BISPOS SÃO CONTRÁRIOS À REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL E DA TERCEIRIZAÇÃO GERAL DO TRABALHO

CNBB critica terceirização e redução da maioridade penal

Agência Brasil
25-04-2015

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou no dia 24 de abril último nota sobre a conjuntura do país, com críticas ao projeto de lei que regulamenta a terceirização de mão de obra nas empresas e à proposta de redução da maioridade penal. A nota foi divulgada no encerramento da 53ª Assembleia Geral da CNBB, em Aparecida (SP). Na reunião também ocorreu a cerimônia de posse de Dom Sérgio da Rocha na presidência da CNBB.
Mesa-diretora da 53ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
De acordo com a nota, a entidade avaliou “com apreensão” a realidade brasileira, “marcada pela profunda e prolongada crise que ameaça as conquistas, a partir da Constituição Cidadã de 1988, e coloca em risco a ordem democrática do país”. A nota acrescenta que “a retomada de crescimento do país, uma das condições para vencer a crise, precisa ser feita sem trazer prejuízo à população, aos trabalhadores e, principalmente, aos mais pobres”.

Sobre o projeto que trata da terceirização, o texto expressa que ele não deve restringir direitos. “A lei que permite a terceirização do trabalho, em tramitação no Congresso Nacional, não pode, em hipótese alguma, restringir os direitos dos trabalhadores. É inadmissível que a preservação dos direitos sociais venha a ser sacrificada para justificar a superação da crise”, registra.

Na avaliação dos bispos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 171/1993), que propõe redução da maioridade penal para 16 anos, é um “equívoco que precisa ser desfeito”. Para a CNBB, a redução da maioridade penal não é solução para a violência no país. “Investir em educação de qualidade e em políticas públicas para a juventude e para a família é meio eficaz para preservar os adolescentes da delinquência e da violência”, aponta.

Outro tema abordado na nota é o projeto de lei que altera o Estatuto do Desarmamento. A avaliação é de que se trata de ilusão a ideia de que facilitando o acesso da população à posse de armas se combate a violência.

Ao final do texto, a CNBB salienta que muitas destas e de outras matérias que incidem diretamente na vida do povo têm, entre seus caminhos de solução, uma reforma política. A reforma política também foi tratada pelo recém-empossado presidente da conferência, dom Sérgio da Rocha, em entrevista a jornalistas.

Ele disse que “o fato de a Igreja falar da reforma política, mostrar a importância da palavra política, não quer dizer que esteja adotando uma posição que seja do governo que aí está, ou então de um partido ou outro. Nós fazemos isso [falar da reforma política] com sentimento de corresponsabilidade e de responsabilidade na vida social”.
Dom Raymundo Damasceno Assis - Presidente da CNBB
Eis a nota da CNBB sobre o momento nacional.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, reunida em sua 53ª Assembleia Geral, em Aparecida-SP, no período de 15 a 24 de abril de 2015, avaliou, com apreensão, a realidade brasileira, marcada pela profunda e prolongada crise que ameaça as conquistas, a partir da Constituição Cidadã de 1988, e coloca em risco a ordem democrática do País. Desta avaliação nasce nossa palavra de pastores convictos de que “ninguém pode exigir de nós que releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional, sem nos preocupar com a saúde das instituições da sociedade civil, sem nos pronunciar sobre os acontecimentos que interessam aos cidadãos” (Papa Francisco, Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, 183).

O momento não é de acirrar ânimos, nem de assumir posições revanchistas ou de ódio que desconsiderem a política como defesa e promoção do bem comum. Os três poderes da República, com a autonomia que lhes é própria, têm o dever irrenunciável do diálogo aberto, franco, verdadeiro, na busca de uma solução que devolva aos brasileiros a certeza de superação da crise.

A retomada de crescimento do País, uma das condições para vencer a crise, precisa ser feita sem trazer prejuízo à população, aos trabalhadores e, principalmente, aos mais pobres. Projetos, como os que são implantados na Amazônia afrontam sua população, por não ouvi-la e por favorecer o desmatamento e a degradação do meio ambiente.

