«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 26 de abril de 2016

A saliva regando a intolerância entre nós, brasileiros!

O cuspe e a política:
como a saliva rega a semente da intolerância

Daniel Martins de Barros*

Cuspir é o sinal de desprezo máximo, do desejo que o outro não exista. Espanta ver esse recurso empregado por quem diz defender a democracia. 
DANIEL MARTINS DE BARROS
Psiquiatra

O cuspe na cara está na moda. Tivesse ficado restrito aos gêmeos antípodas Wyllys e Bolsonaro [deputados federais] eu não me manifestaria sobre o tema. Mas como muitos fenômenos sociais, a coisa está se alastrando. Zé de Abreu [ator da Globo] cuspiu num casal que o ofendeu. Manifestantes organizaram um ato para cuspir em fotos de políticos que votaram a favor do impeachment. Como aposto que a coisa ainda vai crescer, acho que vale a pena pensar sobre a cusparada.

Como toda agressividade, cuspir pode ser um ato reativo ou instrumental.

1ª) Reativa, como o nome diz, é a agressão ocorrida como resposta a uma provocação. O cuspe aparece mais frequentemente nessas ocasiões em crianças, em pacientes com retardo mental ou em idosos com demência, e é fácil entender porquê. Nessa população o cérebro ainda não amadureceu o suficiente para conseguir lidar com a raiva e a frustração ou já perdeu essas capacidades – por isso, quando provocadas elas se descontrolam mais facilmente. Como são pessoas vulneráveis, com desvantagens numa eventual altercação física, o cuspe, com sua capacidade de alcançar à distância, permite uma reação agressiva que, se não chega a ser muito lesiva, ao menos põe à salvaguarda o agressor.

Se fosse esse nosso caso nacional já seria ruim. Mas acho que é pior.

2ª) A outra forma de agressão, instrumental, é aquela feita deliberadamente, é planejada com intuito de se conseguir algum objetivo. E qual o significado do cuspe nessa situação? Ele não tira de combate um oponente. Não impõe restrição física. Não fere nem mata. Seu objetivo, portanto, é simbólico. Mas símbolo de quê? A que a cusparada poderia se remeter? A saliva é algo tão pessoal que só temos contato com a de outra pessoa num contexto de extrema intimidade – pense na mãe que lambe a cria, pense num beijo apaixonado ou no sexo oral. Mas existe outra situação em que alguém é exposto à força e contra sua vontade a fluidos íntimos de outra pessoa? Sim, é isso mesmo: simbolicamente, cuspir em alguém é análogo ao estupro – é um ato que destitui o sujeito de sua condição de ser humano. Simboliza mais do que a morte (pois normalmente os mortos são respeitados) – é signo do desprezo a ponto de anular a existência alheia. (Evidentemente é uma analogia, um simbolismo, pois é óbvio que o estupro real é incomparável à uma cuspida real).

Por isso digo que é pior do que se os cuspidores tivessem apenas reagido intempestivamente. É pior porque com sua atitude eles estão dizendo que não querem que exista a outra opinião. Desprezam a existência de uma visão de mundo alternativa, e gostariam que a dissidência fosse aniquilada.  Ou alguém acha que cuspir num opositor o fará mudar de atitude, trocar de lado? Não, eles não querem transformar opositores em aliados – querem relegá-los ao desprezo, ao esquecimento, ao nada.

É muito mais do que triste. É perigoso. Já disse antes e repito: guerras civis começam assim.

Todo mundo diz que defende a democracia, o espírito republicano, a liberdade. É fácil fazer isso diante do que concordam conosco. Mas precisamos entender de uma vez por todas que lutar por liberdade de fato é mais do que garantir o direito de as pessoas pregarem o oposto de nossas crenças – é ficar sinceramente satisfeito que elas possam defender quaisquer absurdos.

* DANIEL MARTINS DE BARROS é psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (IPq-HC), onde atua como coordenador médico do Núcleo de Psiquiatria Forense e Psicologia Jurídica (Nufor). Doutor em Ciências e bacharel em Filosofia, ambos pela Universidade de São Paulo (USP).

Fonte: ESTADÃO.COM.BR – Blogs – Terça-feira, 26 de abril de 2016 – 11h12 – Internet: clique aqui.

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