«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

AS SETE ÚLTIMAS PALAVRAS DE CRISTO

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo
Timothy Radcliffe - teólogo e religioso Dominicano inglês
«Encontramos na cruz no século 12 as origens da devoção às sete últimas palavras de Jesus.

Vários autores compuseram um relato harmonioso da vida de Jesus com base nos quatro Evangelhos. Assim se reuniram suas últimas palavras na cruz, que se tornaram assunto de meditação.

Essas últimas palavras foram comentadas por São Boaventura [franciscano, viveu de 1221 a 1274] e popularizadas pelos franciscanos. Tiveram enorme importância para a religiosidade medieval tardia e eram ligadas à meditação nas sete chagas de Cristo e vistas como cura para os sete pecados capitais.

De acordo com as Horas de São Beda, quem meditasse nessas palavras de Jesus seria salvo e Nossa Senhora lhe apareceria trinta dias antes da morte.

Entretanto, devo admitir que hesitei quando me pediram para pregar sobre as sete últimas palavras de Jesus na catedral de Seattle [Estados Unidos] na Sexta-Feira Santa de 2002. Parecia que elas faziam parte de uma espiritualidade sombria, que insistia no sofrimento e no pecado e com a qual eu não me identificava facilmente.

O Evangelho, já se vê, diz que devemos tomar nossa cruz todos os dias e seguir Cristo, mas com demasiada frequência isso se transformou em um cristianismo que me parecia triste, repudiava a vida e até sugeria masoquismo. São João da Cruz diz que “a alma que realmente anseia pela divina sabedoria, primeiro anseia pelo sofrimento, para que possa entrar mais profundamente no matagal da cruz”.

Confesso não ter, em absoluto, nenhum anseio de sofrer! [...]

Minha fé fala de vida, do nascimento de uma criança e da vitória sobre a morte. Isso, já se vê, passa necessariamente pela Sexta-Feira Santa, mas por que ficar concentrado naquele momento? [...]

Entretanto, aceitei pregar sobre as sete últimas palavras em memória de meu amado pai que compartilhou sua fé comigo. [...]

Últimas palavras têm um fascínio especial. Os seres humanos são animais falantes. Para nós, estarmos vivos é estar em comunicação. A morte não é apenas a cessação da vida corporal. É silêncio. Então o que dizemos diante do silêncio iminente é revelador. [...]

Sendo cristãos, cremos que tudo existe e é sustentado por essa Palavra que existia desde o princípio [do Universo]. É o sentido de toda a nossa vida. Como João escreveu no prólogo de seu Evangelho: “Nela estava a vida, e a vida era a luz dos homens” (Jo 1,4). [...]

Nossa fé na ressurreição não é apenas porque esse homem [Jesus Cristo] morreu e voltou à vida. A Palavra não foi silenciada. Estas sete últimas palavras vivem. O túmulo não as engoliu. [...] O Silêncio do túmulo foi rompido para sempre e essas palavras não foram as últimas. “E a luz brilha nas trevas, e as trevas não conseguiram dominá-la” (Jo 1,5). [...]

A própria Palavra [Cristo] não foi silenciada e nunca será. [...]
Nossas palavras dão vida ou morte; criam ou destroem. As últimas palavras de Jesus na cruz são o clímax desse drama. [..]

Nestas sete últimas palavras de Jesus, testemunhamos o debate final entre as palavras e o silêncio, o sentido e a tolice, e acreditamos que a vitória foi conquistada. [...]

As últimas palavras de Jesus podem alojar-se em nosso coração e mente e sustentar-nos seja no que for que enfrentemos: fracasso, perda, silêncio e morte. [...]

Fiquei atônito ao descobrir que elas têm uma bela estrutura. Começam com palavras dirigidas ao Pai, encontram o centro em um grito por causa da ausência desse Pai e no fim voltam a dirigir-se a Ele. As palavras que Jesus nos dirige estão conservadas dentro desse relacionamento com o Pai, exatamente como é lá que encontraremos nosso lar, dentro da vida da Trindade. Aconchegamo-nos dentro dessa divina conversa. [...]

