Perguntar não ofende: Quem se beneficia do aumento da taxa de juros?
Selic
Silvio Caccia
Bava
Claudius |
Selic é a taxa básica de
juros da economia brasileira. Ela é usada, entre outras coisas, para remunerar
as aplicações feitas em títulos do Tesouro, isto é, da dívida pública federal.
Tem sido considerada pela imensa maioria dos economistas que acompanham o
mercado financeiro o principal instrumento de combate à inflação.
Se
tomarmos como referência a taxa Selic de
dezembro de 2014, veremos que até
junho de 2015 ela subiu de 11,75% para 13,75% ao ano. Esse crescimento de
dois pontos percentuais sobre uma dívida
pública federal de R$ 2,451 trilhões representa um pagamento extra dos juros da dívida da ordem de R$ 49 bilhões –
valor pouco menor do que o ministro Levy se esforça por amealhar com os cortes
nos gastos federais.
Como
podemos então compreender essa engenharia, segundo a qual o governo corta
fortemente as políticas sociais e reduz o orçamento de todos os ministérios
para reunir algo como R$ 60 bilhões com vistas a garantir os recursos para
pagar os juros da dívida pública federal e, ao mesmo tempo, aumentando a Selic,
eleva o gasto público em R$ 49 bilhões?
A primeira constatação é de
que não há contenção de gastos; corta-se de um lado para dar para outro. Aumentam os recursos
disponíveis para o pagamento dos investidores em títulos da dívida pública
federal, diminuem os recursos destinados às políticas públicas, tais como
educação, saúde, transportes públicos, moradia, seguro-desemprego,
aposentadorias.
O ajuste serve para reduzir
o tamanho do Estado e das políticas públicas, e vem acompanhado de um pacote de
bondades para o grande empresariado, como o que anunciou novas concessões e
privatizações, em condições ainda mais generosas que as privatizações e
concessões anteriores. Por pressão do grande capital, as políticas de Estado em
defesa do interesse público precisam ceder espaço para as políticas que atendam
às exigências do mercado.
Quem se beneficia desse
aumento da taxa de juros?
O
Tesouro Nacional informa que os
detentores dos títulos da dívida pública federal, em junho de 2015, são:
- as instituições financeiras nacionais e internacionais (29,8%);
- os fundos de investimento nacionais e internacionais (20,3%);
- investidores estrangeiros, denominados não residentes (18,6%);
- fundos de previdência (17,1%);
- seguradoras (4,1%);
- governo (5,7%);
- outros (4,4%).
Para
termos elementos de comparação, o Projeto
de Lei Orçamentária Anual para 2015, antes dos cortes, propunha o gasto de
R$ 109,2 bilhões para a saúde, R$ 101,3 bilhões para a educação, R$ 65 bilhões
para o PAC (no qual entra o Minha Casa,
Minha Vida) e R$ 33,1 bilhões para o Brasil
sem Miséria. Tudo isso soma R$ 308,6
bilhões, quantia R$ 28 bilhões menor que o dinheiro público que vai pagar o
serviço da dívida. [2]
O argumento utilizado por
todo o sistema financeiro, toda a mídia que reproduz as análises desse mesmo setor financeiro e
nove de cada dez economistas é de que é
preciso elevar a Selic para combater a inflação, a grande ameaça que vai
erodir o poder de compra de todos e que deve ser controlada, não importa a que
custo social.
Tal
mantra – de que é preciso aumentar a Selic para combater a inflação –, porém,
parece desafiado pela realidade. Esse
argumento não é verdadeiro, pois os aumentos da Selic incidem em apenas 20% dos
componentes da inflação; os 80% restantes são preços sobre os quais a Selic
não tem influência. São os preços dos alimentos, que dependem basicamente das
variações climáticas, e bebidas (25% do IPCA); serviços, que é um enorme
mercado concorrencial (35% do IPCA); e preços administrados, que dependem de
decisões de governo, como gasolina e eletricidade. [3]
Se o aumento da Selic não
combate a inflação, qual é então a razão do seu aumento?
O aumento da Selic, em
primeiro lugar, eleva a remuneração do rentismo e beneficia capitais
especulativos internacionais de curtíssimo prazo (algo como R$ 1 trilhão
hoje em dia) que inundam de dólares o mercado brasileiro.
Em segundo lugar, essa grande afluência de dólares força a
valorização do real, tornando o preço dos produtos importados mais atraente
na concorrência com a produção nacional, facilitando as importações,
dificultando as exportações, destruindo nossa base industrial em favor das
empresas transnacionais e de um capitalismo flexível, que vai buscar os
territórios em que a produção tenha o menor custo e quer garantir a abertura
dos mercados mundiais, entre eles o do Brasil, para a venda de seus produtos.
Para proteger o emprego, a
indústria nacional, o aumento da renda, a expansão do mercado interno, a
soberania nacional, o caminho é outro. É baixar a Selic.
N
o t a s :
[ 1 ] -
Ver: <www.tesouro.fazenda.gov.br/a-divida-em--grandes-numeros>.
[ 2 ] -
Secretaria de Orçamento Federal,
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão: <www.orcamentofederal.gov.br>.
[ 3 ] -
Ver entrevista de Amir Khair na
edição de junho de 2015 do Le Monde
Diplomatique Brasil, clicando aqui.
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