A lei que permite a terceirização do trabalho, em tramitação no Congresso Nacional, não pode, em hipótese alguma, restringir os direitos dos trabalhadores. É inadmissível que a preservação dos direitos sociais venha a ser sacrificada para justificar a superação da crise.

A corrupção, praga da sociedade e pecado grave que brada aos céus (cf. Papa Francisco, O Rosto da Misericórdia, n. 19), está presente tanto em órgãos públicos quanto em instituições da sociedade. Combatê-la, de modo eficaz, com a consequente punição de corrompidos e corruptores, é dever do Estado. É imperativo recuperar uma cultura que prima pelos valores da honestidade e da retidão. Só assim se restaurará a justiça e se plantará, novamente, no coração do povo, a esperança de novos tempos, calcados na ética.

A credibilidade política, perdida por causa da corrupção e da prática interesseira com que grande parte dos políticos exerce seu mandato, não pode ser recuperada ao preço da aprovação de leis que retiram direitos dos mais vulneráveis. Lamentamos que no Congresso se formem bancadas que reforcem o corporativismo para defender interesses de segmentos que se opõem aos direitos e conquistas sociais já adquiridos pelos mais pobres.

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000, por exemplo, é uma afronta à luta histórica dos povos indígenas que até hoje não receberam reparação das injustiças que sofreram desde a colonização do Brasil. Se o prazo estabelecido pela Constituição de 1988 tivesse sido cumprido pelo Governo Federal, todas as terras indígenas já teriam sido reconhecidas, demarcadas e homologadas. E, assim, não estaríamos assistindo aos constantes conflitos e mortes de indígenas.

A PEC 171/1993, que propõe a redução da maioridade penal para 16 anos, já aprovada pela Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça da Câmara, também é um equívoco que precisa ser desfeito. A redução da maioridade penal não é solução para a violência que grassa no Brasil e reforça a política de encarceramento num país que já tem a quarta população carcerária do mundo. Investir em educação de qualidade e em políticas públicas para a juventude e para a família é meio eficaz para preservar os adolescentes da delinquência e da violência.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, em vigor há 25 anos, responsabiliza o adolescente, a partir dos 12 anos, por qualquer ato contra a lei, aplicando-lhe as medidas socioeducativas. Não procede, portanto, a alegada impunidade para adolescentes infratores. Onde essas medidas são corretamente aplicadas, o índice de reincidência do adolescente infrator é muito baixo. Ao invés de aprovarem a redução da maioridade penal, os parlamentares deveriam criar mecanismos que responsabilizem os gestores por não aparelharem seu governo para a correta aplicação das medidas socioeducativas.

O Projeto de Lei 3722/2012, que altera o Estatuto do Desarmamento, é outra matéria que vai na contramão da segurança e do combate à violência. A arma dá a falsa sensação de segurança e de proteção. Não podemos cair na ilusão de que, facilitando o acesso da população à posse de armas, combateremos a violência. A indústria das armas está a serviço de um vigoroso poder econômico que não pode ser alimentado à custa da vida das pessoas. Dizer não a esse poder econômico é dever ético dos responsáveis pela preservação do Estatuto do Desarmamento.

Muitas destas e de outras matérias que incidem diretamente na vida do povo têm, entre seus caminhos de solução, uma Reforma Política que atinja as entranhas do sistema político brasileiro. Apartidária, a proposta da Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, da qual a CNBB é signatária, se coloca nessa direção.

Urge, além disso, resgatar a ética pública que diz respeito “à responsabilização do cidadão, dos grupos ou instituições da sociedade pelo bem comum” (CNBB – Doc. 50, n. 129). Para tanto, “como pastores, reafirmamos ‘Cristo, medida de nossa conduta moral’ e sentido pleno de nossa vida” (Doc. 50 da CNBB, Anexo – p. 30).

Que o povo brasileiro, neste Ano da Paz e sob a proteção de Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, supere esse momento difícil e persevere no caminho da justiça e da paz.

Aparecida, 21 de abril de 2015.

Cardeal Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida, Presidente da CNBB
Dom José Belisário da Silva, OFM
Arcebispo de São Luís do Maranhão, Vice Presidente da CNBB
Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília, Secretário Geral da CNBB”

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Segunda-feira, 27 de abril de 2015 – Internet: clique aqui.

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