«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

domingo, 25 de outubro de 2015

O SÍNODO CHEGA AO SEU FINAL

O Sínodo deu muitos passos à frente 
(e alguns para trás)

Massimo Faggioli
L'HuffingtonPost.it
24-10-2015

O resultado do Sínodo – no sentido do documento final – é um passo à frente em relação ao documento do ano passado, exceto pela passagem sobre a homossexualidade. Mas também é um documento que deixa espaço para Francisco implementá-lo de modo criativo.
PAPA FRANCISCO
Concluiu os trabalhos do Sínodo dos Bispos sobre a Família pronunciando
um importante Discurso.
Vaticano, sábado, 24 de outubro de 2015

O Sínodo dos bispos de 2015, segunda etapa do "caminho sinodal" aberto por Francisco com o seu pontificado, encerra-se com o documento final votado por 270 membros com direito a voto.

O documento final é um documento consensual, que deve ser lido na sua inteireza e complexidade (94 parágrafos): todos os parágrafos alcançaram a maioria dos dois terços (muito estreita no caso dos parágrafos sobre os divorciados recasados) e isso exigiu muitas mediações por parte do comitê de redação.

A Relatio Synodi – o relatório final do Sínodo – já está disponível em língua italiana,
para acessá-lo, clique aqui.

A passagem inspirada na Familiaris consortio de João Paulo II (1981) acerca dos divorciados recasados é uma abertura substancial, mas que levanta a pergunta sobre a ideologização da Igreja de João Paulo II por parte dos bispos e teólogos nomeados por ele e por Ratzinger aos postos de comando da Igreja.

O João Paulo II nas mãos dos seus ideólogos não é todo João Paulo II. O silêncio sobre os homossexuais e a Igreja (e a passagem fraca sobre o "acompanhamento") é um visto passo atrás em relação ao ano passado, fruto da eleição de alguns membros claramente hostis a Francisco a postos de destaque para a condução do debate no Sínodo: no melhor dos casos, não houve vontade de abordar a questão; no pior, ouviram-se na Aula discursos que teriam implicações penais em algumas democracias ocidentais (o discurso do cardeal Sarah).

A questão das mulheres é uma relevante ausência no documento, mas, pela primeira vez, também surgiu como questão relativa à composição do Sínodo. Pela primeira vez, foi nomeado como membro do Sínodo com direito de voto um religioso não padre, que pôde votar, ao contrário das freiras: evidência do fato de que a nova linha de divisão na Igreja Católica hoje não é entre padres e leigos, mas entre homens e mulheres.

O resultado do Sínodo – no sentido do documento final – é um passo à frente em relação ao documento do ano passado, exceto pela passagem sobre a homossexualidade. Mas também é um documento que deixa espaço para Francisco implementá-lo de modo criativo.

O importante desse Sínodo é o procedimento. O processo sinodal 2014-2015 foi feito por vontade de Francisco (e não necessariamente se encerrou) e é aquilo que a Igreja esperava há 50 anos no fim do Concílio Vaticano II. Francisco deve recuperar o tempo perdido.

Considerando que quase todos os bispos que elegeram os membros do Sínodo foram nomeados por João Paulo II e Bento XVI (dois papas muito diferentes de Francisco), tem-se uma ideia das dificuldades do papa para fazer com que o Sínodo enfrentasse questões que, até dois anos atrás, tinham sido ignoradas, ou abordadas como se a realidade não existisse, ou como se a realidade fora da Igreja não tocasse a Igreja, o que seria pior para a realidade.

A imagem que a Igreja Católica deu de si mesma no Sínodo é a de uma Igreja muito diferente no seu interior, sem maiorias claras entre bispos de uma tendência e de outra; mas não há dúvida de que existe uma maioria em favor das novidades que Francisco abriu.

Tratando-se de quase todos os bispos nomeados por Wojtyla e Ratzinger, é um fato surpreendente. A geoteologia do catolicismo no Sínodo aparece – finalmente – complicada como é na realidade. A América Latina segue e inspira Francisco e representa um modelo de Igreja capaz de agir em nível continental.

Os italianos são muito diferentes entre si (basta aproximar um teólogo como o bispo Brambilla e um homem de ordem como o cardeal Piacenza para ver que tipo de pensamento está por trás). A teologia alemã ainda é aquela que (como há 50 anos) serve para mover o pensamento da Igreja. Os anglófonos (norte-americanos e africanos, especialmente) são "cultural warriors" [guerreiros culturais] movidos por preocupações políticas, mas há nuances diferentes: dois africanos como os cardeais Turkson e Sarah representam o futuro (o primeiro) e o passado remoto (o segundo) da Igreja. O cardeal Wuerl é um conservador inteligente, ao contrário aquilo que se pode dizer sobre outros norte-americanos.