Porque [essas últimas palavras de Jesus] são a fala de uma única Palavra de vida, essas sete palavras só podem ser entendidas à luz da ressurreição. [...] A ressurreição faz mais que confirmar essas palavras, afirma que podemos confiar que o Pai verdadeiramente nos perdoará. É-nos mostrado o que é o perdão, que é mais que esquecer. É transformação da Páscoa, a irrepreensível fertilidade divina, um túmulo vazio.»

(Fonte: Timothy Radcliffe. As sete últimas palavras. Trad. Barbara Theoto Lambert. 
São Paulo: Paulinas, 2013, p. 7-22)

O texto abaixo é uma “coleta” das principais palavras que o grande teólogo e ex- Mestre-geral da Ordem dos Pregadores (Dominicanos) de 1992 a 2001, TIMOTHY RADCLIFFE, escreveu no livro supracitado. Ele também foi professor de Sagrada Escritura na Universidade de Oxford em Blackfriars, Inglaterra.

As Sete Palavras de Jesus na Cruz

1. Jesus dizia: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” (Lucas 23,34)
Cruz de Michael Finn

Ø A primeira palavra é uma palavra de perdão.
Ø O perdão chega antes da crucifixão, antes dos insultos e da morte.
Ø Antes de nós pecarmos, já estamos.
Ø O perdão está presente, à nossa espera.
Ø Mas isso não quer dizer que Deus não tome a sério aquilo que nós fazemos.
Ø Na Sexta-feira Santa, reunimo-nos para escutar a paixão e morte de Cristo, e para recordar que a humanidade rejeitou, humilhou e assassinou o Filho de Deus.
Ø A cruz é o símbolo horrível da tortura. É o símbolo da capacidade que a humanidade tem de rejeitar o amor e de cometer atos completamente estéreis.
Ø O perdão significa que a cruz é a nossa árvore da vida.
Ø O perdão significa que nós ousamos enfrentar aquilo que fizemos.
Ø Atrevemo-nos a recordá-lo, não para nos sentirmos horríveis, mas para abrir a nossa vida à sua transformação criadora.
Ø Tudo o que é estéril e árido dará fruto.

2. Ele lhe respondeu: “Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso.” (Lucas 23,43)
Cruz indígena

Ø Jesus promete levar aquele ladrão para o paraíso antes ainda da sua própria ressurreição.
Ø Isto se deve ao fato de Deus viver no HOJE da eternidade.
Ø A eternidade não é aquilo que acontece no fim dos tempos, depois de termos morrido.
Ø Cada vez que nós amamos e perdoamos pomos um pé na eternidade, que é a vida de Deus.
Ø Jesus prometeu-nos que nós alcançaremos a felicidade, e assim será.
Ø A felicidade não é uma emoção que nós podemos simplesmente ter ou não ter. É estar vivos.
Ø Qual é essa felicidade que Jesus oferece? Ele descreve-a como o PARAÍSO.
Ø Esta palavra é originária da Pérsia e significa “jardim murado”.
Ø A felicidade, no entanto, não é vaguear à volta de roseiras e outras flores.
Ø É a COMPLACÊNCIA de Deus em nós e a nossa COMPLACÊNCIA em Deus.
Ø Deus compraz-se em tudo aquilo que nós somos.
Ø A felicidade significa que nós partilhamos a complacência que Deus põe na humanidade.
Ø O oposto da felicidade não é a tristeza. É ter um coração de pedra.
Ø É recusarmo-nos a deixar que outras pessoas nos toquem.
Ø Para sermos felizes, temos de ser arrancados de nós mesmos, tornando-nos, por isso, vulneráveis.

