«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

O que acontece com nossa governante?

Desconstruindo Dilma

Entrevista com Tales Ab'Sáber
Psicanalista, escritor e professor da Universidade Federal de S. Paulo (Unifesp)

André de Oliveira

No calor do momento, escritor propõe reflexão psicanalítica para se pensar
a trajetória política da presidente e os rumos do governo 
TALES AB'SÁBER
Psicanalista e professor da Unifesp

Na semana em que as contas do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff foram rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União, a temperatura política do País aumentou significativamente. Pela primeira vez desde o início do segundo mandato, o impeachment apareceu no horizonte como uma possibilidade real. O calor do momento, contudo, representa para o psicanalista Tales Ab’Sáber o instante mais necessário e ideal para se discutir o Brasil e seus rumos.

Com o livro Dilma Rousseff e o Ódio Político, editado pela Hedra e disponível para venda em formato digital e pré-venda em papel, Ab’Sáber busca traçar um perfil psicológico da presidente - coisa que já tinha feito com Lula em Lulismo, Carisma Pop e Cultura Anticrítica, no fechamento dos oito anos de governo do ex-presidente. A ideia é explicar como as características de Dilma, somadas às conjunturas do País, a conduziram ao estado de isolamento político em que se encontra.

Para o psicanalista, o livro faz uso de um aspecto pouco explorado pela sociologia política - a personalidade dos governantes -, que pode ajudar a ampliar a discussão, oferecendo diferentes perspectivas. A seguir os principais trechos da entrevista.

Quais traços da personalidade da presidente são identificáveis no modo de ela governar?

Tales Ab’Sáber: A presidente tem uma posição singular na esquerda brasileira. Ela não participou da dinâmica de formação do PT, veio do PDT de Leonel Brizola, e sempre teve o perfil de uma pessoa técnica agregada à política. Isso significa que, de algum modo, desde a origem, a presidente sofre de certo isolamento político. O problema é estrutural e anterior à crise que o governo está vivendo agora. O jeito dela governar é tomando decisões a partir do gabinete. Ela manda mais do que negocia. É uma tecnocrata de esquerda com um traço extremamente controlador, que fica claro na sua dificuldade de liderar negociações. Dentro e fora do governo. Aliás, nesse ponto ela é semelhante ao José Serra, seu adversário original em 2010. Os dois descendem de uma longa tradição originária do discurso positivo, técnico, científico. Fazem parte de uma “região” simbólica, subjetiva e sociológica bem brasileira. São tecnocratas, descendentes de um positivismo que acalentava a fantasia da existência de um sentido racional capaz de botar ordem no País. E que, por isso, é também muito autoritária. No caso da presidente, sua formação é completamente de oposição aos militares, mas, curiosamente, ela carrega esse traço de tecnocrata que eles também tinham.

O Lula, então, é o oposto dela nesse sentido?

Tales Ab’Sáber: Sim. O Lula, como o grande negociador que é, era muito mais flexível e carregava menos certezas. Ele deixava as forças sociais agirem através dele, organizava os poderes reais, mas não impunha uma forma a eles. A Dilma, por sua vez, não tem a experiência da negociação. Esses elementos não eram uma garantia do seu isolamento, mas são traços que poderiam levá-la até ele. No começo do primeiro mandato até existiu uma fantasia marqueteira em que ela aparecia como uma espécie de rainha, uma matriarca que conseguiria organizar a política de forma dura. Mas uma faxina no segundo mês de governo nunca é uma coisa saudável. É uma catástrofe política. Mesmo porque faz-se a faxina, mas se mantêm os mesmos partidos, o mesmo modo de operar.

A aprovação de Dilma era alta. Houve a reeleição e, depois, uma queda abrupta. O que explica essa queda?

Tales Ab’Sáber: São duas coisas. Em 2012, quando o governo trabalhou fortemente para diminuir os juros, aconteceu um racha com parte da riqueza nacional. A partir daí, setores até contraditórios, como financistas e industriais, se uniram em torno de um discurso geral contra o governo. Foi a quebra de um pacto estabelecido pelo lulismo. Depois teve junho de 2013, o grande mistério da política brasileira. Num primeiro momento, foi a batalha de jovens da esquerda independente por um ponto específico: transporte público gratuito. Num segundo momento, depois de uma repressão violentíssima, principalmente da polícia paulista, em que a vida cidadã foi reprimida, virou um movimento pela democracia. Por fim, num intervalo de poucos dias, a crítica à esquerda caiu no colo da direita. Em junho de 2013, já com o discurso do grande capital contrário à política econômica do governo, que começara a ser forjado em 2012, a direita descobriu a rua.

