A HORA E A VEZ DO AÇÚCAR
Jairo Bouer
Psiquiatra
Não é fácil parar de
comer doces porque
o organismo usa essa estratégia contra o estresse
O açúcar apareceu como protagonista de dois interessantes
artigos na última semana. As principais conclusões: o que engorda nos dias de hoje é a má alimentação e não o sedentarismo,
e é tão difícil parar de comer doces porque essa pode ser uma importante via de
controle do estresse.
O primeiro trabalho, publicado no British Journal of Sports Medicine, revelado pelo site da BBC Brasil, traz a visão de
pesquisadores do Reino Unido, África do Sul e dos Estados Unidos de que o açúcar seria hoje o grande responsável
pela epidemia de obesidade que o mundo enfrenta.
Para eles, a política de marketing da indústria alimentícia
de defender que a atividade física compensaria calorias adicionais e efeitos
negativos da má alimentação é incorreta.
O exercício teria um
papel moderado na perda de peso, ao passo que uma dieta de qualidade seria uma
medida muito mais efetiva para alcançar esse objetivo. Segundo os
pesquisadores, calorias provenientes de açúcar e carboidratos provocariam maior
risco de depósito de gordura e gerariam ainda mais fome, enquanto calorias que
se originam em alimentos gordurosos trariam maior sensação de saciedade.
Mas nem todo mundo concordou com o artigo. Para boa parte
dos especialistas, a associação entre atividade física e boa alimentação ainda
é a melhor receita para quem quer perder peso e se manter saudável. Para eles,
a visão de que o açúcar teria um papel mais importante do que a vida sedentária
na epidemia de obesidade seria bastante parcial.
Doce e estresse
O segundo artigo tenta mostrar por que muita gente come doces para aliviar tensões. O açúcar reduziria os
níveis do hormônio cortisol, liberado em situações de estresse. Já se
suspeitava que essa via metabólica funcionava em roedores e a nova pesquisa
teria conseguido demonstrar que ela pode atuar também em nós.
Cientistas da Universidade
da Califórnia (Estados Unidos da América) avaliaram grupos de mulheres que
tomaram, durante duas semanas, bebidas adoçadas com aspartame (um adoçante
artificial) ou com açúcar. Eles mediram o nível de cortisol na saliva delas e
analisaram imagens do cérebro com exames de ressonância magnética, em momentos
em que elas faziam testes matemáticos muito difíceis, potencialmente geradores
de estresse.
O trabalho, publicado no Journal
of Clinical Endocrinology and Metabolism, trazido pelo jornal The New York Times, mostra que, antes
da dieta, todas as mulheres tinham níveis de cortisol semelhantes. Depois das
duas semanas, o cortisol diminuiu no grupo que recebeu açúcar, mas não no que
recebeu aspartame. A ressonância magnética também mostrou menor fluxo de sangue
para áreas do cérebro relacionadas ao medo e ao estresse nas mulheres que
consumiram açúcar.
Longe de indicar que as pessoas deveriam consumir açúcar e
carboidratos para reduzir a ansiedade, a pesquisa sugere porque pode ser tão
difícil parar de comer doces. Ao reduzir
sensações desagradáveis geradas pelo estresse, alimentos com açúcar trazem algum
grau de conforto e sensação de prazer. E mudar isso pode ser bem complicado!
Como o consumo
exagerado de açúcar e o estresse
crônico são hoje questões importantes de saúde pública, já que ambos podem
contribuir para um aumento da obesidade, é importante pensar em estratégias e
tratamentos que tenham como objetivo dissociar essa combinação. Mesmo que se
leve em conta que a atividade física tem um papel central no controle da
obesidade, não seria nada mal que as
pessoas percebessem que é importante comer cada vez menos açúcar, mesmo
sabendo que ele pode fazer com que a gente se sinta mais calmo e feliz.
Difícil, não?
Fonte: O Estado de S.
Paulo - Metrópole – Domingo, 26 de abril de 2015 – Pg. A27 – Internet:
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