninista) e a Frente de Esquerda Revolucionária (Ruptura/FER) (trotskista), o Bloco de Esquerda assumiu-se como um movimento de ruptura dentro do panorama político português. Abordando questões fraturantes, como os direitos dos homossexuais ou a despenalização das drogas leves, o partido cresceu, sobretudo nos meios urbanos. Nos últimos anos, perdeu uma parte do verbalismo que o caracterizava e aproximou-se mais do perfil dos partidos tradicionais. Apesar de não se assumir como líder, Francisco Louçã é a figura mais destacada do partido. O Bloco de Esquerda conta atualmente com oito deputados na Assembleia da República (Fonte: clique aqui].

2. Partido Socialista: Fundado em 1973, à semelhança do Partido Social Democrata, é um partido de tradição social-democrata em Portugal. Há várias posições diferentes sobre as políticas do PS, que defende medidas de índole social-democrata mas que, tal como o PSD, sofreu uma viragem à direita nos anos seguintes à Revolução dos Cravos. O seu líder histórico é Mário Soares. Em 2011 passou a ter 74 deputados na Assembleia da República (Fonte: clique aqui].

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Quinta-feira, 29 de maio de 2014 – Internet: clique aqui.

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