COMO ESTÁ A SITUAÇÃO POLÍTICA HOJE?
Desceu a escuridão à Terra
Rudá Ricci
Cientista
Político
"É hora de
entrarem em cena os que efetivamente pensam no futuro do país"
I N C R Í V E L ! Dá para acreditar que haja gente que peça isto numa manifestação de rua? |
Já dá para fazer uma observação mais serena (já sei, o
trocadilho é dos mais óbvios).
Evidentemente que quem leu minhas postagens nas redes
sociais percebeu meu horror em relação às manifestações comandadas por jovens
cuja inspiração não é a democracia ou o futuro do Brasil, mas algo que transita
entre a revanche, o ressentimento e o imediatismo.
Quem sai às ruas nem
sempre acompanha o perfil dos organizadores do evento, é verdade. O que
seriam das festas sem os bicões? Mas o fato é que deram muita lenha para a fogueira de vaidades dos rebeldes sem causa
da classe média paulistana.
Gosto da ocupação das ruas. Mas confesso que este apreço é,
para mim, uma esteira que conduz à reforma do campo institucional.
Os meninos das “manifestações dos 20%” (este foi o
percentual de protestantes do dia de hoje em relação ao dia 15 de março) não
pensam no campo institucional. Seria demais pedir este nível de reflexão e
profundidade para gente que ainda é adolescente, afinal. Os meninos só pediam a
dança das cadeiras. Um pouco mais velhos e perceberiam que esta dança vem de
qualquer maneira e nem precisam de protestos de rua.
As ruas são o
oxigênio das democracias e não podem ser banalizadas a este ponto.
Então, nada a favor do governo que continua o mesmo. Nada a
favor dos partidos hegemônicos que continuam brincando de esconde-esconde.
Mas tudo a favor da
qualificação das ruas e de suas manifestações.
Para o bem ou para o mal, temos uma fartura de pesquisas que
revelam a cultura política tupiniquim. Os
mais pobres não gostam de extremismos. Não gostam de Black Blocs e hoje ficou claro que não gostam do discurso golpista, seja o que pregava o impeachment, seja o que gosta de queimar
bandeiras (houve um dia que a queima de peças íntimas tinha mais conteúdo),
seja o que pedia a volta dos militares.
Estes extremismos, para o bem ou para o mal, não fazem a
cabeça dos brasileiros trabalhadores e pobres.
Temos que nos
esforçar para estabelecer alguma conexão entre as ruas dos trabalhadores e o
campo institucional. Não para adequar o trabalhador aos partidos, governos
ou parlamentos. Mas para transformar a ambos. A reforma política é o caminho mais justo e reflexivo. Mas tenho
dúvidas que seja um tema ainda por demais acadêmico, pouco compreensível.
Enfim, saem de cena os radicais em busca dos seus 15 minutos
de fama.
É hora de entrarem em cena os que efetivamente pensam no
futuro do país.
Fonte: Rudá Ricci
– Publicado em 12 de abril de 2015 – Internet: clique aqui.
No barco furado com Dilma
José Roberto
de Toledo
Jornalista
político
A insatisfação dos
brasileiros com seus governantes é ampla, geral e irrestrita
O Datafolha e o
esvaziamento dos protestos confirmaram o que a estabilização da confiança do
consumidor tinha antecipado: Dilma
Rousseff bateu no fundo do poço. É um poço sarneysiano, mas tem fundo. Escalá-lo, porém, vai ser demorado e
escorregadio. O ajuste fiscal deve provocar muitas contrações antes de
parir algo de positivo para a economia. O
único aliado da presidente é o tempo - se ela conseguir domar o PMDB e se
segurar no cargo.
Tempo é algo que os PREFEITOS,
todavia, não têm. Pesquisa inédita feita pela Ideia Inteligência mostra que, na
média:
·
eles
estão com 47% de avaliação ruim/péssima,
·
ante 21%
de boa/ótima.
·
Mais: 43%
acham que a vida piorou em suas cidades, e
·
59%
desaprovam a atual administração municipal.
O drama dos prefeitos é que eles encaram as urnas já no
próximo ano. Com tamanho déficit de popularidade, a reeleição lhes será árdua.
A pesquisa foi feita por encomenda da Frente Nacional de Prefeitos, que reúne de Fernando Haddad (São
Paulo, PT) a Eduardo Paes (Rio de Janeiro, PMDB), passando por ACM Neto
(Salvador, DEM). Não foram divulgados resultados isolados por cidade.
O quadro é desolador
para os gestores municipais. Dois em cada três eleitores se dizem pouco ou
nada informados sobre o atual prefeito de sua cidade. Só 29% ouviram falar de alguma realização da prefeitura - a taxa é ainda
menor nos pequenos e médios municípios. Nos grandes, o que mais chamou a
atenção do público foram ciclovias e ciclofaixas: 32% citaram esse tipo de
obra, o único com mais de 5% de lembranças. As ciclovias são aprovadas por dois
terços dos entrevistados nas metrópoles.
