«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sábado, 31 de outubro de 2015

REVIRAVOLTA DO SÍNODO: ninguém está excluído, por antecipação, da comunhão

O cardeal Pell e a economia (eucarística)

Andrea Grillo*

Alguns posicionamentos deste cardeal, bem como, de outros, não passam de “desejos pessoais” que exprimem sobre o Sínodo.
Mas, o Sínodo está apontado em outra direção...
PAPA FRANCISCO
Faz um pronunciamento durante uma Plenária do Sínodo dos Bispos
Sala Sinodal - Vaticano

Desde que o Sínodo se concluiu, o cardeal George Pell concede entrevistas em que defende:
  • o magistério sobre a família saiu totalmente confirmado da Relatio [o relatório final do Sínodo sobre a família], cujo texto, na sua opinião, repetiria totalmente a Familiaris consortio;
  • acima de tudo o tema dos "divorciados recasados" teria sido resolvido, na sua opinião, negando mais uma vez toda possibilidade de acesso à comunhão eucarística.
Eu tentei levar do modo mais sério possível essa estranha interpretação do Sínodo. Por muito tempo, eu não a entendi. Mas, depois, foi se acendendo uma luz em mim. Por fim, compreendi que o ponto de força da leitura de Pell é o seu cargo no Vaticano: Pell lê o sínodo desse modo por uma questão de “economia”. Tento explicar o porquê, depois de uma breve premissa.

a) Comecemos de longe. É legítimo ter desejos. Ou, melhor, os desejos são algo muito sério. O problema nasce quando se pretende projetar os desejos na realidade, criando irrealidades muito perigosas. Não falo aqui do desejo de ser Napoleão e de se comportar como se fosse. Mas do desejo, por exemplo, de que alguém esteja doente, doente grave. Enquanto desejamos isso, fazemos o mal a nós mesmos. Mas, se pusermos em circulação a notícia de que alguém está doente, e não for verdade, então o problema se torna mais sério, e não para o doente imaginário.

Analogamente, posso entender o desejo do cardeal Pell: é claro que ele gostaria que o texto da Relatio tivesse no capítulo 85 esta frase:
“Se alguém diz que um fiel batizado, validamente casado, que depois se separou e recasou civilmente, pode ter acesso à comunhão sacramental, anathema sit."
Eu procurei com cuidado, mas esse texto não se encontra na Relatio.
Infelizmente, na mesma Relatio, também não é possível encontrar a versão “moderada e atenuada” que lemos na Familiaris consortio, onde se diz:
"A Igreja, contudo, reafirma a sua práxis, fundada na Sagrada Escritura, de não admitir à comunhão eucarística os divorciados que contraíram nova união. Não podem ser admitidos a partir do momento em que o seu estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia" (n. 84).
Essa falta, essa ausência é uma reviravolta do magistério. Dizer simplesmente que o magistério está “confirmado” significa ignorar essa “ausência” que é muito pesada. O que importa não é que “não se fale de comunhão”, mas que “não se exclua da comunhão”.
b) Mas passemos para a economia: um Sínodo não pode ser interpretado como um “balanço econômico”. É óbvio que, se em um balanço não “entra” um item, este também não pode “sair”. Se em um balanço não entra “comunhão” [dos católicos recasados], também não pode sair "comunhão": isso é pacífico.

Infelizmente, para o cardeal Pell, um Sínodo não pode ser lido como um balanço: em um Sínodo, pode acontecer que um “assunto”, que não “entra” no documento final, apareça na Exortação Apostólica. Mas também pode acontecer que o que entra no documento final não apareça na Exortação.

c) No entanto, eu gostaria de dizer que Pell tem razão ao reivindicar uma lógica “econômica” também do Sínodo. Contanto que o cardeal queira assumir – estou convencido disto – que a “economia”, em sentido original, seja uma noção muito mais ampla e profunda do “ajuste de contas”, embora importante. Existe uma “economia doméstica” e uma “economia eucarística”, que devem responder a critérios muito diferentes dos do simples “balanço econômico”.
Cardeal George Pell (australiano)
Secretário da Economia - Vaticano

d) Talvez, sobre esse ponto, devamos reconhecer que o Sínodo fez uma verdadeira reviravolta: ele assumiu uma “leitura econômica” da tradição. É compreensível que Pell não possa suportar isso facilmente: ele vive isso, provavelmente, como uma forma de “concorrência desleal”. O monopólio “econômico” de uma abordagem quantitativa à Eucaristia é ameaçado por uma “economia qualitativa”, que se centra na Eucaristia. Sobre isso, é preciso refletir a fundo.

e) O que significa “visão econômica” da Eucaristia? É o que o Papa Francisco disse muitas vezes, quando ressaltou que a Eucaristia não é apenas para os sãos, mas também para os doentes. Não é o prêmio para os puros, mas o remédio para quem está a caminho. Isso significa, traduzido nas categorias “econômicas”, que o caminho do cristão se nutre da Eucaristia não só no fim, mas também "a caminho".

f) A “reviravolta” do Sínodo está justamente nisto: em não excluir a priori [antecipadamente] que o divorciado recasado, permanecendo na irreversibilidade da sua própria condição nova, possa, com o tempo, ter acesso de novo à Eucaristia, como “medium salutis” [meio de salvação], como “remédio” para viver a comunhão cada vez melhor e com força renovada. Para a Eucaristia, recuperar uma “visão econômica” significa fazer com que ela se encaixe na “lógica da casa”: as casas das famílias podem se alimentar da comunhão em que a Eucaristia participa: comunhão de reunião, comunhão de escuta, comunhão de confissão de fé, comunhão de canto, comunhão de oração, comunhão de perdão, comunhão de refeição.

g) O cardeal Pell, que é especialista em economia, não quer uma economia eucarística. Isso me surpreende! Justamente o “dicastério econômico” deveria ser o mais interessado nessa grande reviravolta, com a qual as famílias cristãs, com as suas alegrias e as suas dores, com as suas virtudes e os seus pecados, se deixam alimentar pelo Senhor, se deixam iluminar pelo Seu espírito, para realizar “o bem possível”, sem serem sufocadas pelo “máximo do bem” que a muitas delas não é dado viver. Essa misericórdia não é injustiça. Ao contrário, é a “justiça não econômica” invocada por Pell como sendo facilmente desprovida de misericórdia alguma. Mesmo que tudo isso, em um balanço, nunca vai aparecer. Parece-me que Pell quer interpretar o Sínodo segundo os seus “desiderata” [desejos, vontades]: mas, no Sínodo, os desejos dos bispos individuais, encontrando-se e reconhecendo-se, abriram o olhar para uma leitura “econômica” da Eucaristia. Será possível que o mais experiente em economia não tenha se dado conta disso?

* Andrea Grillo, teólogo italiano, leigo casado, professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, de Roma, do Instituto Teológico Marchigiano, de Ancona, e do Instituto de Liturgia Pastoral da Abadia de Santa Giustina, de Pádua.

Traduzido do original italiano por Moisés Sbardelotto. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Sexta-feira, 30 de outubro de 2015 – Internet: clique aqui.

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