A luta agora continuará dentro do Conselho para o Sínodo (no cargo até o próximo Sínodo), onde uma frágil maioria dos eleitos é contrária às aberturas de Francisco. Mas é uma situação totalmente fluida, e a trajetória está claramente dirigida para a Igreja de Francisco.

O irônico (mas também perturbador) do espetáculo oferecido por alguns cardeais e bispos tradicionalistas é que eles finalmente descobriram um dos cavalos de batalha do catolicismo liberal: não basta o papa para fazer a Igreja. A série de incidentes que acompanharam o Sínodo (a "saída do armário" do monsenhor do ex-Santo Ofício na véspera; a carta do dia 5 de outubro dos cardeais ao papa, publicada por Sandro Magister uma semana depois; a falsa notícia da doença do papa) mostra o nível de resistência contra o Papa Bergoglio.

Esses incidentes são menos preocupantes, porém, do que o nível de veneno alcançado em certos níveis da Igreja contra Francisco. Em parte, é a aversão pessoal ao papa argentino por parte dos órfãos dos pontificados anteriores, mas também é o sintoma da ideologização e doutrinalização do catolicismo "lei e ordem".

Como escreveu Alberto Melloni no Corriere della Sera, para quem conhece a história da Igreja recente e do Vaticano II, causava um efeito estranho ver os dirigentes da Igreja apresentando as questões como escolha entre doutrina e pastoral, como se a doutrina pudesse até mesmo apenas existir sem a pastoral. A pastoral, a "salvação das almas", vem antes e é critério para a doutrina.

Desse ponto de vista, a cultura teológica de muitos pastores da Igreja mostra sinais preocupantes de endurecimento do coração e da mente em relação não ao liberalismo teológico, mas à própria venerável tradição da Igreja: agostinianismo em vez de Santo Agostinho, tomismo em vez de São Tomás, wojtylismo em vez de Wojtyla.

Basta dar uma olhada em algumas publicações católicas anglófonas para ver o neotradicionalismo católico, um híbrido de fundamentalismo católico baseado não no texto bíblico, mas no magistério do passado mais ou menos recente dos papas (antecessores de Francisco).

O discurso do papa ao Sínodo do dia 17 de outubro não faz parte materialmente do corpus do Sínodo, mas é um dos discursos programaticamente mais importantes de Francisco: uma Igreja menos verticalista, menos romana, mais baseada nas experiências locais.

Francisco fará com que o Sínodo seja seguido por um documento seu e por decisões suas (incluindo o Jubileu que se abre no dia 8 de dezembro), mas naquele discurso já está a magna carta de uma Igreja que finalmente assume o Vaticano II. O que diz muito sobre o que foi feito e não feito pela Igreja nos últimos 50 anos.

No Sínodo emergiu de modo claro que há muitas questões abertas, abordadas pela Igreja pela primeira vez. A ousadia de alguns tradicionalistas anti-Francisco esconde uma clara decepção por ter sido necessário reabrir questões consideradas fechadas para sempre ("mas nós já não tínhamos vencido?") e uma preocupação porque essas questões (os homossexuais, os divorciados, as mulheres na Igreja) serão abordadas da próxima vez – e, na Igreja real, obviamente há bispos, padres e leigos que já encontraram soluções provisórias sobre as quais nenhum Sínodo jamais poderá deliberar.

Em si, esse é um fato essencial, porque as falsas acusações contra Francisco, por ter manobrado o Sínodo, provêm daquela parte da Igreja que tinha sido elevada por João Paulo II e Bento XVI como a facção que havia ocupado a totalidade dos postos que importam dentro das hierarquias eclesiásticas.

Basta Francisco para trazer de volta a uma normalidade institucional uma Igreja perigosamente desequilibrada ao longo dos últimos 30 anos. Não é uma questão de liberais contra conservadores, mas de equilíbrio entre culturas diferentes que representam, todas, a Igreja universal. O pontificado de Francisco representa para a Igreja uma passagem difícil e lenta, mas não há ninguém que apostaria em um retorno ao passado.

No discurso final ao Sínodo do papa, está Francisco por inteiro: um discurso muito poderoso, de verdadeiro líder espiritual, que, de maneira gentil, mas clara, coloca-se contra o sectarismo, contra os doutores da lei, contra a ideologia doutrinal a serviço da religião.

Muito daquilo que a Igreja está conseguindo fazer é graças às formidáveis capacidades desse papa.

Traduzido do italiano por Moisés Sbardelotto. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Sábado, 24 de outubro de 2015 – Internet: clique aqui.

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