Sete razões para a escola se conectar com a comunidade

Danilo Mekari

Salas grandes com carteiras enfileiradas e alunos de costas uns para os outros. Do colega da frente só se vê a nuca – e pelas próximas quatro horas as conversas e trocas estão proibidas. No Brasil, esse modelo de educação em massa, surgido no final do século dezenove, está desgastado e envelhecido. Perdeu seu tempo histórico e sua razão de existir.
MARIA DO PILAR LACERDA é
diretora da Fundação SM e ex-secretária de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC),
cargo que exerceu entre 2007 e 2012
Ao menos essa é a opinião de duas especialistas em educação, Maria do Pilar Lacerda e Heloísa Mesquita. “É por isso que a maioria prefere sentar na turma do fundão”, brincou Pilar, ao notar que o público do debate A escola conectada à comunidade se comportava da mesma maneira. O evento foi organizado pelo Núcleo de Inovação e Desenvolvimento Profissional (NIDP) da Escola Lourenço Castanho e aconteceu em um auditório da unidade de Ensino Médio do colégio na segunda-feira (27/4).

Para essa transformação acontecer, Pilar não tem dúvidas: “A comunidade é absolutamente transformadora nesse processo”. A partir do debate entre Pilar e Heloísa, o Portal Aprendiz enumerou sete razões para incentivar a conexão entre os espaços de aprendizagem formais com a comunidade.
HELOÍSA MESQUITA é
gestora do Programa Estratégico Ginásio Experimental Carioca, da Secretaria Municipal da Educação
Foto: Guarim de Lorena
#1 Reconhecer o outro

Mesmo em bairros de metrópoles como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte existem muitas disparidades entre as pessoas. Ao invés de ser baseado em medo e distanciamento, o convívio social entre os moradores pode estimular a troca de conhecimentos e ensinar as crianças e adolescentes a reconhecer e respeitar e valorizar as diferenças. “Educação comunitária é importante para aprender a reconhecer o outro. Temos que pensar que a sociedade só sobreviverá se passar os seus conhecimentos para os mais jovens”, aponta Pilar.

Conhecer o outro é a melhor forma de a pessoa se formar, fazer percursos para reconhecer o território e estabelecer relações que humanizam”, acrescenta.

#2 Mapear os gostos dos estudantes

Heloísa acredita que a palavra Experimental dá um caráter mágico aos ginásios cariocas, pois transforma o projeto em um laboratório que o libera de burocracias estatais, mesmo sem abrir mão de monitoramento e organização. Uma das pesquisas realizadas pela escola elencou os interesses, desejos e vontades dos estudantes, desde o músico e banda que mais ouviam até as suas preferências alimentares. “A escola precisa ir além do ensino – precisa ouvir e se conectar ao jovem atual”, defende Heloísa.

#3 Descobrir os conhecimentos da comunidade e levá-los para dentro da escola

Em minha trajetória, percebi que trazer a família para a escola impacta muito o aprendizado”, revela Heloísa. No processo de mapeamento da comunidade, um dos GECs descobriu a mãe de um aluno que, sendo bancária e trabalhando com números, passou a ajudar estudantes com dificuldades em matemática. “Qual a vocação daquela população no entorno da escola?” Essa é uma das questões que, segundo Heloísa, devem ser feitas por toda instituição de ensino.

A mesma pesquisa revelou uma habilidade manual presente na maioria dos estudantes: a de fazer reparos domésticos como consertar tomadas e instalar antenas de televisão. O Ginásio, então, criou matérias eletivas extracurriculares contemplando as áreas de mecânica, eletrônica e elétrica. “Nós, como gestores, temos que sair da escola, conhecer onde o aluno mora, o que ele vive”, observa Pilar.

#4 Reconhecer o território como espaço educador

Já pensou que o padeiro pode ajudar o professor de química? Fortalecendo os laços comunitários e abrindo espaço para a escola circular nos espaços públicos e os moradores também entrarem na escola, cria-se a possibilidade daquele território ser reconhecido como espaço educador.

A ex-secretária do Ministério da Educação (MEC) cita o programa BH para Crianças, que oferece transporte aos alunos e professores para visitar museus, cinemas, teatros, parques e galerias de arte, entre outros espaços culturais da cidade. “A escola precisa abrir o portão simbolicamente e fazer o diálogo começando por onde está inserida. Isso refresca o cotidiano escolar, hoje tão envelhecido”, avalia Pilar.

#5 Conectar as escolas da comunidade

Localizada na Gávea, a Escola Americana do Rio de Janeiro fica muito próxima a uma das entradas da comunidade da Rocinha, a maior favela da cidade. A diretora de um Ginásio Experimental descobriu que, no currículo do colégio privado, havia a obrigatoriedade de cumprir ações sociais. Propôs então que os alunos da Escola Americana ensinassem inglês aos estudantes da escola pública da Rocinha. Deu certo.

#6 Ouvir as crianças

“Se a gente escutasse mais a criança veria que ela tem a resposta para fazer a mobilização e a conexão com a comunidade. Nós, adultos, temos medo de violência, o mundo está complicado, mas se a gente chamar um guri pra ajudar alguém e fazer algo por aquela comunidade ele vai topar. Porém, sempre arrumamos ‘senões’ para isso. Precisamos dar a chance de o próprio aluno abrir a porta”, propõe Heloísa.

#7 Pelo direito à cidade

“Sem utopia: a educação transforma a cidade. Ou seja, toda essa discussão que estamos tendo na verdade diz respeito ao direito à cidade”, argumenta Pilar. “A escola é essencial para um futuro no qual a cidade seja desenhada para as pessoas.”

Fonte: Portal Aprendiz – Aprender na Cidade – 28/04/2015 – Internet: clique aqui.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A necessidade de dessacerdotalizar a Igreja Católica

Vocações na Igreja hoje

Eleva-se uma voz profética