Comparando-se a pesquisa dos prefeitos com a recente
pesquisa do Datafolha sobre Dilma, é possível identificar duas tendências
distintas da opinião pública, que se completam:
[1ª
tendência:]
A primeira é que a
insatisfação dos brasileiros com seus governantes é ampla, geral e irrestrita.
Pega todas as esferas de governo e não distingue partidos. É um sentimento genérico de descontentamento.
Produz desconfiança em relação aos políticos e sensação de impotência no
eleitor. O sistema mostra-se incapaz de atender, com a urgência necessária, às
demandas do público. Essa tendência vem da soma
de agravos cotidianos:
·
O tempo desmesurado perdido no trânsito,
·
as interrupções frequentes no abastecimento de
água,
·
a insegurança,
·
a demora para receber atenção médica adequada,
·
a má qualidade do ensino,
·
a percepção de corrupção generalizada.
·
É o que estava na base dos protestos
onipresentes de junho de 2013. É o que explica uma popularidade tão baixa para
tantos prefeitos agora. Mas há outra tendência.
[2ª
tendência:]
A segunda e mais recente onda de insatisfação da opinião
pública nasceu do temporal de aumento de
preços, originado pelos reajustes dos combustíveis e da eletricidade. Como
são decididos pelo governo e foram decretados após a eleição, soaram como
traição para quem votou em Dilma. Some-se o pessimismo em relação ao desemprego, e entende-se por que a
presidente tem 13 pontos a mais de ruim/péssimo do que a média dos prefeitos.
As duas ondas se sobrepõem no caso de Dilma, mas produzem
turbilhão também nos municípios. A agenda negativa federal contamina o resto,
diz Maurício Moura, diretor da Ideia Inteligência. O prefeito médio
acabou no mesmo barco furado da presidente. Com a diferença que ele terá menos
tempo para achar uma boia de salvação e não se afogar nas urnas em 2016.
Nem sempre aos domingos
Conforme previsto aqui pela pesquisa Ibope DTM no Twitter e
pelo Google Trends, o 12 de abril foi uma pequena fração do 15 de março.
Faltaram muitas partes, sobrou um denominador comum: o grupo mais intransigente
na defesa do impeachment, do "tiro na cabeça do PT" e/ou do golpe
militar. O PSDB não foi nem para a janela ver o protesto passar. Mais uma vez a
máxima funcionou: longe da timeline,
longe das ruas.
Fonte: O Estado de S.
Paulo – Política – Segunda-feira, 13 de abril de 2015 – Pg. A6 – Internet:
clique aqui.
As ruas, as casas e as várias crises
Carlos Melo
Cientista
Político e Professor do Insper
Seria o caso de uma
revolução de costumes, mas estamos longe disto.
A crise mais visível
é a do governo e a de seu partido. Estaria aí a obrigação de apontar
saídas. Mas não parecem capazes. A crise
mais séria é a que causa danos sociais concretos e reside na economia; o
País que volta a temer:
·
o desemprego,
·
a falta de investimentos;
·
o fantasma da inflação que se instala e leva à
concentração de renda e à exclusão social;
·
a precariedade dos serviços.
Seria papel da oposição
mostrar alternativa. Mas, na carona, assiste
ao incêndio dos tanques.
Há também a crise
moral, revelada pelos escândalos de
corrupção. Traz a fúria, pede cabeças e justiçamentos, mas pouco toca nas
mazelas da cultura: a remoção de pequenos privilégios cotidianos, a burla das
leis, das normas, a desigualdade de direitos e oportunidades. Seria o caso de uma revolução de costumes,
mas estamos longe disto. São várias as crises, estão em todo canto.
Nesse clima, multidões vão às ruas. Outros tantos observam
de casa, pela internet. Todos, igualmente, vivem o mal-estar. O
descontentamento e a revolta são traços do mundo contemporâneo e daí deriva a
crise cíclica de representação: a
política não responde à sociedade, a sociedade não constrói a política.
Atônito, o sistema político bate cabeça e, no Brasil, gera a besta híbrida do presidencialismo sem poder e do parlamentarismo sem legitimidade. Ambos
carecem de credibilidade. O animal híbrido, como se sabe, é estéril.
Preenchidas pelo
vazio, as ruas querem urgência. Mas, fragmentadas, não apontam rumos.
Perde-se o ímpeto, não pela solução, mas pelo tédio. O “Fora Dilma sem futuro”
é, ao final, nada se nem sequer se imagina quem assumiria o leme dessa nave. A crise de verdade é a ausência de
lideranças – nas ruas e nos partidos –, não apenas morais, mas capazes de
intuir caminhos, estabelecer acordos, construir novo desenho político, um novo
ciclo de desenvolvimento econômico e social, na direção do amanhã.
Resolver o quiproquó do Parlamento não contentará as ruas.
Tampouco agradar às ruas pelas mãos do populismo eliminará, no longo prazo, o
mal-estar que as ruas expressam. A crise maior está na incapacidade de apontar
a rota da fuga que nos leva para frente. No fundo, os que foram às ruas sabem
disto. E os que não foram também.
Fonte: O Estado de S.
Paulo – Política – Segunda-feira, 13 de abril de 2015 – Pg. A9 – Internet:
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