3. Jesus, ao ver sua mãe e, ao lado dela, o discípulo que ele amava, disse à mãe: “Mulher, eis o teu filho!” Depois disse ao discípulo: “Eis a tua mãe!” A partir daquela hora, o discípulo a acolheu no que era seu. (João 19,26-27)
Cruz de São Clemente

Ø Sexta-feira Santa, a solidão parece ter levado a melhor sobre Jesus!
Ø Todos os esforços dele por construir uma pequena comunidade parecem ter falhado.
Ø A mãe de Jesus recebe um filho, na pessoa de seu amigo mais íntimo, e o discípulo amado recebe uma mãe.
Ø Não se trata de uma comunidade qualquer: é a nossa comunidade, a nossa família, a nossa Igreja.
Ø Por que é que a nossa família nasceu junto à cruz?
Ø Porque aquilo que desintegra a comunidade humana é a hostilidade e a acusação.
Ø Nós somos hostis para com outras pessoas por elas não serem como nós: são negras, brancas ou chinesas; são judias ou muçulmanas; são homossexuais; são progressistas ou conservadoras.
Ø Nós olhamos para os outros com acusação e tentamos expulsá-los.
Ø As sociedades são, muitas vezes, construídas com base na exclusão.
Ø Jesus toma sobre si toda a nossa hostilidade, todas as acusações que os seres humanos fazem uns contra os outros.
Ø “A pedra que os construtores rejeitaram veio a tornar-se a pedra angular” (Salmo 118,22).
Ø “Deus está no meio de nós como um marginal” (James Alison).
Ø No centro do nosso culto está aquele que foi excluído.
Ø Ser cristão é reconhecer que a nossa família nasceu aos pés da cruz, de onde ninguém pode ser excluído.
Ø Em Cristo, nós somos carne da mesma carne, somos irmãos e irmãs uns dos outros.
Ø Chamar a alguém irmão ou irmã não significa apenas estabelecer uma relação; é a proclamação da reconciliação.
Ø Cada um é atraído para Cristo por um tipo de amor diferente.
Ø Muitas vezes nós não reconhecemos o nosso Deus no amor de outra pessoa.
Ø Contudo, aos pés da cruz, encontramo-nos uns com os outros como família.
Ø É-nos confiada a missão de ultrapassar todas as fronteiras e hostilidades que dividem os seres humanos, dizendo:
Ø “eis o meu irmão”, “eis a minha irmã”.

4. Às três da tarde, Jesus gritou com voz forte: “Eloí, Eloí, lemá sabactâni? — que quer dizer “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Marcos 15,34)
Cruz do Haiti - Michee Remy

Ø Será uma pergunta sem resposta?
Ø Haverá alguma coisa que se possa responder?
Ø Essas terríveis palavras são uma citação do Salmo 22.
Ø Jesus abraça essa experiência de desolação e partilha.
Ø É a única atitude possível: crer que Deus se faz presente, mesmo em momentos como esses!
Ø Todos nós podemos passar por momentos absurdos, onde não existem porquês nem para quês!
Ø As palavras de Jesus na última ceia são muito consoladores nesses terríveis momentos da vida:
Isto é o meu corpo, entregue por vós!

5. Depois disso, sabendo Jesus que tudo estava consumado, e para que se cumprisse a Escritura até o fim, disse: "Tenho sede!" (João 19,28)
Cruz de El Salvador

Ø O início do evangelho segundo João apresenta Jesus no poço solicitando água para a Samaritana: “Dá-me de beber”.
Ø É assim que Deus vem a nós, sob a forma de uma pessoa cheia de sede que quer qualquer coisa que nós temos para dar.
Ø A relação de Deus com a criação é uma relação de doação total.
Ø Aquele que nos dá tudo convida-nos a ser seus amigos pedindo um dom em troca, seja o que for que nós tenhamos para dar.
Ø Acima de tudo, Deus nos quer!
Ø Deus vem ao nosso encontro, ainda antes de nós nos termos virado para Ele.
Ø Deus morre de sede por nós e pelo nosso amor, contudo, ele tem de aguentar o nosso desprezo e indiferença, tantas vezes!
Ø É um privilégio de Deus ser sempre menos o amado do que o amante!
Ø Assim, como em Caná, ele transformara a água em vinho, também na cruz Ele faz do seu sangue o vinho da vida eterna.

