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Sou contra o impeachment porque
penso no dia seguinte

Luiz Eduardo Soares
Antropólogo, escritor, dramaturgo e professor de Filosofia Política da UERJ

Passando o impeachment, fecham-se as tampas para mais mudanças.
O Brasil perderá a potência da Lava-Jato, esse fenômeno único e transformador em nossa história.
Além disso, o país será submetido a um arrocho sem precedentes.
Quem pagará o preço, mais uma vez, serão os mais pobres. 
LUIZ EDUARDO SOARES

Amig@s, não tenho a intenção de demonizar ninguém que seja a favor do impeachment, tenho muitos amigos favoráveis e a maioria de meu partido [Rede Sustentabilidade] prefere o impeachment. Quero apenas compartilhar as razões pelas quais sou contra, razões que tenho repetido há meses, em textos e debates públicos.

Aprovado o impeachment, no dia seguinte, a mídia vai clamar por uma trégua para que o novo presidente possa trabalhar em paz e para que a economia se reequilibre. O ministro Gilmar Mendes, novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vai empurrar com a barriga o processo contra a chapa Dilma-Temer, para não desestabilizar o novo governo. Dirá: “O Brasil não aguenta outra queda de presidente”.

Editorialistas escreverão: “A economia não resistirá a uma nova perturbação da ordem. Deixem as eleições para 2018. Agora, todos devem dar uma trégua ao presidente Temer. Agora, vamos trabalhar para restabelecer a confiança e reeguer a economia”.

O ministro da Justiça será forte, fortíssimo, alguém com autoridade para segurar a polícia federal (e atenção, confio na integridade e independência da Polícia Federal e do Ministério Público, mas sei quão poderosas podem ser as pressões e manipulações na contra-mão da vontade dos profissionais). Quem? Talvez um ex-ministro da Defesa e da Justiça, ex-presidente do Supremo. Este ministro forte agirá.

A Lava-Jato, que é, não nos enganemos, a grande moeda política no Congresso, razão para que dezenas de suspeitos e investigados votem contra ou a favor do impeachment, a Lava-Jato vai sair das manchetes e escorregar para as páginas policiais. E boa parte da população, iludida, vai celebrar a derrota da corrupção, como se o PT fosse o único partido corrupto, como se Temer e o PMDB não fossem cúmplices do PT, como se esta gigantesca manobra de Cunha et caterva [e sua gangue] não tivesse como objetivo justamente neutralizar a Lava-Jato.

Quem for a favor do impeachment por acreditar que depois de derrubar Dilma o povo pressionará pelo impeachment de Temer, vive no mundo da lua. Quem for a favor, supondo que a lição será dada ao PT e logo depois ao PMDB, com a cassação da chapa no TSE, está inteiramente equivocado.

Passando o impeachment, fecham-se as tampas para mais mudanças. O Brasil perderá a potência da Lava-Jato, esse fenômeno único e transformador em nossa história – independentemente de seus erros. Além disso, o país será submetido a um arrocho sem precedentes. Quem pagará o preço, mais uma vez, serão os mais pobres. O país trocará Dilma pelos direitos dos trabalhadores e pela oportunidade única em sua história de passar a limpo essa classe política degradada, em seu conjunto.

O único caminho promissor é o impeachment não ser aprovado, porque, no dia seguinte, todas as expectativas da sociedade se voltarão para o TSE e não haverá a possibilidade do engavetamento. A chapa Dilma-Temer será cassada e haverá novas eleições. As provas são cabais de que houve uso, na campanha, de recursos oriundos de corrupção. Quem cairá será a chapa Dilma-Temer, porque esses recursos não elegeram somente Dilma, elegeram também Michel Temer.

Portanto, se você quer novas eleições, quer a continuidade da Lava-Jato e quer um enfrentamento vigoroso, sem tréguas e profundo à corrupção, diga não ao impeachment. Se eu fosse deputado e tivesse a chance de votar, diria, apontando para Eduardo Cunha: “Considero o governo federal corrupto e abjeto, indefensável ética e politicamente, mas voto não ao impeachment porque não vou entregar meu país a Vossa Excelência e a seu grupo inqualificável (como deputado, estaria livre para aplicar os adjetivos apropriados), não vou entregar o Brasil a V.Exa., a Michel Temer, a Renan Calheiros. Os senhores são cúmplices, são a outra face da mesma moeda. Novas eleições, já. E se esta Casa tivesse vergonha, faria o impensável: renunciaria, coletivamente, para que as novas eleições fossem gerais. Como isso não vai acontecer, a Nação deve voltar os olhos para o TSE e cobrar decisão urgente."

Você, favorável ao impeachment, creia: provavelmente sou tão crítico ao PT quanto você, desde o desgoverno na economia à derrocada ambiental, do atoleiro político à degradação ética. Mas prezo a Lava-Jato e não sou ingênuo: não creio que os problemas do Brasil se resumam ao PT. Quem acreditar nisso está iludido e dará, involuntariamente, sobrevida à corrupção e às mazelas nacionais, na política.

Como prova de que este estudioso e escritor
não é um defensor do PT, de Lula e de Dilma, nem
cego diante do que houve na política brasileira nesses
últimos tempos, clique aqui e assista
um vídeo com uma intervenção que ele fez em um debate.

Fonte: Justificando – Coluna – Terça–feira, 12 de abril de 2016 – Internet: clique aqui.

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