Por que todas essas questões confluíram para aquele momento?

Tales Ab’Sáber: Foi quando o “keynesianismo de consumo” dos governos Lula e Dilma estava deixando de ser viável. O governo não podia mais bancar isso, inclusive por causa de uma crise mundial do capital. O governo não soube manejar, não soube evoluir com as novas condições. E é justamente nesse momento de ruptura de um pacto muito bem resolvido com o alto capital, que as críticas econômicas liberam as forças antipetistas na vida social. É um movimento político complexo que acabou por também liberar muitas vozes diferentes, inclusive a da arcaica tradição antipopular e antidesenvolvimento social brasileira. O preocupante é que essas vozes têm aparecido, muitas vezes, na forma de um anticomunismo alucinatório, que joga bomba e folheto em funeral. E como explicar um movimento anticomunista em pleno 2015? Entre outras coisas, isso é fruto de um conflito não resolvido. Não resolvemos direito nossa transição democrática, porque os nossos homens de negócio estavam envolvidos com a ditadura e isso é constantemente esquecido, escondido. Mas o pior é que parte da oposição tem se escorado nesse ódio alucinatório, buscado forças nele para bater no governo e, assim, também acaba alimentando-o. Isso é muito ruim, porque distorce as coisas. A crise econômica é grave? É. Mas a politização torna o problema maior do que é. O Brasil já esteve muito mais quebrado do que agora. E a política do primeiro mandato, de segurar o mercado interno aquecido, em um momento de crise mundial, conseguiu segurar o desemprego em 4,5% até o ano passado. No entanto, agora essas ações foram jogadas no lixo como se elas nunca tivessem existido.

Por que o sr. acha que, além abandonar essas ações, o governo nem sequer fala mais delas?

Tales Ab’Sáber: Isso é um enigma. Existia uma política orientada para um sentido e essa política, de algum modo, se tornou derrotada e inviável. Mas foi por isso, e não por outro motivo, que a Dilma foi reeleita. O efeito favorável daquela política se esgotou. Mas por que ninguém sequer fala dela? A política manteve o País animado até o ano passado! É nesse ponto que falta a força da voz esclarecedora da governante. Ela deveria falar, mostrar para a vida pública o que e por que está fazendo. Essa voz não veio nos momentos em que foi mais necessária.

E qual será o desenlace dessa crise?

Tales Ab’Sáber: Com a liquidação política da ação da presidente, o Lula entrou em cena. E, como ele é muito hábil, em 15 dias costurou um acordo com o PMDB. Só que a partir daqui tudo é imprevisível. Existe um grupo tentando forçar um impeachment desde o primeiro mês de governo. Quer dizer, ela tinha acabado de ser eleita com 54 milhões de votos e já se falava em impedimento. Isso demonstra uma falta de maturidade democrática imensa, que acabou por fornecer muito poder para quem detinha apenas pequenos fragmentos de poder. O Tribunal de Contas da União, por exemplo, que é um órgão de assessoria da Câmara, totalmente político, constituído e escolhido por políticos, agora tem o poder de fazer com que um processo de impedimento siga em frente. A minha suposição, contudo, é de que o processo de impeachment não interessa a ninguém sério, nem à oposição, porque entregaria o país ao incerto. Em um determinado cenário, até o Eduardo Cunha, denunciado ao STF por corrupção e lavagem de dinheiro, com contas secretas descobertas na Suíça, assumiria como presidente do Brasil. A quem interessa isso? No entanto, a tática da oposição parece ser a de manter o governo na corda o tempo inteiro, sem espaço para governar. Só que isso, somado à fragmentação das forças políticas, pode acabar por sair do controle e não seria nada bom para a nossa democracia se esse precedente fosse aberto.

L I V R O

Título: Dilma Rousseff e o Ódio Político
Autor: Tales Ab’Sáber
Editora: Hedra
Páginas: 76
Preço: R$ 24,90

Fonte: O Estado de S. Paulo – Suplemento ALIÁS – Domingo, 11 de outubro de 2015 – Pg. E2 – Internet: clique aqui.

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