SÍNODO SOBRE A FAMÍLIA: Debates...

Matrimônio indissolúvel e Igreja solúvel

Massimo Faggioli
Professor de História do Cristianismo da University of St. Thomas, em Minnesota, nos EUA
L'Indice del Sinodo
06-10-2015

É inegável que a mentalidade sectária começou a fazer parte do corpo da Igreja Católica e tem um impacto direto sobre o debate em nível episcopal, especialmente quando toca uma questão como o matrimônio católico que é típica de uma concepção da Igreja não sectária.
Nos Estados Unidos desenvolveu-se um catolicismo extremamente conservador
fruto de uma mentalidade pseudocalvinista e vagamente sectária do cristianismo, sob influência protestante.
Este setor da Igreja Católica norte-americana defende a indissolubilidade do matrimônio
ameaçando dissolver a Igreja, ou seja, provocar um cisma.

O Sínodo dos bispos de 2014 e de 2015 deve ser lido histórica e teologicamente no rastro do [Concílio] Vaticano II: o Papa Francisco disse isso abertamente, e vários líderes sinodais (aqueles que poderíamos chamar de "reformistas") fazem referência a isso.

Como o Vaticano II, o Sínodo também enfrenta hoje, embora indiretamente, uma questão eclesiológica, semelhante àquela que esteve no coração do debate conciliar e, em particular, sobre a constituição Gaudium et spes: a Igreja Católica é uma Igreja aberta ao mundo e aos sinais dos tempos, capaz de mudar algumas disciplinas? Ou é uma Igreja contracultural e capaz de anunciar o Evangelho por ser indisponível a um "aggiornamento" [atualização] à luz dos tempos modernos?

Mas entre as tantas diferenças entre a Igreja do início dos anos 1960 e a de hoje há uma concepção de unidade da Igreja muito diferente, ou seja, uma eclesiologia prática diferente. Durante o segundo pós-Concílio (que, a meu ver, inicia-se na metade do pontificado de João Paulo II e culmina com Bento XVI) emergiram tendências a uma ideologização do catolicismo também graças à sua inculturação com a mentalidade pseudocalvinista e vagamente sectária do cristianismo norte-americano.

Basta dar uma folheada nas revistas e nos blogs (infelizmente muito frequentados) do catolicismo anglófono para ver que aqueles que são os mais firmes ao rejeitar qualquer modificação na prática do acesso à Eucaristia para os divorciados recasados são também aqueles que veem apenas no ato de debater sobre a questão um impulso herético, que é permitido se não até capitaneado pelo Papa Francisco (alguns blogueiros norte-americanos catolicíssimos e muito conhecidos acusaram abertamente o papa de heresia, às vezes até em revistas importantes como a First Things).

São os mesmos que falam de um cisma como provavelmente inevitável, à luz das tendências heréticas do cardeal Kasper e dos bispos alemães em particular. Uma versão sofisticada dessa visão é a do cardeal Erdö, segundo o qual não há gradualidade entre bem e mal. A versão tosca, infelizmente não tão isolada nos ambientes conservadores norte-americanos e anglófonos, é aquela segundo a qual a indissolubilidade do matrimônio deve ser defendida com a ameaça da solubilidade da Igreja.

É uma ameaça que soa muito mais assustadora na Europa do que nos Estados Unidos, em que boa parte desses conservadores e tradicionalistas chegou à Igreja Católica proveniente de outras Igrejas cristãs, em geral Igrejas da tradição protestante.

É inegável que a mentalidade sectária começou a fazer parte do corpo da Igreja Católica e tem um impacto direto sobre o debate em nível episcopal, especialmente quando toca uma questão como o matrimônio católico que é típica de uma concepção da Igreja não sectária.

Como observou um amigo e colega norte-americano, alguns ambientes dizem prever um cisma no horizonte. Na realidade, eles esperam que isso aconteça.

Traduzido do italiano por Moisés Sbardelotto. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Quarta-feira, 7 de outubro de 2015 – Pg. A3 – Internet: clique aqui.

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