6. Ele tomou o vinagre e disse: “Está consumado”. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito. (João 19,30)
Cruz do Rosário

Ø O grito de Jesus não significa apenas que tudo terminou e que Ele agora vai morrer.
Ø É um grito de triunfo.
Ø Significa: “Tudo está completo”, ou seja “Tudo está perfeito!”.
Ø Na cruz nós vemos a perfeição do AMOR!
Ø Estas palavras de Jesus convidam-nos a seguir em frente, tentando amar de forma perfeita.
Ø Contudo, a perfeição do amor está nas palavras que Jesus pronunciou: “Tenho sede”.
Ø A plenitude do amor é quando Jesus nos pede qualquer coisa e a aceita com gratidão.
Ø Agora o seu amor é completo.
Ø Os soldados dão a Jesus aquilo que têm, um resto de vinagre azedo, ou seja, um vinho barato e ruim.
Ø Provavelmente, teria um sabor repugnante, mas era o que os pobres soldados bebiam, por isso, partilharam-no.
Ø Jesus aceita aquilo que eles têm para oferecer.
Ø Se sempre soubermos dar daquilo que temos, mesmo que seja pouco, será suficiente!

7. Jesus deu um forte grito: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”. Dizendo isto, expirou. (Lucas 23,46)
Uma Pietà (Jesus nos braços de Maria após sua morte) de nossos dias

Ø A primeira e a última das sete palavras são dirigidas ao PAI.
Ø A quarta palavra, que é central, também é dirigida ao PAI.
Ø Agora, Jesus devolve tudo ao Pai.
Ø Entrega-nos a todos nós, com todos os nossos medos e esperanças, colocando-nos, de novo, nas mãos de Deus.
Ø É o ato supremo de confiança.
Ø Nós vivemos numa época de ansiedade profunda.
Ø Tememos os problemas de saúde e a doença, tememos pelo nosso futuro, pelos nossos filhos, pelos nossos empregos, temos medo do fracasso e da pobreza.
Ø Sofremos de uma insegurança profunda, de um colapso da nossa confiança.
Ø Isso tudo é estranho, porque estamos muito mais protegidos e seguros do que em qualquer geração anterior da história humana, pelo menos no Ocidente.
Ø Temos uma medicina melhor e transportes mais seguros;
Ø estamos mais protegidos do clima, e temos uma segurança social mais eficaz.
Ø Contudo, sentimos mais medo!!!
Ø Esta ansiedade invasiva deriva do fato de nós termos uma cultura do controle.
Ø Podemos controlar tantas coisas: a fertilidade e os nascimentos, há tantas doenças curáveis;
Ø sabemos controlar as forças da natureza;
Ø minamos a terra e construímos diques nos rios.
Ø Esse controle, porém, nunca é total.
Ø Temos medo, sobretudo da morte!
Ø Por isso, essas sete palavras de Jesus nos ajudam a chegar ao DESCANSO.
Ø Ao terminar de dizê-las, Jesus descansou!
Ø Assim fez, também, Deus, de acordo com o livro de Gênesis, ou seja, no sétimo dia descansou de sua obra criadora.
Ø Fomos feitos para repousar em Deus e para Deus poder repousar em nós.
Ø Esse repouso não é ausência de atividade; é uma volta ao lar.
Ø Se alguém me tem amor, haverá de guardar a minha palavra; e o meu Pai o amará, e Nós viremos a ele e nele faremos morada” (João 14,23).
Ø Agora, Jesus proferiu a sua última palavra na cruz.
Ø Fez-se silêncio.
Ø Temos de esperar que a RESSURREIÇÃO quebre o silêncio do sepulcro.
Ø Deus deseja que nós ESPEREMOS PELA SUA PALAVRA.

Vamos acompanhar
esse lindo gesto de amor:
Deus se entregando à humanidade!

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